Juiz que forjou nome queria "renascer outra pessoa" por vergonha da origem
Defesa apresentou laudo psiquiátrico alegando que o juiz criou uma identidade fictícia por vergonha do passado e frustração com a vida no exterior
Por Gazeta do Paraná

A defesa do juiz aposentado José Eduardo Franco dos Reis apresentou à Justiça de São Paulo um laudo médico que o aponta como portador de Transtorno de Personalidade Esquizoide pede a instauração de incidente de insanidade mental.
O magistrado viveu por mais de quatro décadas sob o nome fictício de Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield, adotado como uma tentativa de "renascer outra pessoa" por ter "vergonha de sua história e de seu nome", segundo noticiado pelo G1.
De acordo com o portal, o documento foi elaborado pelo psiquiatra forense Gustavo Bonini Castellana e relata que o juiz sofreu uma decepção pessoal marcante ainda na juventude.
Aos 18 anos, ao tentar iniciar uma nova vida em Boston, nos Estados Unidos, acabou retornando precocemente ao Brasil após ser abandonado por um amigo que prometera apoio. O retorno foi marcado por um profundo sentimento de fracasso e vergonha.
Ainda segundo o G1, foi nesse contexto que Reis, incentivado por um colega de pensão, decidiu abandonar sua identidade original.
"No auge da angústia e do desnorteamento existencial, aceitou a sugestão de mudar de nome", diz o laudo. A nova identidade, inspirada em personagens da literatura inglesa, representou para ele um marco simbólico de superação.
"Queria morrer e renascer outra pessoa. Tinha vergonha de sua história e de seu nome", disse o juiz ao psiquiatra, segundo relatou o portal.
Na ação penal, a defesa argumenta que o magistrado jamais agiu com o objetivo de prejudicar terceiros ou obter vantagem indevida.
"O Peticionário, movido por uma questão existencial e familiar, sentiu-se compelido a mudar a sua identidade e recomeçar uma vida nova, mas não o fez com o fim de prejudicar direito ou criar qualquer obrigação jurídica", afirmaram os advogados Alberto Toron e Renato Marques Martins, ao portal.
Ainda conforme o G1, os advogados pediram à Justiça a celebração de um ANPP - Acordo de Não Persecução Penal, com base na ausência de dolo e no fato de que a documentação falsa nunca foi usada de forma lesiva. A tentativa de renovação do RG - que levou à descoberta da falsidade - sequer foi concluída, já que o sistema identificou a duplicidade das impressões digitais.
A defesa apresentou também uma lista de seis testemunhas, incluindo cinco desembargadores do TJ/SP, e reiterou que o juiz "não apresenta risco para si mesmo ou para terceiros", de acordo com o laudo psiquiátrico.
A Justiça de São Paulo ainda não decidiu sobre o pedido de instauração de incidente de insanidade mental nem sobre a proposta de ANPP.
Entenda
O juiz aposentado José Eduardo Franco dos Reis, natural de Águas da Prata/SP, viveu por mais de 40 anos com a identidade fictícia de Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield, inspirada em personagens da literatura inglesa.
Com esse nome, ele cursou Direito na USP, formou-se em 1992 e virou juiz em 1995. A farsa foi descoberta em outubro de 2024, ao tentar renovar o RG no Poupatempo da Sé, quando o sistema identificou a duplicidade nas impressões digitais.
À Polícia Civil, Reis alegou que Edward seria seu irmão gêmeo, adotado por uma família britânica - versão que não convenceu. O MP/SP o denunciou por falsidade ideológica e uso de documento falso, pedindo o cancelamento dos documentos irregulares e a entrega do passaporte.
A Justiça aceitou a denúncia, tornando-o réu e determinando a suspensão do pagamento de sua aposentadoria.
As informações são do Portal Migalhas