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TJ de Santa Catarina cria vara de combate a organizações criminosas com juízes anônimos e audiências online

Nova unidade funcionará com anonimato total de magistrados e servidores e é criticada por juristas como afronta à Constituição

Por Gazeta do Paraná

TJ de Santa Catarina cria vara de combate a organizações criminosas com juízes anônimos e audiências online

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ/SC) implantou, em junho, a Vara Estadual de Organizações Criminosas (Veoc), com sede em Florianópolis e jurisdição em todo o estado. A nova unidade, criada pela Resolução nº 7/25, centralizará o julgamento de crimes previstos na Lei nº 12.850/13, que define as organizações criminosas, e já nasce com um acervo de 2.087 processos.

O aspecto que mais chamou a atenção da comunidade jurídica é a adoção do anonimato absoluto para juízes e servidores da nova vara. Conforme o texto da resolução, todos os atos judiciais — decisões, despachos e registros — serão identificados apenas como oriundos da unidade, sem qualquer menção nominal a quem os praticou.

As audiências também serão realizadas exclusivamente por videoconferência, com uso de tecnologia desenvolvida com apoio da Microsoft para distorção facial e vocal dos magistrados — de forma que nem mesmo o gênero possa ser identificado. A mesma tecnologia poderá ser aplicada às testemunhas, caso autorizado judicialmente, com transcrição automática das audiências via inteligência artificial.

A iniciativa, segundo o TJ/SC, busca garantir segurança aos operadores do Direito diante do avanço de facções criminosas no Estado. “Estamos criando um ambiente seguro para que magistrados possam atuar com tranquilidade e saúde mental. Isso é um verdadeiro sonho de Justiça”, afirmou o presidente em exercício do Tribunal, desembargador Cid Goulart.

A vara contará com cinco magistrados(as) e 35 servidores(as), todos sob anonimato. A comarca da Capital foi escolhida como sede por concentrar 30,1% dos processos ligados a organizações criminosas em SC. A estrutura foi planejada com base em quatro eixos: eficiência, celeridade, segurança jurídica e segurança dos agentes públicos, segundo o corregedor-geral da Justiça, desembargador Luiz Antônio Zanini Fornerolli.

A medida recebeu apoio da Procuradoria-Geral do Estado e do Ministério Público, que veem na centralização uma forma mais eficaz de enfrentar a atuação das facções. “As organizações criminosas não respeitam limites físicos”, destacou a procuradora-geral de Justiça, Vanessa Cavallazzi.

Críticas: “Juízes sem rosto” e possível inconstitucionalidade

Apesar dos elogios institucionais, a decisão do TJ/SC vem sendo duramente criticada por juristas e acadêmicos. O professor de processo penal da PUC/RS, Aury Lopes Jr., classificou a criação da Veoc como “um retrocesso civilizatório”.

“Juízes sem rosto, sem nome, sem assinatura. Um juiz que você não sabe quem é, de onde surgiu. Isso viola frontalmente o princípio do juiz natural, o direito ao contraditório e o direito de alegar impedimento ou suspeição”, afirmou Lopes Jr., lembrando que a Constituição Federal exige publicidade e identificação dos autores das decisões judiciais.

O jurista também apontou que a resolução fere o modelo do juiz das garantias previsto no Código de Processo Penal, já que os mesmos magistrados poderão atuar desde a fase investigativa até o julgamento.

A criação da Veoc reacende o debate sobre os limites entre segurança institucional e garantias constitucionais, e deve motivar questionamentos jurídicos nos próximos meses.

Com informações do Migalhas

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