TJ-PR suspende licitação bilionária do governador Ratinho Júnior
A licitação em questão trata-se de um plano para a implantação de unidades de atendimento ao cidadão em todo o estado
O Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) suspendeu a licitação do governo de Ratinho Júnior (PSD) que previa a criação de unidades de atendimento ao cidadão em todo o estado, com o objetivo de implantar 20 centros em 18 municípios, incluindo três em Curitiba.
A proposta busca implementar o projeto Descomplica Paraná, que pretende centralizar em um único local os serviços de 14 órgãos públicos, como a Secretaria de Educação, a Secretaria da Justiça e Trabalho, e o Instituto de Identificação. Inspirado no modelo Poupatempo de São Paulo, esse projeto foi uma promessa de campanha do governador em 2022. A licitação, uma das maiores do país, tinha valor inicial de R$ 943 milhões em março de 2024, valor que foi atualizado para R$ 1,02 bilhão conforme o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). O governo do Paraná já recorreu da decisão judicial em busca da retomada do processo.
A suspensão foi determinada pelo desembargador Rogério Etzel, da 5ª Câmara Cível do TJ-PR, em atendimento a um mandado de segurança solicitado por uma empresa de consultoria e projetos que contestou exigências do edital que, segundo a empresa, restringiam a competição. Entre as exigências controversas estão a necessidade de atestados de capacidade técnica exclusivamente de pessoas jurídicas de direito público e a exigência de um software proprietário.
Além das suspeitas de direcionamento, um parecer técnico da 4ª Inspetoria de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) também recomendou a suspensão, apontando sobrepreço significativo. O parecer técnico, utilizado pelo desembargador como base para a decisão, aponta: "(...) sobrepreço no edital de licitação, que ocorre na ordem de grandeza da centena de milhões de reais. Apenas no item energia elétrica, há sobrepreço de R$ 36.435.827,79, pois foi considerado R$ 3,00/kWh, enquanto o valor praticado no mercado é de R$ 0,81/kWh."
O parecer acrescenta que "existem verbas genéricas e estimativas de remunerações aos terceirizados em patamares superiores ao de mercado, sem que haja garantia de que o valor disposto na proposta seja efetivamente pago aos servidores terceirizados".
Ainda segundo o documento, o orçamento foi considerado "inservível", pois foi baseado em premissas incorretas, como a previsão de 953 funcionários, enquanto o planejamento da licitação aponta a necessidade de 864 pessoas. "Ou seja, elaborou-se um orçamento sem se saber exatamente qual serviço seria contratado, ignorando todas as boas práticas orçamentárias para editais de licitação."
Os técnicos também observaram restrições à competitividade devido às exigências do edital. "Ao se exigir atestado de itens que representam mais de 50% do quantitativo contratado, ou que representam menos de 4% do valor global da contratação, exigindo-se também o somatório dos atestados, existe alta probabilidade de baixa competitividade no certame." O parecer conclui que "é alta a probabilidade de baixa ou inexistência de competição e baixos descontos, o que resultaria em superfaturamento e dano ao erário."
A Secretaria de Administração do Paraná, responsável pela licitação, enviou nota ao jornal Gazeta do Paraná na quinta-feira (31), informando que já entrou com recurso para tentar reverter a liminar. Segundo a nota, "a licitação seguiu todas as etapas previstas pela Nova Lei de Licitações e, inclusive, foi revisada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). O projeto das Centrais de Atendimento ao Cidadão visa reunir diversos serviços em um só local para facilitar o acesso da população e aprimorar os canais digitais de comunicação entre a população e o poder público. A primeira fase prevê a instalação de 20 centrais, com a expectativa de que o projeto traga celeridade e melhore o atendimento aos cidadãos paranaenses".
Relator do processo no TJ-PR, o desembargador Rogério Etzel considerou que a suspensão da licitação não prejudica o cidadão nem o estado. Em sua decisão, ele cita o relatório do TCE-PR, que identificou sobrepreço de centenas de milhões de reais, incluindo quase R$ 36,5 milhões apenas no item energia elétrica.
O TCE também destacou problemas relacionados à restrição de competitividade, devido a exigências técnicas questionáveis. A empresa que requereu a suspensão judicial do edital apresentou argumentos semelhantes.
Entre as supostas irregularidades está a exigência de que a empresa tenha software próprio, proibindo a subcontratação para desenvolvimento e manutenção da plataforma digital.
Em entrevista à RPC, o secretário estadual de Planejamento, Guto Silva, negou a existência de ilegalidades e restrições no edital. "Nós elevamos o padrão. Não queremos uma empresa aventureira para implementar esse processo complexo e importante. A empresa precisa comprovar que já atua em outras regiões e que presta o serviço. Isso trará economia aos cofres do estado." O governo do Paraná recorreu da decisão que suspendeu a licitação, mas não há um prazo definido para que a Justiça analise o recurso.
Requião Filho contesta
Durante sessão plenária na quarta-feira (30), o deputado estadual Requião Filho (PT) destacou a decisão do TJPR de suspender a licitação do programa de Contratação das Centrais de Atendimento ao Cidadão.
Requião Filho reforçou que, quando o programa foi discutido na Assembleia, o projeto foi criticado por ele, mas aprovado pela maioria dos parlamentares. “Eu fui contrário, avisei que já tinha dado errado em outros estados e era mais caro. Mesmo assim, foi aprovado pela maioria dos deputados. O Tribunal de Contas apresentou um parecer técnico contrário e isso foi ignorado. Agora, o Tribunal de Justiça suspende a licitação por causa de indícios de direcionamento e sobrepreço. É preocupante destaca Requião Filho.