Fechamento do Estreito de Ormuz pode pressionar preços no Brasil
Apesar de o Brasil ser autossuficiente em petróleo, a dependência de importações complementares torna o país vulnerável a oscilações
Por Da Redação

O mundo acompanha com apreensão a escalada das tensões no Oriente Médio, após o Parlamento do Irã aprovar, no último domingo (22), o fechamento do Estreito de Ormuz, uma das rotas marítimas mais estratégicas do planeta, em resposta aos ataques norte-americanos contra usinas nucleares iranianas. Embora a medida ainda dependa de validação do Conselho Nacional de Segurança do Irã e do líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, o temor por um possível bloqueio já provoca impactos econômicos e geopolíticos globais.
A preocupação se justifica. Aproximadamente 30% de todo o petróleo mundial e 20% do gás natural transitam pelo estreito, que conecta o Golfo Pérsico ao Mar Arábico. Com apenas 33 quilômetros de largura, ele é um gargalo essencial para a exportação de combustíveis fósseis produzidos por grandes potências da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), como Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Iraque. Além dos combustíveis, outros setores da economia também são impactados: produtos como fertilizantes, plásticos, automóveis, maquinários e componentes eletrônicos têm parte relevante de sua logística marítima dependente da passagem por Ormuz.
Em razão disso, o fechamento da rota pode gerar um aumento generalizado nos preços desses produtos, afetando cadeias produtivas em todo o planeta. A China, por exemplo, é um dos maiores importadores de petróleo que passa por Ormuz e se posicionou publicamente em favor da estabilidade regional.
"O Golfo Pérsico e as águas circundantes são canais vitais para o comércio internacional e o transporte de energia. Manter a segurança e a estabilidade na região atende aos interesses comuns da comunidade internacional”, disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Guo Jiakun.
A União Europeia também demonstrou preocupação com os riscos de agravamento do conflito e de interrupção do fluxo comercial naquela área estratégica.
"As preocupações com retaliações e com a escalada desta guerra são enormes, especialmente o fechamento do Estreito de Ormuz pelo Irã, que seria algo extremamente perigoso e não seria bom para ninguém", afirmou Kaja Kallas, chefe da política externa da União Europeia.
Efeitos no Brasil
Apesar de o Brasil ser autossuficiente em petróleo, a dependência de importações complementares, sobretudo de petróleo leve para a produção de derivados de maior valor agregado, torna o país vulnerável a oscilações no mercado internacional. Isso significa que o fechamento de Ormuz pode interferir diretamente no custo dos combustíveis no Brasil, como gasolina, etanol e diesel.
"O país importa petróleo mais leve, sobretudo da Arábia Saudita, para compor a produção de derivados de maior valor agregado. Uma restrição à navegação no Estreito de Ormuz obrigaria a diversificação de supridores, como países africanos", explica João Victor Cardoso, pesquisador da FGV Energia.
Nas últimas semanas, os preços dos combustíveis vinham apresentando tendência de queda, em meio à estabilidade do mercado e à política de preços da Petrobras. No entanto, um bloqueio prolongado no estreito, que impacte os preços internacionais do petróleo, pode reverter esse cenário. Caso os preços do barril se elevem de forma contínua, há pressão para que os reajustes cheguem às bombas, mesmo que de forma gradual.
Ainda que a Petrobras adote estratégias para mitigar esses efeitos, como absorver parte dos custos ou compensar com a produção nacional, um cenário prolongado de instabilidade no Oriente Médio poderá exigir novos posicionamentos da estatal. Isso aumenta a incerteza em relação ao comportamento futuro dos preços dos combustíveis no país.
"A Petrobras, tempos atrás, tinha uma política de preços que repassava as cotações internacionais para o consumidor final. Caso adote uma política de absorver esse impacto, o repasse para o consumidor será menor", afirma Robson Gonçalves, economista e professor da FGV.
Agronegócio sofre
Além do petróleo, o fechamento do Estreito de Ormuz pode afetar diretamente o agronegócio brasileiro. Isso porque o Irã é um dos grandes produtores globais de ureia, um composto essencial na formulação de fertilizantes. O Brasil depende da importação dessa substância para manter sua produtividade agrícola. Caso o fluxo comercial dessa commodity seja comprometido, pode haver elevação de preços no setor, o que impactaria os custos de produção e, consequentemente, os preços dos alimentos.
Há ainda o risco de encarecimento de outros insumos agrícolas e produtos industriais, como defensivos, maquinários e peças, que têm rotas marítimas afetadas pela instabilidade geopolítica da região.
Riscos Econômicos
O fechamento do estreito, se confirmado, pode contribuir para uma alta generalizada nos preços de commodities, combustíveis e fretes internacionais. Isso, por sua vez, tende a provocar um efeito inflacionário em diversos países. No Brasil, a pressão pode ser sentida de forma mais intensa nos combustíveis e em setores que dependem da logística global para insumos e componentes.
Especialistas apontam que, caso o conflito se estenda e as alternativas logísticas se mostrem insuficientes para suprir o volume que hoje depende de Ormuz, haverá uma escalada inflacionária internacional, acompanhada de volatilidade nos mercados e possível retração econômica. O transporte marítimo global seria diretamente afetado, já que cerca de 25% do comércio de contêineres passa pelo Oriente Médio.
A ausência de uma alternativa de escoamento à altura torna o cenário ainda mais crítico. Embora existam oleodutos para transporte de petróleo fora da rota marítima, eles não possuem capacidade suficiente para compensar o volume que deixaria de ser transportado por Ormuz.
