Petrobras obtém licença para perfuração na Foz do Rio Amazonas e reacende debate ambiental
A Margem Equatorial abrange cinco bacias sedimentares, Foz do Amazonas, Barreirinhas, Ceará, Potiguar e Pará-Maranhão
Por Da Redação

A Petrobras recebeu nesta segunda-feira (20) a licença de operação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para perfurar um poço exploratório em águas profundas do Amapá, na Margem Equatorial brasileira. O bloco FZA-M-059 está localizado a 175 quilômetros da costa e a cerca de 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas. A autorização encerra um processo que se arrastava havia quase cinco anos e abre caminho para a primeira perfuração da estatal na região.
De acordo com a Petrobras, a perfuração deve começar imediatamente e terá duração estimada de cinco meses. O objetivo é obter informações geológicas que indiquem a existência de petróleo e gás em escala econômica. Nesta fase, ainda não há produção de petróleo. O investimento faz parte do plano estratégico 2025–2029, que destina cerca de US$ 3 bilhões à Margem Equatorial — região considerada a nova fronteira energética do país.
A concessão da licença ocorre às vésperas da COP30, conferência climática das Nações Unidas que será realizada em Belém, no Pará, em 2026. O episódio reacende o debate entre desenvolvimento econômico e compromisso ambiental, num momento em que o Brasil tenta consolidar a imagem de líder global na transição energética.
A presidente da Petrobras, Magda Chambriard, comemorou a liberação e disse que o projeto representa uma conquista da sociedade brasileira.
“Vamos operar na Margem Equatorial com segurança, responsabilidade e qualidade técnica. Esperamos obter excelentes resultados nessa pesquisa e comprovar a existência de petróleo na porção brasileira dessa nova fronteira energética mundial”, afirmou. Ela ressaltou que o licenciamento foi resultado de “cinco anos de diálogo com governos e órgãos ambientais” e que a companhia comprovou “a robustez de toda a estrutura de proteção ao meio ambiente”.
Rigor ambiental
O Ibama informou que a licença foi concedida após um “rigoroso processo de licenciamento ambiental”, que incluiu a elaboração do Estudo de Impacto Ambiental (EIA/Rima), três audiências públicas e 65 reuniões técnicas em mais de 20 municípios do Amapá e do Pará. Também foram realizadas vistorias em todas as estruturas de resposta a emergências, além de uma Avaliação Pré-Operacional com a participação de mais de 400 pessoas.
O órgão destacou que, após o indeferimento da licença em 2023, a Petrobras implementou uma série de melhorias no projeto, especialmente nas ações de resposta a acidentes. Entre as exigências, estão a construção de um novo Centro de Reabilitação e Despetrolização em Oiapoque (AP), a inclusão de três embarcações offshore para atendimento de fauna oleada e quatro embarcações de apoio em áreas costeiras.
“As exigências adicionais foram fundamentais para a viabilização ambiental do empreendimento, considerando as características excepcionais da região da bacia da Foz do Amazonas”, informou o Ibama, que também determinou a realização de novos simulados durante a perfuração.
A decisão do Ibama ocorre às vésperas do fim do contrato da sonda que será usada na operação. Na última semana, Magda Chambriard havia alertado para o risco de atraso: “Se a gente não começar a perfurar até o dia 21, essa sonda pode ser retirada da locação, e, se isso ocorrer, o processo de licenciamento começa tudo de novo”, disse em evento da Firjan.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, celebrou a autorização e afirmou que a Margem Equatorial “representa o futuro da soberania energética brasileira”.
“Fizemos uma defesa firme e técnica para garantir que a exploração seja feita com total responsabilidade ambiental, dentro dos mais altos padrões internacionais”, disse o ministro. Segundo ele, o país “não pode abrir mão de conhecer seu potencial energético”.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também vinha pressionando o Ibama pela aprovação da licença, que considerava essencial para estimular a economia do Amapá e atender a demandas políticas locais, como as do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). Lula chegou a criticar a demora do processo, classificando-a como “lenga-lenga”.
Nova fronteira energética
A Margem Equatorial é uma faixa litorânea que se estende do Rio Grande do Norte ao Amapá, considerada promissora para a descoberta de novas reservas de petróleo e gás natural. O interesse aumentou após grandes achados de petróleo no litoral da Guiana, cuja produção deve quintuplicar na próxima década. No Brasil, um estudo da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) estima que a Bacia da Foz do Amazonas possa conter até 10 bilhões de barris de óleo equivalente, cerca de 15% das reservas nacionais.
Apesar do potencial, ambientalistas alertam para os riscos da exploração em uma região que abriga o maior cinturão de manguezais do planeta e um sistema de recifes de corais descoberto em 2016. Qualquer vazamento poderia comprometer ecossistemas únicos e afetar comunidades ribeirinhas e pesqueiras.
A Academia Brasileira de Ciências (ABC) defende que as decisões sobre a exploração sejam pautadas por estudos científicos e transparência. A presidente da entidade, Helena Nader, destacou a necessidade de “planejamento minucioso e planos eficazes de mitigação”.
“Trata-se de uma região ambientalmente sensível e estratégica para o país. Ampliar as pesquisas, fortalecer o monitoramento e garantir planos eficazes de mitigação são passos indispensáveis para proteger os ecossistemas e as populações locais”, afirmou.
O relatório da ABC também recomenda que o Brasil alinhe a exploração às metas climáticas assumidas internacionalmente e crie um programa de neutralização de emissões de carbono associadas à atividade. Entre as medidas sugeridas estão o reflorestamento de áreas degradadas, a restauração de manguezais e investimentos em tecnologias de captura de CO₂.
