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'Muitos já choraram para que eu estivesse aqui', diz professora que tirou roupa para protestar contra racismo em supermercado de Curitiba

Por Giuliano Saito


Caso ocorreu na sexta-feira (7), em Curitiba, no Atacadão, que faz parte da rede Carrefour. Polícia instaurou inquérito para apurar a se houve crime de racismo. 'Muitos já choraram para que eu estivesse aqui' diz professora que fez protesto em mercado A professora Isabel Oliveira, de 43 anos, fez um desabafo após prestar depoimento à Polícia Civil nesta segunda-feira (10). "Muitos já choraram para que eu estivesse aqui", afirmou Isabel. Isabel tirou a roupa dentro de um estabelecimento de Curitiba, na sexta-feira (7), para protestar contra uma situação de racismo vivida em uma unidade do supermercado Atacadão. Assista abaixo. Professora tira a roupa para protestar contra racismo em supermercado de Curitiba A Polícia Civil instaurou um inquérito para apurar a se houve crime de racismo. Além da professora, serão ouvidas testemunhas, gerentes do supermercado e o segurança envolvido na situação. De acordo com a professora, apesar de ter sido uma manifestação sem palavras, o protesto serviu para ampliar a voz de pessoas negras que passam por situações como a que ela passou. Professora alega ter sido perseguida por segurança Segundo ela, a manifestação aconteceu depois dela ter sido perseguida por um segurança enquanto fazia compras. Isabel relatou que foi até o estabelecimento para fazer compras para a Páscoa programada com a família. Em certo momento, a professora reparou que um segurança a seguia em todos os lugares que ela ia. Em seguida, ela disse que foi conversar com o homem e perguntou se ela apresentava ameaça para a loja. Ele negou. "Nada novo. Nós, pessoas pretas, estamos infelizmente habituadas a ter sempre um segurança, sempre somos [vistas como] ameaças nos espaços. [...] É extremamente violento, eu sai da minha casa para comprar coisas para passar a páscoa com a minha família. Eu não tinha nada, só meu cartão e meu celular na minha bolsa. Não havia motivo para que ele tivesse que ficar andando atrás de mim, investigando se eu poderia subtrair alguma coisa daquele estabelecimento", desabafou. Por meio de nota, o Grupo Carrefour Brasil, dono do mercado Atacadão, afirmou que "segue postura de tolerância zero contra qualquer tipo de racismo". Além disso, conforme a nota, a empresa abriu uma apuração interna sobre o caso e suspendeu o funcionário durante o período de investigação. Após a situação, a professora afirmou que ligou para a polícia, descreveu a situação para a agente e solicitou que enviassem uma viatura. Porém, segundo ela, a atendente afirmou que não poderia enviar apoio, pois Isabel "não soube descrever o que estava acontecendo" e também porque aquele era o trabalho do segurança. A professora contou ainda que foi questionada pela corporação se funcionários da empresa recusaram atendimento ou se houve algo que caracterizasse crime de racismo. "Este foi o momento que eu mais me senti violentada. Porque essa violência de ser acompanhada no mercado é corriqueira. Eu achava que, de alguma forma, eu teria o suporte de uma instituição policial e foi essa a resposta que eu tive", lamentou. De acordo com a professora, apesar de não ter existido uma ação explícita, a violência aconteceu. O protesto Professora fez protesto em supermercado de Curitiba (PR) e alegou que foi alvo de racismo Reprodução/Redes sociais Isabel disse que resolveu dar uma resposta à situação. Algumas horas após o acontecimento, Isabel foi para casa e resolveu voltar ao estabelecimento e protestar. Escreveu em seu corpo "sou uma ameaça". Dentro do mercado, retirou a roupa e ficou somente com as roupas íntimas, deixando a frase a mostra. "Eu entrei na loja, tirei a minha blusa, tirei a minha calça. Quando o primeiro segurança me abordou perguntando se ele poderia me ajudar em alguma coisa eu falei: 'Não, você não precisa me ajudar em nada. Eu estou inclusive facilitando o seu trabalho, porque você não vai precisar andar atrás de mim, porque você pode observar, eu não tenho lugar algum onde eu possa esconder qualquer produto desta loja'", relatou a professora. LEIA MAIS: Professora registra boletim de ocorrência depois de tirar a roupa em protesto contra racismo em supermercado de Curitiba 'Não posso aceitar que isso continue acontecendo', diz professora sobre situação de racismo em supermercado Violência De acordo com Isabel, a situação deixou marcas emocionais. "Eu tenho dois filhos. Eu não tive coragem de voltar ao mercado para comprar um ovo de páscoa para eles. [...] Eu fui tratada como uma marginal. Como é que alguém se sente sendo tratado como um marginal, tendo trabalhado a semana inteira, para pegar o dinheirinho e ir comprar um ovo de páscoa para seu filho e não se sentir no direito de circular? Como você se sente sem ter a sua liberdade de ir e vir respeitada?", afirmou. Além disso, para ela, a situação reflete um cerceamento dos direitos dela. "Por que eu tenho que garantir meu lugar de existência? Eu só quero ter o direito de entrar e sair onde quer que seja, com a dignidade que eu tenho", afirmou. Presidente Lula comenta o caso O caso foi comentado nesta segunda-feira (10) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A declaração aconteceu durante a abertura da reunião para debater os 100 primeiros dias do governo. Lula acusou a empresa de cometer crime e disse que "neste país a gente não vai admitir o racismo". "Ontem, [...] o Carrefour cometeu mais um crime de racismo. Mais um crime. Um fiscal do Carrefour acompanhou uma moça negra, que ia fazer compra, achando que ela ia roubar, ela teve que ficar só de calcinha e sutiã para provar que ela não ia roubar. É a segunda vez que o Carrefour faz esse tipo de coisa", disse. "Então, a gente tem que dizer para a direção do Carrefour, se quiserem fazer isso no seu país de origem, que façam, mas neste país a gente não vai admitir o racismo", finalizou. LEIA TAMBÉM: Jovem morta estrangulada com cabo de carregador de celular deixou caderno com planos para 2023: 'Me amar e aceitar em primeiro lugar' Idoso é agredido com barra de ferro em Curitiba; suspeita é de racismo Em 10 meses, Paraná registrou 7 vezes mais casos de injúria racial do que racismo; crimes foram equiparados VÍDEOS: mais assistidos do g1 Paraná Leia mais notícias no g1 Paraná.