MP aponta aumento de 20% nas mortes em confrontos com policiais
Mortes em confrontos com policiais no Paraná cresceram 20% em 2024; 27% das vítimas não estavam armadas.
O Ministério Público do Paraná (MPPR) divulgou, na última quarta-feira (22), um levantamento que revela o aumento de 20% no número de mortes em confrontos envolvendo forças de segurança no estado. Os dados apontam que, em 2024, foram registrados 433 confrontos, resultando em 413 óbitos e 112 feridos. Para efeito de comparação, 2023 contabilizou 348 mortes.
O estudo foi desenvolvido em conjunto pelo Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública (Gaesp) e pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), dentro de uma nova política de transparência e análise de dados implementada pelo MPPR, seguindo orientações do Conselho Nacional do Ministério Público e a Resolução nº 7552/2024 da Procuradoria-Geral de Justiça.
Desde o início da gestão de Ratinho Júnior (PSD), em 2019, já foram contabilizadas 2.371 mortes atribuídas a policiais militares, policiais civis e guardas municipais. A maior parte das ocorrências de 2024, 97,7%, envolveu a Polícia Militar (PM), enquanto a Polícia Civil esteve presente em 1,2% dos casos e a Guarda Municipal em 0,9%.
Vítimas desarmadas em "confrontos"
O relatório também trouxe à tona o registro de 118 casos classificados como confrontos nos quais as vítimas não estavam armadas, representando 27,3% do total. Segundo o promotor Ricardo Casseb Lois, integrante do Gaesp, o conceito de confronto não se limita a casos com feridos ou mortos. "Confrontar é desobedecer ou resistir a uma ordem do agente público, a ponto de a situação escalar para a violência. É necessário analisar caso a caso para verificar eventuais excessos", afirmou.
O levantamento também revelou lacunas na investigação de mortes decorrentes de confrontos, como a ausência de exames residuográficos para determinar se a vítima utilizou ou não arma de fogo. "O Paraná, até pouco tempo, não tinha equipamentos adequados para esses testes, mas a Secretaria de Segurança Pública adquiriu recentemente essa tecnologia", destacou Lois.
Rádio Patrulha lidera os casos de confronto
Entre os 424 confrontos envolvendo a Polícia Militar, 45,5% ocorreram com equipes da Rádio Patrulha Auto (RPA). A Rotam foi responsável por 28,3% dos casos, seguida pela Rone (13,9%) e pela equipe de Choque (9,8%). Casos com participação de mais de uma equipe somaram 2,5%.
De acordo com Cláudio Rubino Zuan Esteves, coordenador do Gaeco, a predominância da PM é reflexo do caráter ostensivo da instituição e de seu papel como primeira resposta em ocorrências em andamento.
Violência doméstica
O relatório também apontou a violência doméstica como a segunda principal causa de confrontos em 2024, com 112 ocorrências, ficando atrás apenas das perseguições em crimes em andamento, que somaram 182 casos. A lista também inclui confrontos decorrentes do cumprimento de mandados judiciais (71), abordagens de rotina (32) e capturas de membros de facções criminosas (10).
"Esses dados evidenciam a urgência de políticas públicas que protejam mulheres em situação de violência doméstica, já que muitas vezes o agressor resiste à ação policial", observou o promotor Ricardo Casseb Lois.
Perfil das vítimas
Os homens foram as principais vítimas dos confrontos, com 409 mortes (99%) e 111 feridos (99,1%). A faixa etária mais afetada foi entre 30 e 34 anos (105 mortes), enquanto os feridos foram predominantemente jovens entre 18 e 29 anos. Em termos raciais, 192 das vítimas fatais eram pardas e 157 brancas.
No que diz respeito à localização, Curitiba foi a cidade com mais confrontos, com 98 casos. Em seguida aparecem Londrina (43), São José dos Pinhais (15), Foz do Iguaçu (15), Colombo (15), Cambé (12), Cascavel (11), Ponta Grossa (11) e Almirante Tamandaré (10).
Análise de dados
Segundo o procurador André Tiago Pasternak Glitz, o MPPR agora busca compreender padrões de conduta nas ações das forças de segurança para propor políticas públicas mais efetivas. "Nosso objetivo é interpretar os dados e trabalhar em parceria com as forças de segurança para reduzir os números. Queremos que, no próximo balanço, possamos identificar as ações responsáveis por mudanças positivas", concluiu Glitz.
Prevenção e repressão
A nova abordagem do MPPR para o tratamento da letalidade em confrontos policiais destaca os aspectos preventivo e repressivo. O primeiro será direcionado pelo Gaesp, responsável pela análise, compilação, tratamento e qualificação das informações. Na parte repressiva, para a apuração e denúncia de casos concretos, a ação fica sob responsabilidade das Promotorias de Justiça com atribuições para o acompanhamento das investigações em suas localidades e do Gaeco, quando atendidos os critérios de atuação da unidade especializada. Ambos os eixos, preventivo e repressivo, constituem desdobramentos da missão constitucional do Ministério Público de exercer o controle externo da atividade policial.
Ação interinstitucional
Todo o trabalho do Gaesp e do Gaeco vem sendo feito com a cooperação das instituições ligadas à segurança pública no estado: Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), Polícias Civil e Militar e Guardas Municipais. A ideia é alcançar, de forma conjunta, uma política interinstitucional ampla que tenda à compreensão dos fenômenos e à definição de novos protocolos de atuação. O que se busca, ao final, é a redução da letalidade em confrontos como um todo, tanto de civis quanto dos agentes de segurança pública.
Esse novo sistema conta com diagnósticos que possam agora levar à compreensão do fenômeno para o seu desdobramento em ações concretas. Algumas inclusive já estão em execução, como, por exemplo, a aquisição pelo Estado de armamento não letal (como “tasers”) em complemento às armas de fogo já existentes. Esses equipamentos possibilitam maior efetividade no uso gradual da força. Também há ações de planejamento, projetadas a partir dos diagnósticos realizados pelo MPPR e pelas demais instituições ligadas à segurança pública.