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Prefeitura aponta falhas em processo disciplinar sobre caso de abuso infantil em CMEI

Sindicância aponta falhas graves na condução de processo sobre servidor acusado de abuso e leva prefeitura a adotar medidas para evitar novas omissões

Por Gabriel Porta

Prefeitura aponta falhas em processo disciplinar sobre caso de abuso infantil em CMEI Créditos: Nucria/Divulgação

A Prefeitura de Cascavel concluiu o processo de sindicância que apurou a demora na condução de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) aberto em 2021 para investigar um servidor acusado de abuso sexual contra uma criança. O caso teve origem em uma denúncia feita em junho de 2020.

De acordo com o relatório da sindicância, a maior parte da responsabilidade pela demora recai sobre a então presidente da comissão processante, que permaneceu à frente do caso por mais de três anos sem realizar movimentações processuais efetivas. A servidora limitou-se a solicitar sucessivas prorrogações de prazo, sem a adoção de diligências necessárias para o andamento e conclusão do processo.

O histórico mostra que o caso começou com uma investigação preliminar sumária instaurada ainda em julho de 2020, após denúncia formalizada pela mãe da vítima. A investigação seguiu para abertura do PAD em janeiro de 2021, mas, a partir desse momento, praticamente não houve avanço significativo.

O relatório descreve que a presidente da comissão alegou, como justificativa, problemas como sobrecarga de trabalho, acúmulo de processos, falta de estrutura na Controladoria-Geral do Município e dificuldades decorrentes da pandemia de Covid-19. No entanto, a sindicância apontou que tais argumentos não se sustentam, especialmente considerando que a própria servidora não conseguiu comprovar, nos autos, nenhuma ação concreta que justificasse a manutenção do processo ativo sem conclusão.

Além disso, ficou constatado que os demais membros designados para compor a comissão sequer foram oficialmente notificados sobre sua participação no PAD. Um deles afirmou, durante depoimento, que apenas tomou conhecimento de que seu nome constava como membro da comissão ao ser chamado pela própria sindicância, sem nunca ter recebido qualquer comunicação formal, nem participado de audiências ou atos processuais. Outro servidor relatou situação semelhante, reforçando que o processo esteve, de fato, sob responsabilidade exclusiva da presidente.

A situação se agravou a ponto de gerar desconforto interno. O relatório narra que, em meados de 2024, houve episódios de discussões acaloradas entre o controlador-geral do município e a presidente da comissão, motivados pelas cobranças constantes sobre a falta de andamento do PAD. O episódio culminou na substituição da servidora pela condução do processo, medida formalizada em junho daquele ano.

O relatório também chama atenção para uma deficiência estrutural crônica na Controladoria-Geral do Município. O órgão responsável pelos processos disciplinares operava, à época, com número insuficiente de servidores e sem a presença de um Corregedor Municipal — cargo fundamental para garantir o acompanhamento, a padronização e a orientação técnica dos processos internos.

Entre as conclusões, a sindicância destaca que a demora no PAD não pode ser atribuída a fatores externos, mas sim à falta de iniciativa da então presidente da comissão, que deixou de adotar medidas mínimas, como a realização de oitivas, a solicitação de documentos e até a comunicação formal com órgãos como o Nucria (Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítimas de Crimes) e o Ministério Público.

O documento também evidencia que a própria Secretaria Municipal de Educação, onde o servidor investigado atuava, tinha conhecimento de que os processos na Controladoria costumavam demorar. Apesar disso, o relatório recomenda que a pasta adote boas práticas, criando fluxos de acompanhamento dos processos disciplinares considerados de maior relevância.

O relatório foi encaminhado ao prefeito Renato Silva, que acatou todas as recomendações da comissão. Entre as medidas, está a abertura de um novo Processo Administrativo Disciplinar para apurar a conduta da servidora responsável pela condução do PAD paralisado. Também foi determinada, por decreto, a nomeação imediata de um Corregedor Municipal, além da elaboração de normativas para padronizar procedimentos e formalizar atos processuais, como a obrigatoriedade de notificação escrita dos membros das comissões.

O relatório ainda será compartilhado com o Ministério Público do Paraná, que deverá avaliar a adoção de medidas cabíveis diante dos fatos apurados.

Em apresentação do relatório, a secretária de Comunicação, Beth Leal, destacou que as prorrogações no processo ocorreram com autorização do então prefeito Leonaldo Paranhos. “O chefe da administração na época, Leonaldo Paranhos, autorizou as prorrogações com base nas alegações apresentadas”, afirmou.

Beth também ressaltou que a atual gestão tem adotado medidas para reforçar a transparência e a agilidade nos processos internos. “O prefeito Renato Silva e toda a equipe de governo estão comprometidos em conduzir essas situações com máxima responsabilidade, garantindo mais celeridade e clareza nas apurações”, concluiu.

CPI na Câmara?

Após a apresentação do relatório sobre o caso, cresce dentro da Câmara de Cascavel o debate sobre a possibilidade de instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). A proposta visa aprofundar a apuração, especialmente no que diz respeito à atuação da gestão anterior, comandada por Leonaldo Paranhos, na condução da sindicância que deu origem ao processo.

O vereador Edson Souza (MDB) foi um dos que defenderam publicamente a criação da CPI. Para ele, é necessário esclarecer não apenas a responsabilidade da servidora envolvida, mas também o papel de outras autoridades da antiga gestão. “Ficou claro que haverá punição para a servidora, mas, na minha visão, o ex-prefeito também tinha conhecimento, assim como outros. E, até agora, não há qualquer responsabilização sobre eles. Por isso, acredito que nosso dever é abrir uma CPI”, declarou.

O vereador Lauri (MDB) também defendeu a abertura da CPI. O parlamentar destacou que a situação envolve elementos claros de negligência, imprudência e imperícia por parte da administração pública na condução do caso. “Se não formos enérgicos com atos fiscalizatórios e não aprofundarmos essa investigação, esse tipo de situação pode se repetir”, alertou.