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Deputados pedem reavaliação da cobrança de pedágio em trechos urbanos

Sistema pode penalizar moradores que dependem dessas vias para atividades cotidianas, como trabalho, saúde, educação e lazer

Por Bruno Rodrigo

Deputados pedem reavaliação da cobrança de pedágio em trechos urbanos Créditos: Roberto Dziura Jr/AEN

O Paraná está no centro de um debate que mistura desenvolvimento econômico, infraestrutura e impactos sociais. De um lado, o governo federal anuncia investimentos bilionários em rodovias, com a concessão de trechos à iniciativa privada e a modernização do sistema de pedágio. Do outro, deputados estaduais e moradores alertam para os possíveis prejuízos que a cobrança de tarifas em áreas urbanas pode trazer para a população local. Enquanto o estado se prepara para mais dois leilões de concessões rodoviárias, a discussão sobre o sistema "free flow" ganha força, colocando em xeque o equilíbrio entre progresso e justiça social.

Imagine acordar cedo, pegar o carro para levar os filhos à escola, seguir para o trabalho, depois passar no supermercado e, no fim do dia, ainda precisar buscar as crianças na aula de futebol. Agora, pense que cada um desses trajetos, feitos dentro da sua própria cidade, possa custar alguns reais a mais no seu bolso. Essa é a realidade que assusta milhares de paranaenses com a implementação do sistema "free flow" nas rodovias que cortam áreas urbanas e conurbadas.

O "free flow", ou "livre passagem", é um sistema moderno de cobrança de pedágio que dispensa as tradicionais cabines e utiliza pórticos eletrônicos para registrar a passagem de veículos e calcular tarifas por quilômetro rodado. A tecnologia, já adotada em países como Chile e Estados Unidos, promete agilidade e eficiência, mas no Paraná, ela esbarra em uma questão crucial: muitas rodovias federais e estaduais funcionam como avenidas urbanas, essenciais para o deslocamento diário da população.

É justamente esse ponto que levou os deputados estaduais Tercilio Turini (MDB), Luiz Claudio Romanelli (PSD) e Evandro Araújo (PSD) a protocolar um documento na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Eles pedem a reavaliação da cobrança de pedágio em trechos urbanos e conurbados, argumentando que o sistema pode penalizar moradores que dependem dessas vias para atividades cotidianas, como trabalho, saúde, educação e lazer.

"Se não forem estabelecidos critérios diferenciados em trechos urbanos, a população local e de municípios de regiões conurbadas terá grande prejuízo. Cobrar pedágio nessas vias é um absurdo", afirma Turini, citando exemplos como a PR-445 e a BR-369 em Londrina, onde milhares de pessoas circulam diariamente.

Para ilustrar o impacto do sistema, os deputados simulam um exemplo prático em Maringá. Com a cobrança de R$ 0,20 por quilômetro rodado, a distância de 18,5 km entre Sarandi e o Aeroporto de Maringá (dois municípios conurbados na região Noroeste do estado) terá custo de R$ 3,70. “É uma tarifa de pedágio que pesa no bolso. Muita gente faz esse percurso mais de uma vez diariamente” – salientam.

Eles defendem a isenção de tarifa ou a criação de um cadastro municipal de usuários para evitar que moradores de áreas cortadas por rodovias pedagiadas sejam penalizados. Além disso, sugerem a delimitação de áreas isentas de pedágio em um raio de pelo menos 30 quilômetros fora do eixo urbano ou metropolitano.

O Paraná vive um momento de transformação em sua malha rodoviária, mas o sucesso dessas iniciativas dependerá da capacidade de conciliar desenvolvimento econômico e justiça social. O sistema "free flow", embora moderno, precisa ser adaptado à realidade local, onde rodovias são parte integrante do dia a dia das cidades.

A ANTT, responsável pela regulamentação das concessões, terá um papel crucial nesse processo. A agência já realizou audiências públicas e recebeu sugestões até o final de janeiro, mas a pressão dos deputados e da população deve manter o tema em pauta nos próximos meses.

Enquanto isso, os paranaenses esperam por soluções que garantam o direito de ir e vir sem custos abusivos. Afinal, como lembra Turini, "o progresso não pode vir às custas do bolso de quem já enfrenta tantos desafios no dia a dia".

No fim das contas, a questão que fica é: até onde o desenvolvimento pode avançar sem deixar para trás aqueles que mais dependem dele? A resposta, ao que parece, ainda está em construção.

Novos leilões

Enquanto o debate sobre o "free flow" avança, o Paraná também se prepara para receber grandes investimentos em infraestrutura rodoviária. O Ministério dos Transportes anunciou um plano de R$ 161 bilhões para todo o país, com destaque para o estado, que terá mais dois lotes de rodovias concedidos à iniciativa privada.

Os lotes 4 e 5, serão leiloados em setembro, e somam mais de 1.000 km de rodovias e preveem investimentos de R$ 12,9 bilhões. O Lote 4, com 628 km, conecta Cornélio Procópio a Guaíra, passando por cidades como Londrina, Maringá e Umuarama. Já o Lote 5, com 440 km, liga Maringá a Cascavel e segue até a divisa com o Mato Grosso do Sul.

Os projetos incluem duplicação de trechos, implantação de faixas adicionais, vias marginais, ciclovias e obras de arte especiais, como viadutos e pontes. A modernização promete melhorar a fluidez do tráfego e impulsionar a economia regional, mas também traz à tona a necessidade de equilibrar os avanços com os impactos sociais.