Preço do cafezinho mais caro
Impacta no bolso Plantações de café brasileiras, que produzem principalmente grãos arábica foram prejudicadas pelo mau tempo
Por Gazeta do Paraná
Se você está achando que o café está caro, prepare o bolso: ele pode aumentar ainda mais. O preço do café nos mercados internacionais de commodities atingiu seu nível mais alto já registrado. O preço dos grãos de café arábica, que é a maior parte da produção global, ultrapassou US$ 3,44 a libra (0,45 kg), tendo aumentado mais de 80% este ano. O custo dos grãos de robusta, enquanto isso, atingiu o pico em setembro.
Isso ocorre porque os comerciantes de café esperam que as safras diminuam depois que os dois maiores produtores do mundo, Brasil e Vietnã, foram atingidos por fenômenos climáticos extremos, como secas e inundações. Enquanto isso, a popularidade da bebida continua a crescer.
Embora nos últimos anos as principais indústrias que processam café tenham conseguido absorver os aumentos de preços para manter os clientes e a participação de mercado, parece que isso está prestes a mudar, de acordo com Vinh Nguyen, o presidente-executivo da Tuan Loc Commodities.
"Marcas como JDE Peet, Nestlé e todas essas, [anteriormente] absorveram o impacto da alta de preços da matéria-prima", disse ele. "Mas agora elas estão quase em um ponto de inflexão. Muitas delas estão pensando em um aumento de preço nos supermercados no [primeiro trimestre] de 2025."
Em um evento para investidores em novembro, um alto executivo da Nestlé disse que a indústria do café estava enfrentando "tempos difíceis", admitindo que sua empresa teria que ajustar seus preços e tamanhos de embalagem. "Não somos imunes ao preço do café, longe disso", disse David Rennie, chefe de marcas de café da Nestlé.
Seca e chuva forte
O último recorde de alta para o café havia sido em 1977, após uma geada incomum devastar plantações no Brasil.
"Preocupações com a safra de 2025 no Brasil são o principal motivador", diz Ole Hansen, chefe de estratégia de commodities do Saxo Bank.
"O país sofreu sua pior seca em 70 anos durante agosto e setembro, seguida por fortes chuvas em outubro, aumentando os temores de que a safra possa fracassar."
E não foram apenas as plantações de café brasileiras, que produzem principalmente grãos arábica, que foram prejudicadas pelo mau tempo.
Os suprimentos de robusta também devem diminuir depois que as plantações no Vietnã, o maior produtor dessa variedade, também enfrentaram seca e chuvas fortes.
O café é a segunda commodity mais negociada do mundo em volume, depois do petróleo bruto.
E sua popularidade está aumentando — o consumo na China, por exemplo, mais que dobrou na última década.
"A demanda pela commodity continua alta, enquanto os estoques mantidos por produtores e empresas de processamento estão baixos", diz Fernanda Okada, analista de preços de café da S&P Global Commodity Insights. "A tendência de alta nos preços do café deve persistir por algum tempo", acrescenta.
Prejuízos
Em Minas Gerais, o maior estado produtor de café no principal país fornecedor desses grãos do mundo, produtores e exportadores costumam comemorar o aumento dos preços da commodity. Não este ano.
Após várias safras decepcionantes, uma forte alta nos preços deixou alguns produtores renomados lutando para equilibrar suas finanças, pois se encontraram sem dinheiro suficiente para cobrir suas operações de hedge na Bolsa de Nova York.
A Atlântica Exportação e Importação, por exemplo, que afirma ser responsável por 8% das vendas de café arábica do Brasil, solicitou na semana passada à Justiça mais tempo para negociar com os credores a fim de evitar um pedido de falência.
A empresa irmã Cafebras Comércio de Cafés do Brasil está buscando o mesmo período de carência de 60 dias. Observadores da indústria dizem que elas não serão as últimas. "O pânico tomou conta do mercado com rumores de que outras tradings também poderiam enfrentar sérios problemas", disse Marcelo Moreira, especialista em café da Archer Consulting.
Os preços futuros dos grãos arábica — a variedade preferida para cafés premium — dispararam, saltando cerca de 70% entre janeiro e o final de novembro, para o maior nível em mais de quatro décadas. Os futuros recuaram ligeiramente desde então, mas não o suficiente para conter o sofrimento.
Quando os preços sobem, as corretoras exigem que os produtores e exportadores de café depositem mais dinheiro na forma de margem para cobrir possíveis perdas. Alguns traders que venderam futuros são forçados a recomprá-los para se afastarem do mercado, elevando ainda mais os preços em um círculo vicioso.
Moreira estima que até US$ 7 bilhões foram depositados em chamadas de margem durante novembro. Os preços do arábica ficaram praticamente estáveis nesta terça-feira, após terem chegado a subir até 1,6% em Nova York.
No Grupo Montesanto Tavares, dono da Atlântica e da Cafebras, o custo para manter os hedges saltou para impressionantes 158% dos recebíveis em novembro, comparado a 74% em maio, de acordo com um documento judicial visto pela Bloomberg News. “As constantes chamadas de margem tornaram a estrutura de caixa de curto prazo insustentável”, diz o documento assinado pelos advogados da Atlântica e da Cafebras.
Outras commodities em crise
Os preços crescentes do café estão empurrando o mercado para um ponto de ruptura, ecoando os problemas recentes em outras commodities importantes. No gás natural, os preços saíram do controle após a invasão da Ucrânia pela Rússia, forçando os governos nacionais a socorrer algumas concessionárias europeias.
No início deste ano, os futuros do cacau atingiram o nível mais alto nos dados que remontam a 1960 devido à escassez global de oferta, desencadeando inadimplência e litígios entre empresas de trading. Como muitos grandes operadores negociam em várias commodities, a alta do café só aumenta sua dor. "Altas taxas de margem são um grande estresse no lado financeiro e, para empresas comerciais com contratos de café e cacau, é um golpe duplo", diz Judy Ganes, presidente da J. Ganes Consulting.
Ineficiência agrava dificuldades
Além do estresse financeiro, o mercado de café também está sofrendo com altos custos logísticos e ineficiências. Os vendedores de café gastaram R$ 7 milhões (US$ 1,2 milhão) extras este ano em itens como espaço de armazenamento adicional e outras taxas portuárias, segundo o grupo de exportadores brasileiro Cecafé.
Os custos de envio entre os países produtores de café na Ásia e os mercados consumidores na Europa também estão aumentando em meio à crise no Mar Vermelho. Além disso, crescem as preocupações de que a próxima colheita de café arábica será menor devido a uma seca severa.
“É o movimento mais agressivo de que consigo lembrar em termos de reajustes de preços domésticos em uma janela muito curta”, escreveu o corretor Thiago Cazarini em um relatório. Entre custos de empréstimos mais altos e custos operacionais, “tudo está levando a uma atmosfera estressante, para não dizer fatal para os negócios”, ele registrou.
Créditos: Das Agências São Paulo