Exportadores de café voltam a ter esperança após decreto de Trump
Setor cafeeiro vê chance real de retomar vendas aos EUA após decreto de Trump e aproximação diplomática com Lula na ONU reacenderem expectativas de acordo bilateral
Por Da Redação

Um mês e meio depois do tarifaço imposto pelo governo dos Estados Unidos, o setor cafeeiro brasileiro voltou a enxergar uma possibilidade concreta de retomada das exportações para o mercado norte-americano. O otimismo é alimentado por dois fatores recentes: o decreto assinado por Donald Trump, que abriu espaço para a isenção de tarifas sobre o café, e o gesto de aproximação entre o presidente norte-americano e Luiz Inácio Lula da Silva durante a Assembleia-Geral da ONU, em Nova York.
Na terça-feira (23), Trump discursou logo após Lula e disse ter tido “uma química excelente” com o brasileiro, além de confirmar que ambos concordaram em realizar uma reunião na próxima semana. A data e o formato ainda não foram definidos, mas o aceno foi suficiente para animar representantes da cadeia produtiva, que há semanas enfrentam perdas significativas no comércio internacional.
O que foi o tarifaço?
O tarifaço, como ficou conhecida a medida, entrou em vigor no dia 6 de agosto e determinou a aplicação de uma sobretaxa de 50% sobre parte das exportações brasileiras para os Estados Unidos. O decreto foi assinado pelo próprio Donald Trump e afetou 35,9% das mercadorias enviadas ao mercado norte-americano, o equivalente a cerca de 4% do total das exportações brasileiras. Na prática, mais de 700 produtos ficaram de fora da lista, mas itens de grande relevância, como café, frutas e carnes, passaram a sofrer a pesada taxação.
Por outro lado, produtos estratégicos para a economia americana, como suco e polpa de laranja, combustíveis, minérios, fertilizantes e aeronaves civis (incluindo motores e peças), além de celulose, polpa de madeira, metais preciosos e energia, foram poupados. A decisão se insere na nova política comercial da Casa Branca, em que Trump defende tarifas mais elevadas para recuperar a competitividade perdida pelos Estados Unidos em relação à China nas últimas décadas.
O movimento também foi interpretado como parte da guerra comercial deflagrada pelo republicano. Em abril, o governo norte-americano iniciou o processo impondo taxas proporcionais ao déficit que os EUA têm com cada país. No caso do Brasil, que registra superávit na balança comercial com os americanos, a tarifa inicial foi de 10%. Contudo, em julho, Trump elevou a alíquota para 50%, justificando retaliação a decisões que, segundo ele, prejudicariam as big techs dos EUA e em resposta ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, acusado de liderar uma tentativa de golpe de Estado após a derrota nas urnas em 2022.
Possibilidade de isenção
Diante desse cenário de tensão, o decreto assinado em 5 de setembro abriu uma nova perspectiva. O texto trata das chamadas “tarifas recíprocas” e incluiu uma lista de produtos que poderiam ser isentos de taxas, entre eles, o café e o cacau. O documento deixa claro, porém, que qualquer isenção dependerá da assinatura de acordos comerciais bilaterais.
Esse detalhe reforçou a importância da aproximação entre Trump e Lula na ONU. O café é considerado um produto estratégico porque os Estados Unidos são os maiores consumidores mundiais da bebida, mas não possuem capacidade de produção em escala comercial. O reconhecimento dessa dependência foi apontado por entidades brasileiras como um sinal de que há espaço real para a negociação.
Mercado aposta em retomada
Até agosto, antes do tarifaço, o Brasil ocupava a liderança absoluta nas exportações de café para os Estados Unidos, respondendo por aproximadamente um terço do mercado. Com a sobretaxa, as vendas despencaram e a Alemanha ultrapassou os norte-americanos, assumindo a posição de maior compradora do grão brasileiro.
Para Pavel Cardoso, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic), o novo decreto e o gesto político em Nova York abriram espaço para o retorno das exportações. “Antes não havia perspectivas reais. Mas considerando o encontro na ONU e a ‘química’ entre os dois, como disse Trump, existe chance de avanço. Se houver algum acordo, o café certamente será prioridade”, afirmou em entrevista ao G1.
Na mesma linha, Marcos Matos, diretor-geral do Conselho dos Exportadores de Café (Cecafé), ressaltou que o setor acompanha de perto as tratativas políticas. “O decreto aponta o café como produto essencial para a indústria norte-americana e que não pode ser produzido em quantidade suficiente nos EUA. Por isso, um acordo bilateral é a única forma de viabilizar a isenção e retomar as vendas”, disse ao G1.
O setor, que acumula perdas expressivas desde a imposição da tarifa, agora deposita suas expectativas na agenda diplomática. Caso a aproximação entre Lula e Trump resulte em negociações concretas, o café poderá ser o primeiro produto brasileiro a escapar da barreira de 50% e recuperar espaço em um dos mercados mais importantes do mundo.
