Violência urbana no Rio revela impactos duradouros na saúde mental da população
Especialistas alertam que exposição constante a tiroteios e insegurança provoca estresse crônico, ansiedade e depressão, especialmente entre crianças e adolescentes
 Créditos: Tomaz Silva/Agência Brasil
                Créditos: Tomaz Silva/Agência Brasil
                Corpos enfileirados, drones lançando explosivos, blindados e fuzis, veículos em chamas e ônibus atravessados nas ruas marcaram o cenário de guerra vivido na última terça-feira (28), durante a Operação Contenção, deflagrada pelas forças de segurança estaduais nos complexos do Alemão e da Penha, na zona norte do Rio de Janeiro. As imagens, que rodaram o mundo, escancararam a vulnerabilidade da população e reacenderam o debate sobre os efeitos psicológicos da violência urbana.
De acordo com especialistas ouvidos pela Agência Brasil, o medo constante e a sensação de insegurança afetam diretamente o funcionamento do sistema nervoso e o desenvolvimento psicossocial, sobretudo de crianças e adolescentes que convivem com tiroteios frequentes em áreas dominadas por facções criminosas.
Estresse e adoecimento
A psicóloga Marilda Lipp, referência em estudos sobre estresse, explica que o sentimento de insegurança ameaça uma das necessidades humanas mais básicas: a busca por segurança. “A exposição à violência urbana pode criar um nível de estresse altíssimo, afetando a saúde das pessoas”, afirma.
Segundo ela, a resposta ao estresse é fisiológica — o corpo libera hormônios que preparam o indivíduo para reagir ao perigo. “Nenhuma mente aguenta permanecer em alerta constante, como ocorre com quem vive sob risco contínuo de violência”, observa.
Os sintomas, quando persistem, podem evoluir para quadros de ansiedade crônica, depressão e outros distúrbios, manifestando-se em forma de taquicardia, hipertensão, insônia, irritabilidade e dificuldade de concentração.
Lipp ressalta que mesmo pessoas indiretamente expostas, as chamadas “vítimas secundárias”, podem adoecer. “Quem vive em uma comunidade onde há medo e tensão permanentes também sente os efeitos, ainda que não esteja na linha de fogo.”
A especialista defende que o Poder Público promova capacitação para lidar com o estresse em escolas e unidades de saúde. “Ensinar nossas crianças a lidar com o estresse seria um passo importante para mitigar os danos emocionais.”
Sofrimento coletivo
Para o psiquiatra Octávio Domont de Serpa Júnior, professor do Instituto de Psiquiatria da UFRJ, o impacto emocional da violência vai além do indivíduo. “Após episódios como os que ocorreram no Alemão e na Penha, há aumento na procura por serviços de saúde. As pessoas buscam atendimento por sintomas físicos e emocionais relacionados à insegurança”, afirma.
Domont ressalta que o sofrimento é também coletivo e estrutural, refletindo uma crise social que ultrapassa o campo da saúde mental. “Sem uma resposta que considere essa dimensão social, o problema continuará a afetar a todos.”
Ele defende que os profissionais de saúde estejam preparados para acolher e tratar as vítimas diretas e indiretas da violência, evitando que os sintomas se tornem crônicos. “Muitos desses cidadãos voltarão a ser expostos a situações semelhantes, já que ainda não há uma solução efetiva para o problema da segurança pública no país”, conclui.
 
                
                
            
 
																			 
																			 
																			 
																			 
																			 
																			 
																			 
																			 
                     
                     
                    