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Governo pagou R$ 4,4 bilhões a mais de 275 mil falecidos entre 2016 e 2025, diz TCU

Erro ocorreu devido à falta de cruzamento de dados entre diferentes sistemas, segundo auditoria

Por Da Redação

Governo pagou R$ 4,4 bilhões a mais de 275 mil falecidos entre 2016 e 2025, diz TCU Créditos: Leopoldo Silva/Agência Senado

O Tribunal de Contas da União (TCU) divulgou, na quarta-feira (23), que detectou pagamentos, entre 2016 e fevereiro de 2025, do Governo Federal a 275,8 mil pessoas já falecidas, com prejuízo de R$ 4,4 bilhões.

A entidade apontou os valores após analisar processo sobre a qualidade dos dados do Sistema Nacional de Informações de Registro Civil (Sirc). O sistema reúne informações sobre nascimento, casamento e óbito em todo o Brasil e foi criado em 2014 para auxiliar no planejamento e na gestão de políticas públicas.

A fiscalização teve foco no registro de óbitos. O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) utiliza o Sirc para cancelar benefícios de pessoas falecidas, como aposentadorias e pensões. O TCU identificou problemas estruturais que comprometem a confiabilidade dos dados e permitem pagamentos indevidos.

Conforme o levantamento, cerca de R$ 28,5 milhões continuam sendo pagos mensalmente de forma indevida. Os valores envolvem benefícios assistenciais, como o Bolsa Família, aposentadorias e outros pagamentos previdenciários e trabalhistas, além de vencimentos a servidores públicos ativos, inativos e pensionistas.

Registros ausentes

Uma das constatações mais alarmantes é que 13,1 milhões de registros de óbito não constam no Sirc, o que representa mais que o dobro da atual base do sistema. Esses dados ausentes impactam diretamente na atuação de órgãos como o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que depende dessas informações para cessar pagamentos após o falecimento do beneficiário.

Entre os principais motivos para os registros incompletos ou ausentes estão o sub-registro de óbitos, causado por famílias que não informam o falecimento aos cartórios, e a morosidade no envio das certidões pelos cartórios ao Sirc. A legislação determina o envio em até um dia útil, mas há casos em que essa comunicação leva mais de nove dias.

Essa falha gerou, segundo o TCU, um rombo de R$ 2,7 bilhões somente por conta da não atualização de registros de óbito no sistema. Além disso, os cartórios também foram apontados como responsáveis por incluir informações incompletas ou inválidas, como CPF, nome, data de nascimento ou data do falecimento. Cerca de 35% dos registros analisados apresentaram esse tipo de erro, com impacto financeiro de R$ 163 milhões.

Outro dado preocupante é que as informações do Sirc divergem daquelas da Receita Federal. A inconsistência entre bases de dados indica ausência de integração entre os sistemas governamentais, dificultando a prevenção de fraudes e pagamentos indevidos.

Medidas e sanções

O relatório, de relatoria do ministro Jorge Oliveira, também analisou os controles internos dos órgãos responsáveis pela gestão do Sirc e concluiu que há fragilidades severas na governança do sistema. Segundo ele, faltam medidas corretivas, sanções efetivas e ações preventivas por parte das instituições envolvidas.

“Faltam ações corretivas, sanções e medidas preventivas. Há vácuos regulatórios e descoordenação entre os atores envolvidos”, afirmou o ministro durante o julgamento.

Com isso, o TCU determinou ao INSS a adoção de diversas medidas. A autarquia terá 90 dias para apurar responsabilidades e aplicar sanções aos cartórios que enviarem dados fora do prazo legal ou de forma incompleta. Também deverá criar, em até 30 dias, um cronograma para convocação de beneficiários que constam como mortos, mas seguem recebendo. Essas pessoas terão que comparecer presencialmente para realizar a chamada “prova de vida”.

Além disso, o Comitê Gestor do Sirc (CGSirc), responsável por monitorar o sistema e estabelecer diretrizes para seu funcionamento, terá 120 dias para definir um plano de inserção de todos os atos registrais (nascimentos, casamentos, óbitos e natimortos) ainda não registrados. A iniciativa deverá ser feita em conjunto com a Corregedoria Nacional de Justiça (CN/CNJ) e o INSS.

Apesar de o problema estar concentrado principalmente nos benefícios previdenciários e assistenciais, o TCU também identificou pagamentos a 650 servidores públicos federais, aposentados ou pensionistas com indícios de óbito somente no mês de fevereiro de 2025, o que representou um gasto indevido de R$ 3,6 milhões.

O presidente do TCU, ministro Bruno Dantas, foi enfático ao comentar os dados. Para ele, o caso mostra que o Brasil vive um “absoluto descontrole” sobre as bases de dados de pessoas mortas. “Pagamos bilhões de reais em 10 anos para pessoas mortas porque fomos incapazes, como nação, de integrar os nossos sistemas. Vai chegar um momento em que não teremos dinheiro para pagar os vivos”, afirmou.

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