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STF entra em fase decisiva no julgamento de Bolsonaro e aliados

Julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e mais sete réus começou no dia 2 de setembro e avança para os votos dos ministros da 1ª Turma

Por Da Redação

STF entra em fase decisiva no julgamento de Bolsonaro e aliados Créditos: @vinicius.foto

O Supremo Tribunal Federal (STF) inicia nesta terça-feira (09) a etapa mais aguardada da ação penal contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sete de seus principais aliados, acusados de participação em uma trama golpista. Depois do relatório, do parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR) e das sustentações orais das defesas, os ministros da Primeira Turma começam a votar.

O relator da ação, ministro Alexandre de Moraes, abre a sessão às 9h com um voto extenso, previsto para durar cerca de quatro horas. Nele, deve apontar as responsabilidades individuais de cada acusado, analisar provas, responder às preliminares levantadas pelas defesas e indicar eventual condenação ou absolvição. Moraes também pode propor agravantes, como no caso de Bolsonaro, apontado pela PGR como líder da organização criminosa, que pode elevar a pena do ex-presidente.

Entre os crimes imputados estão:  tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado contra patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado. O deputado federal Alexandre Ramagem (PL), ex-diretor da Abin, responde a três acusações, já que duas foram suspensas por decisão da Câmara.

Após Moraes, o ministro Flávio Dino deve apresentar seu voto ainda na terça-feira, com previsão de até duas horas de exposição. Na quarta-feira (10), será a vez de Luiz Fux, seguido por Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. A expectativa é que o julgamento se estenda até 12 de setembro, quando deve ser concluída a dosimetria das penas.

Os acusados

  • Jair Bolsonaro: apontado como líder da trama golpista, teria articulado um plano para permanecer no poder após a derrota eleitoral.

  • Alexandre Ramagem: acusado de difundir informações falsas sobre fraude nas urnas.

  • Almir Garnier Santos: ex-comandante da Marinha, teria colocado tropas à disposição do golpe.

  • Anderson Torres: ex-ministro da Justiça, guardava a chamada “minuta do golpe” em sua residência.

  • Augusto Heleno: ex-chefe do GSI, participou de transmissões ao vivo contestando o sistema eleitoral.

  • Mauro Cid: ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator do caso, participou de reuniões e trocou mensagens sobre o plano.

  • Paulo Sérgio Nogueira: ex-ministro da Defesa, teria apresentado a militares decreto redigido por Bolsonaro para anular as eleições.

  • Walter Braga Netto: único preso entre os réus, ex-ministro e general da reserva, é acusado de financiar acampamentos golpistas e até planejar atentado contra Moraes.

Primeiras sessões

Nos dias 2 e 3 de setembro, as defesas tentaram afastar as acusações, alegando ausência de provas e irregularidades no processo. Todas pediram absolvição. O ponto mais contestado foi a delação de Mauro Cid, considerada contraditória.

O advogado de Braga Netto, José Luis Mendes de Oliveira Lima, criticou duramente o delator: “É um escândalo ele esquecer esse detalhe. Estamos falando da entrega de dinheiro para financiar um golpe de Estado. Vai se dar credibilidade a esse réu colaborador que mente o tempo inteiro?”.

A defesa de Bolsonaro também atacou Cid e negou qualquer participação do ex-presidente em planos de golpe ou nos atos de 8 de janeiro. “Não há uma única prova que atrele o presidente à operação Punhal Verde e Amarelo, ao 8 de Janeiro ou a qualquer outra iniciativa. Nem o delator chegou a afirmar isso”, afirmou o advogado Celso Vilardi.

A PGR manteve a acusação de que todos os oito atuaram contra a ordem democrática e defendeu a condenação em todos os pontos da denúncia.

Críticas ao relator

As sustentações também reservaram espaço para ataques ao ministro Alexandre de Moraes. A defesa do general Augusto Heleno acusou o relator de atuar de forma parcial, alegando que ele teria acumulado papéis de acusador e julgador. “O juiz não pode tornar-se protagonista do processo”, afirmou o advogado Matheus Milanez, que ainda destacou a diferença no número de perguntas feitas durante os interrogatórios: segundo ele, Moraes formulou 302 questionamentos, contra 59 feitos pelo procurador-geral Paulo Gonet.

No caso de Mauro Cid, os advogados pediram a manutenção dos benefícios da delação premiada. Alegaram que as contradições apontadas pela acusação não derivam de má-fé, mas da pressão e do impacto psicológico sofrido pelo ex-ajudante de ordens. “Não é exigido que um colaborador – que perdeu a carreira, se afastou da família e dos amigos – traga detalhes absolutamente sem falhas. Escorregões são humanos, mas nada que comprometa o acordo de delação”, defendeu Jair Alves Pereira. A defesa também rechaçou a autenticidade de mensagens atribuídas a Cid em conversas com o advogado Eduardo Kuntz, apontando que o documento sequer foi registrado em cartório. O caso segue em apuração pela Polícia Federal.

Outras estratégias de defesa

O ex-diretor da Abin, Alexandre Ramagem, também contestou a denúncia da PGR. Segundo seu advogado, Paulo Renato Garcia Cintra Pinto, ele apenas reunia declarações já feitas publicamente por Bolsonaro. “É muito grave dizer que Ramagem seria ensaísta de Jair Bolsonaro. Quando muito, era um compilador oficial da República, porque os documentos só continham falas públicas do então presidente”, afirmou. O defensor pediu ainda a retirada do crime de organização criminosa, por entender que os fatos ocorreram após a diplomação, e solicitou que indícios da chamada “Abin Paralela” não sejam aproveitados no julgamento.

Já Anderson Torres concentrou sua defesa em rebater a acusação de falsificação de um bilhete de viagem, interpretado pela PGR como tentativa de fuga. O advogado Eumar Novacki argumentou que a viagem a Orlando havia sido programada desde novembro de 2022 para férias em família. “O objetivo era confundir a população e desviar o foco das provas. Tentaram induzir os julgadores ao erro”, afirmou.

O ex-comandante da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, também negou ter colocado tropas à disposição de Bolsonaro. Seu advogado, Demóstenes Torres, afirmou que a PGR não apresentou provas nesse sentido. “O procurador-geral ficou apenas na alegação, sem qualquer lastro”, disse. Em sua fala, Demóstenes dedicou boa parte do tempo a elogiar os ministros do STF e a relembrar sua relação pessoal com o ex-presidente.

Por fim, a defesa do ex-ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, sustentou que ele teria atuado justamente no sentido contrário ao golpe. “Ele trabalhou ativamente para demover o presidente de qualquer medida dessa natureza”, declarou o advogado Andrew Fernandes. Segundo ele, a preocupação do general era preservar a unidade das Forças Armadas e a memória de Caxias. Paulo Sérgio foi o único réu a comparecer presencialmente ao julgamento até agora.

Acusação
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, reforçou em sua sustentação que todos os acusados devem ser condenados, conforme já havia defendido nas alegações finais. Segundo ele, quando Jair Bolsonaro decidiu se reunir com os comandantes das Forças Armadas, a intenção não era buscar uma consulta de caráter constitucional, mas sim articular a fase final de uma tentativa de golpe de Estado.

“Quando o presidente da República e o ministro da Defesa se reúnem com comandantes militares, sob sua direção política e hierárquica, para consultá-los sobre a execução da fase final do golpe, o golpe, ele mesmo, já está em curso de realização”, afirmou Gonet durante o julgamento.

O procurador-geral destacou que a sequência de fatos já comprova a consumação de uma ruptura democrática. “Ficou claro que, em diferentes momentos, houve a conclamação pública do então presidente da República para que não se utilizassem as urnas eletrônicas previstas na legislação, sob a ameaça de que as eleições não viessem a ocorrer, além de manifestações de resistência ativa contra os seus resultados”, acrescentou.

Gonet também ressaltou que Bolsonaro e seus aliados não aceitaram a derrota nas urnas e, por isso, passaram a conspirar contra a ordem democrática. “Os golpes podem vir de fora da estrutura de poder existente, mas também podem ser engendrados pela perversão dela própria. A história do Brasil e de tantas outras nações mostra exemplos dessa segunda forma: o inconformismo com o término regular do período de mando costuma ser o estopim de crises contra a normalidade democrática, provocadas pelos seus inimigos violentos”, afirmou.

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