Pesquisa, ensaio, criação: conheça bastidores e entenda como funciona criar uma peça de teatro
Por Giuliano Saito

O Festival de Curitiba começa em dez dias e a preparação dos artistas anda intensa. g1 acompanhou os bastidores de duas produções que estreiam no evento. Atriz Nena Inoue em ensaio da peça 'Sobreviventes' Divulgação/Maringas Maciel Primeiro, segundo, terceiro sinal, a luz da plateia apaga e a luz do palco se acende. Enfim, o espetáculo começa. A expectativa - do público e dos artistas - de reencontrar esse ritual está grande. Faltam dez dias para o início da 31ª edição do Festival de Curitiba. O frio na barriga de quem sobe ao palco é certo, até mesmo para os veteranos. O motivo? Mesmo quando a temporada da peça é longa, nenhuma apresentação se repete. Cada exibição é única. Leia tudo sobre o Festival de Curitiba Confira a programação completa do festival Guia 2023: acesse a versão online A preparação é o que faz a diferença ao longo da criação. Para entender como funcionam esses processos, o g1 acompanhou os bastidores de dois espetáculos que vão estrear na Mostra Lúcia Camargo nesta edição do evento: • "Ovos Não Têm Janela", da Companhia Prego Torto. A peça traz texto inédito do dramaturgo Manoel Carlos Karam e pela primeira vez na direção o renomado iluminador Beto Bruel; • "Sobrevivente", com dramaturgia e direção de Henrique Fontes e atuação da atriz Nena Inoue, vencedora do Prêmio Shell 2019 com o espetáculo "Para Não Morrer". Ambos entram em cena no mesmo dia e horário, na segunda semana do festival. Nesta altura do processo, muita coisa é parecida na rotina das duas produções, e um dia é pouco para resolver tudo o que é preciso. O g1 acompanhou as duas produções ao longo do dia 10 de março. Os ensaios se intensificam, as marcações das cenas são definidas, e elementos como figurino, cenário e luz vão ganhando forma. O diretor Beto Bruel confessa que "não desliga nunca". “Acabamos de fazer a prova do figurino dos atores. Todos os dias vem alguém da equipe técnica assistir o ensaio. Ontem saí daqui às três da madrugada, estava gravando a luz da peça." Ensaio da peça 'Ovos Não Têm Janela' Divulgação/Nay Klym Inicialmente, "Ovos Não Têm Janela" iria estrear somente no segundo semestre de 2023. Mas, diante da possibilidade de estar na programação da Mostra Lúcia Camargo, os planos mudaram e o corre-corre começou. O tempo médio de produção de uma peça por uma companhia é de três meses. Com a mudança de planos, o grupo teve apenas 40 dias. “Não estamos acostumados a fazer isso tão rápido. A urgência adiantou algumas etapas. Já definimos o desenho das cenas, serão sete”, revela Bruel. LEIA TAMBÉM: Dicas ajudam público a escolher peças entre centenas de atrações da programação Guritiba tem programação dedicada às crianças; saiba como aproveitar espetáculo com os pequenos Acessibilidade: Festival de Curitiba tem peças com audiodescrição e intérprete de libras; veja programação Guênia Lemos é uma das atrizes do elenco. Ela conta que, nas duas primeiras semanas, havia muita dúvida. Porém, ao longo dos ensaios, diz que sentiram estar no caminho certo. Além dela, são mais quatro atores em cena: Gabriel Gorosito, Moa Leal, Renata Bruel e Sidy Correa. A produção é de Gilmar Kaminski. Eles ensaiam de segunda a sábado, alguns dias pela manhã e outros à noite. Em fevereiro o grupo começou fazendo leituras online, porque um dos atores estava viajando. Gorosito explica quem, para acelerar o processo, os atores tiveram que chegar nos ensaios com o texto todo decorado. O ator confessa que tem dificuldade para desligar da peça e relata que, em casa, às vezes, passa o texto com a filha de oito anos. O diretor releva que começaram a preparar o espetáculo pelo fim. "A primeira cena que ficou pronta será a última da peça”, diz. Beto Bruel brinca que nunca se imaginou como diretor e que os atores Guênia e Gorosito fizeram o convite para que ele assumisse a função. "Não sei como vim parar aqui! [...] Apesar do desafio, está sendo divertido, lido com bom humor. O teatro é uma escola de vida, não podemos ter medo de errar, temos que correr riscos”, brinca. Na plateia, o diretor e os atores de 'Ovos Não Têm Janela' Divulgação/Nay Klym A aposta no processo Em "Sobrevivente", o processo é a grande aposta do espetáculo - o segundo de uma trilogia iniciada por Nena Inoue, desta vez com o dramaturgo Henrique Fontes, por meio do teatro documental. O encontro entre eles se deu em 2019, antes da pandemia. Henrique tinha um texto ficcional que contava a história de uma mulher indígena. Ao investigar a própria história, a atriz descobriu que tinha uma avó materna indígena. “Corri atrás dessa pista e mudamos tudo”, conta Nena. E ela correu mesmo: viajou até Palmeiras de Goiás (GO) para entrar em contato com uma tia de 91 anos, e até Poços de Caldas (MG) para conhecer um amigo que era bem próximo dos pais dela, já falecidos. “Fui acreditando no processo, e o trabalho foi se revelando durante a investigação”, explica. Ancestralidade e apagamento, de acordo com a atriz, foram temas que se fizeram presentes. A dramaturgia foi sendo construída a partir dos relatos coletados. “A proposta inicial de falar de mulheres indígenas seguiu, mas a partir da arqueologia do apagamento fomos elucidando a narrativa da origem”, resume Henrique. O diretor e dramaturgo conta que já são quatro anos de pesquisa, mas o processo criativo começou há um ano e seis meses. São mais de 300 horas de trabalho. A poucos dias da estreia, o grupo faz passadas corridas da peça e, à medida em que outros elementos vão chegando, como figurino e cenário, vão entendendo como se dialogam com o trabalho. “A peça já mudou muitas vezes, muda todo dia, é um processo vivo, se atualiza continuamente”, afirma o dramaturgo. Como Henrique e Nena não moram na mesma cidade, tiveram que se revezar em viagens para trabalharem juntos. Neste último mês, os ensaios diários de cinco a seis horas estão acontecendo em Curitiba. “Gosto de ensaiar muito. Para assimilar bem preciso de tempo. Para mim quanto mais precisão, mais liberdade. Insegurança e ansiedade são normais, mas como confio em quem está junto, olhando de fora, cocriando, estou pronta para me jogar. Estamos ansiosos para encontrar o público”, comenta a atriz. Serviço: Ovos Não Têm Janela Dias: 05 e 06 de abril, às 20h30 Local: Auditório Potty Lazzarotto – MON (Rua Marechal Hermes, 999) Classificação: 16 Duração: 60 minutos Sobrevivente Dias: 05 e 06 de abril, às 20h30 Local: Teatro Zé Maria (Rua Treze de Maio, 655 – Centro) Classificação: Livre Duração: 75 minutos Os vídeos mais assistidos do g1 PR: Mais notícias do estado em g1 Paraná.
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