ICMS Ecológico nasceu no Paraná e inspira COP30, e já destinou mais de R$ 12 bilhões
Modelo criado no Paraná há 34 anos virou referência mundial ao recompensar municípios que preservam rios e florestas. E já destinou bilhões de reais para políticas ambientais e sociais
Créditos: Arquivo pessoal
Eliane Alexandrino/ Cascavel
O ICMS Ecológico, mecanismo que recompensa financeiramente municípios pela preservação ambiental, nasceu no Paraná e tornou-se referência global três décadas antes de a COP30 colocar justiça climática e financiamento verde no centro das discussões internacionais. O estado foi pioneiro ao premiar quem protege rios, florestas e áreas de conservação, transformando política ambiental em resultado fiscal e social.
A autoria é reivindicada pelo ex-deputado Neivo Beraldin, que integrou a Constituinte Estadual de 1988 e propôs o modelo como resposta ao avanço agropecuário sobre mananciais e unidades de conservação. Em 1991, durante o governo de Roberto Requião, o Paraná aprovou a Lei Complementar nº 59/1991, que destinou parte do repasse do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) à qualidade ambiental dos municípios. Era uma medida inédita no Brasil e no mundo, anterior até ao Protocolo de Kyoto.
“Eu incluí na Constituição do Estado a possibilidade de remunerar municípios com importância ecológica. Depois, apresentei a Lei Complementar 59/91, que efetivamente criou o ICMS Ecológico”, explica Beraldin. “Dos 25% do ICMS que pertencem aos municípios, eu destinei 5% para a importância ambiental: 2,5% para mananciais de abastecimento público e 2,5% para florestas e unidades de conservação”.
O modelo transformou a relação entre desenvolvimento e proteção ambiental. Quando passou a vigorar, em 1º de janeiro de 1992, apenas 52 municípios eram habilitados. Hoje, são mais de 240. O impacto foi amplo: centenas de áreas verdes foram criadas, houve incentivo à regularização ambiental e os repasses somam mais de R$ 12 bilhões, ajudando prefeituras a financiar saúde, educação, coleta de lixo e infraestrutura.
“A lei é justa e moderna até hoje. Cuida melhor do meio ambiente, recebe mais. Descuida, recebe menos. É compensação financeira para municípios que têm restrições territoriais por abrigarem áreas protegidas. Nós já fazíamos, há 34 anos, o que o mundo está discutindo agora”, afirma o ex-deputado. Ele ressalta que municípios com grandes áreas preservadas, como Céu Azul, Matelândia e Medianeira, recebem valores expressivos por abrigarem o Parque Nacional do Iguaçu.
O pioneirismo paranaense abriu caminho para o país. Atualmente, 19 estados brasileiros adotam versões do ICMS Ecológico, e o instrumento é estudado por nações que buscam mecanismos práticos de compensação ambiental sem criação de novos impostos.
Pioneirismo na pauta da COP30
A COP30, acontece este ano, em Belém do Pará, recoloca no palco global a discussão sobre financiamento climático. Para Beraldin, o Brasil tem exemplos concretos a apresentar. “Nosso modelo prova que preservação não é discurso, é prática. É justiça fiscal ambiental”.
O ex-parlamentar, que nasceu em Quatro Barras e reside próximo a áreas de mananciais, voltou recentemente ao centro do debate político. Já esteve reunido com lideranças recentemente para debater novos projetos para o Paraná, reforçando a conexão entre meio ambiente e desenvolvimento.
Estado repassa R$ 316 milhões a cidades com áreas protegidas no 1º semestre
R$ 20 milhões só para o litoral em 2025
Além do histórico, os números seguem crescendo. De janeiro a agosto de 2025, municípios do litoral paranaense receberam mais de R$ 20 milhões em repasses do ICMS Ecológico. Antonina lidera com R$ 5.935.089,26, seguida por Guaraqueçaba (R$ 4.677.455,47), Matinhos (R$ 2.908.056,28), Guaratuba (R$ 2.429.704,26), Morretes (R$ 2.108.886,41), Paranaguá (R$ 1.738.711,47) e Pontal do Paraná (R$ 215.572,48).
Segundo dados da Divisão de Incentivos à Conservação do Instituto Água e Terra (IAT), 269 dos 399 municípios paranaenses receberam repasses em 2024, contemplando 901 unidades de conservação e mais de 150 bacias de mananciais, com R$ 600 milhões distribuídos. No primeiro semestre de 2025, os repasses já somam R$ 316 milhões.
O programa Biodiversidade Litoral do Paraná (BLP) também fortalece o mecanismo, com investimento de mais de R$ 110 milhões em 10 anos. A iniciativa apoia unidades de conservação, pesquisa e manejo sustentável, ampliando arrecadação e reduzindo custos municipais.
Impacto direto nas cidades
Além de preservar, o ICMS Ecológico gera retorno social. Recursos podem ser usados livremente por prefeituras: construção de escolas, postos de saúde, coleta de lixo, folha salarial e programas sociais.
Em Antonina, as áreas administradas pela Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS) geram quase R$ 5 milhões anuais com apenas 12 mil hectares, beneficiando mais de 20 mil moradores.
Em Pontal do Paraná, o secretário municipal do Meio Ambiente, Jackson Bassfeld, afirma que o repasse estimula criação de novas áreas protegidas, melhora gestão das existentes e traz retorno financeiro sem aumento de gastos próprios.
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Como o município pode aderir ao ICMS Ecológico
Municípios interessados em aderir ao ICMS Ecológico contam com apoio técnico do Instituto Água e Terra (IAT), que disponibiliza ferramentas de planejamento e orientação no site oficial. Entre os recursos estão um simulador e um painel interativo que permitem avaliar o impacto da criação de novas unidades de conservação e a projeção de arrecadação futura. A qualidade da gestão ambiental também influencia nos repasses, já que áreas bem estruturadas recebem pontuação maior e ampliam o retorno financeiro.
Apesar de ser um recurso de livre aplicação, muitos municípios optam por destinar parte dos valores recebidos à própria área ambiental, criando novas unidades de conservação, regularizando territórios e fortalecendo estruturas de gestão. A ampliação das áreas protegidas e a melhoria de manejo tendem a elevar as notas de avaliação do IAT, o que resulta em repasses maiores ao longo dos anos.
Quem é Neivo Beraldin?
Neivo Beraldin ingressou na carreira política em 1982, como vereador de Curitiba. Posteriormente, foi deputado estadual no Paraná por 6 legislaturas, secretário do Esporte e Lazer em Curitiba, autor de mais de 100 leis, sendo que a de maior destaque é a lei do ICMS Ecológico. Em novembro de 2019, Beraldin foi homenageado na Alep - Assembleia Legislativa do Paraná, com o título de Cidadania Honorário do Paraná.
Foto: Divulgação
