Saúde mental de mães é tema de campanha em Curitiba: 'Trabalho materno é trabalho social, sem mães não existe sociedade', afirma organizadora
Por Giuliano Saito

Dados OMS mostram uma a cada cinco mulheres terá ao menos um episódio relacionado à saúde mental ainda durante a gravidez ou em até um ano após o nascimento do bebê. Saúde mental de mães é tema de campanha em Curitiba Divulgação u A conexão imediata com o bebê, o chamado 'instinto' materno, a grande cobrança para que mulheres mães deem conta de uma infinidade de novos desafios após a maternidade traz à tona uma discussão que tem ganhado força nas últimas décadas: a saúde mental de mulheres mães. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgados em 2022, mostram que uma a cada cinco mulheres terá, ao menos, um episódio relacionado à saúde mental ainda durante a gravidez ou em até um ano após o nascimento do bebê. Ainda segundo a OMS, entre as mulheres com problemas de saúde mental pós-parto, 20% terão pensamentos suicidas ou cometerão atos de automutilação. Compartilhe no WhatsApp Compartilhe no Telegram Podcast sobre 'perrengues' da vida materna, rodas de conversa, profissionais de diversas especialidades à disposição, festa exclusiva para mulheres mães, estão entre as várias atividades oferecidas pelo movimento 'Maio Furta-Cor' em Curitiba que atua em prol do debate sobre a saúde mental das mães, em especial no mês de maio. A iniciativa é uma campanha comunitária, sem fins lucrativos, com mobilização em outros estados e também países. Na capital paranaense, 68 mães compõem o grupo, conforme a coordenadora e também comunicadora Cláudia Pacheco. Para ela, a discussão do tema é uma questão social. “Trabalho materno é trabalho social, se não existissem mães não existiria sociedade”, frisou Cláudia. Mãe de duas crianças, ela conta que conheceu o projeto há dois anos e que foi através dele que pode enfrentar uma dos maiores desafios após a maternidade: burnout no trabalho após a pandemia. Cláudia coordena iniciativa em Curitiba Arquivo pessoal "A hora que liberou, a hora que voltou a escola, a hora que voltou o trabalho, que voltou tudo, o meu corpo adoeceu. Aí eu achei esse grupo e percebi que precisamos falar mais do que só saúde mental no sentido da psicologia, precisamos falar de renda, de rede de apoio, de empreendedorismo, me encontrei aqui", afirmou. As atividades desenvolvidas durante todo mês são oferecidas com apoio de profissionais como fotógrafas, psicólogas, médicas, enfermeiras, contadoras, pedagogas entre outros. O mês de atividades será finalizado com festa "A mãe ta on" dedicada exclusivamente as mães, com show exclusivo para elas. "A saúde mental é sobre psicologia e também passa pelo apoio dessa maternidade, né? Então, assim, o que fazer, como fazer? Porque a gente, às vezes, está perdida, e não sabe muito como sair daquilo, porque o que parece, quando a gente ver a mãe, é que a gente é obrigado a saber de tudo. Vamos celebrar a maternidade," afirmou Cláudia. 'Pílulas de perrengue' e reflexão sobre cuidado da saúde mental Gláucia, Claúdia e outras mães em atividades sobre saúde mental Arquivo pessoal Cláudia e outras mães do grupo criaram recentemente um podcast sobre 'pílulas de perrengue' vivenciadas na vida materna. Uma das participantes e também integrante do grupo em prol da saúde mental de mulheres mães é a terapeuta integrativa Glaciane Heil dos Santos. Mãe de quatro filhos com idades entre 12 e 5 anos, ela lida diariamente com a jornada materna associada à vida profissional. Para ela, imaginar a rotina também é pensar em um tempo para ela. “Penso em todas as atividades que as crianças têm. Levar ao pediatra, dentista, ir encaixando isso no dia a dia, mas além disso, também de encaixar minhas próprias terapias particulares, não só as que eu exerço profissionalmente, mas as que faço para mim justamente por conta da saúde mental, para poder equilibrar", explicou. Refletir sobre a importância de estar bem física e emocionalmente para poder ser uma mãe participativa na vida dos filhos foi o grande despertar para ela passar a se ver e se perceber. O nascimento do segundo filho fez Glaciane refletir sobre o trabalho que tinha. Ela afirmou que não se encaixava mais naquele espaço. “Comecei uma nova jornada, uma nova busca de mim mesma para conseguir uma nova profissão e também algo que adequasse melhor para eu conviver mais com as crianças. Além disso engravidei dos gêmeos. Foi uma surpresa que hoje em dia falou que trouxe muita, muita prosperidade para nós, mas que naquele momento foi um momento muito sensível, que eu realmente pensei que ia pirar", afirmou a terapeuta. Saúde mental de mães é tema de campanha em Curitiba Arquivo pessoal O grupo formado através da iniciativa 'Maio Furta-Cor' foi o ambiente para a redescoberta dela após a maternidade. Falar abertamente com outras mães sobre o processo foi 'libertador', especialmente porque para ela falta mudança estrutural para que homens também participem mais ativamente da educação dos filhos. “Libertador porque acho de extrema importância trazer esse assunto da saúde mental das mulheres, porque a gente realmente tem uma sobrecarga mental muito grande mental e física. Eu acho que falta ainda muito a gente quebrar a questão do machismo mesmo, o histórico de que a mãe tem que ser tudo", frisou. 'Quem cuida também precisa de cuidado' "Quem cuida também precisa de cuidado", afirmou a psicóloga Cínthia Pereira Alves em entrevista ao g1. A frase que não requer muitas explicações pela facilidade de compreensão ainda é um desafio para muitas mães, segundo a profissional, por alguns fatores. "Infelizmente a realidade brasileira é de muito abandono paterno, aumentando a sobrecarga. O problema é estrutural, ainda muito lincado a cultura do machismo e de ser a única responsável pelo cuidado. É necessária uma mudança na cultura para que homens também sejam educados para ser funcionais, desde as atividades dentro de casa, com divisão de tarefas", afirmou a profissional. Leia também 'Carga mental' oprime mães e afeta educação dos filhos: o que é e como 'desenhar' isso para os pais? Saúde mental de mães é tema de campanha em Curitiba Arquivo pessoal Para ela, outra questão necessária, é uma grande mudança estrutural na sociedade. Questões como jornadas maternas versus profissionais precisam ser reavaliadas. Ela afirma que a mudança de emprego de muitas mulheres, após a maternidade, tem a ver com políticas inadequadas de empresas que não se preocupam com o bem-estar das mães após o retorno ao trabalho para que haja uma conciliação entre a vida profissional e a maternidade. O bem-estar das mulheres para além da maternidade é uma das chaves para o equilíbrio que, por vezes, parece não caber na rotina das mães, segundo a profissional. "A criança vai sofrer esses impactos [...], se a saúde mental dela estiver comprometida, se ela não funcionar em seu estado de equilíbrio. Então, não conseguirá promover muitas vezes todos os cuidados que a criança que está descobrindo o mundo precisa." "Uma mãe mentalmente saudável, psicologicamente bem, forma crianças mentalmente saudável e psicologicamente bem. Mas precisamos lembrar que isso não depende só da mãe, mas a saúde mental dos cuidadores interfere diretamente no bem estar da criança", afirmou a psicóloga. Ela reforça, no entanto, que as mulheres mães também precisam se enxergar com mais carinho. Para além da maternidade, elas também compõe uma infinidade de outras funções. "A mulher se transformou em mãe, ser mãe é mais um papel que essa mulher exerce. É importante que ela perceba o cuidado também com essas outras existências. [...] Não existe uma receita, mas você também têm desejos e necessidades e não precisa deixar de ser quem você é por ser mãe", explicou. VÍDEOS: Mais assistidos g1 PR Veja mais notícias do estado em g1 Paraná.
Você também pode gostar
Leia mais: https://g1.globo.com/pr/oeste-sudoeste/noticia/2023/05/13/saude-mental-de-maes-e-tema-de-campanha-em-curitiba-trabalho-materno-e-trabalho-social-sem-maes-nao-existe-sociedade-afirma-organizadora.ghtml