Especialista contesta versão de concessionária em deslizamento da BR-376 no Paraná: 'Sequência de erros'
Por Giuliano Saito

Arteris Litoral Sul afirmou que estudo de julho identificou trecho da BR-376 como 'de baixo risco' e, na última semana, empresa disse que local não apresentava risco. Para geólogo, características do local e acumulado de chuvas apontavam necessidade de medidas de prevenção. Especialistas afirmam que região de deslizamento na BR-376 é de risco Especialistas dizem que concessionária cometeu 'sequência de erros' e contestam a versão da Arteris Litoral Sul, concessionária do trecho da BR-376 onde um deslizamento matou duas pessoas. A empresa alegou que não havia risco no local, mas geólogos alertam que trecho de serra, com encostas e excesso de chuvas indicavam alerta para empresa antes do acidente. O deslizamento aconteceu no dia 28 de novembro durante uma forte chuva. O local havia tido um deslizamento que interditou parcialmente uma das pistas antes da tragédia, mas a pista foi mantida aberta. A Polícia Civil apura a responsabilidade da empresa no caso e o Ministério Público Federal (MPF) investiga a atuação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) que não bloqueou a pista. Quem são as vítimas do deslizamento na BR-376 em Guaratuba Na última semana, a empresa disse que o local era monitorado e que não apresentava perigo. A versão é contestada pelo presidente da Federação Brasileira dos Geólogos (Fabrageo), Fábio Augusto Reis. "Se você tem primeiro um local que tem indícios de uma serra, que tem um relevo propício ao escorregamento, chuvas intensas acumuladas com valor muito alto nas últimas 72 horas, você tem um escorregamento que é um indício de movimentação, e aí você não toma decisão. Então realmente isso é um ponto que a análise de responsabilidade desse acidente e das mortes tem que considerar [...] mas houve uma sequência de erros em termo de tomada de decisão", afirmou Fábio Augusto Reis. Especialista contesta versão de concessionária em deslizamento no Paraná Reprodução/RPC Para a entidade, a concessionária precisa tornar públicos os estudos que apontam a inexistência de riscos no trecho e também esclarecer por que manteve a circulação de veículos na rodovia mesmo após um primeiro deslizamento horas antes, sem vítimas, próximo ao local. O especialista frisou que foram registrados mais de 300 milímetros de chuva no trecho em 72 duas horas, e que as características e ocorrências do trecho apontavam necessidade de medidas de prevenção. Ele afirmou, ainda, que a primeira ação "é o isolamento da área" para então acionar "a avaliação de geólogos, engenheiros e técnicos da Defesa Civil". "Isso já demonstra um local com chuva acumulada muito alta, então com certeza já deveria ter tomado ações de atendimento, gerenciamento de risco no local. E uma das ações é fechamento da área, remoção das pessoas do local de risco", ressaltou. Procurada, a Arteris Litoral Sul reforçou que o trecho em que aconteceu o deslizamento é acompanhado periodicamente e recebeu "a classificação mais baixa de risco", conforme laudo emitido em julho deste ano por uma certificadora independente. Afirmou também que o documento foi disponibilizado aos órgãos competentes logo após a sua emissão. Veja abaixo a manifestação da empresa. Imagem aérea mostra deslizamento de terra na BR-376, próximo à divisa entre Paraná e Santa Catarina Adryel Pabst/Prefeitura de Garuva A rodovia está bloqueada em ambos os sentidos desde segunda (28). Doze pessoas se salvaram. As pistas continuam sem previsão de liberação. Geólogo questiona monitoramento Para o professor Abdel Hasch, doutor em geologia e conselheiro Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paraná (Crea-PR), também restam questionamentos sobre a fala da empresa de que o local "é monitorado periodicamente". "Uma coisa que eu gostaria de ver é quem o geólogo ou geotécnico que afirma esse monitoramento, se esse monitoramento é feito por instrumentos ou por profissional qualificado e quais são os critérios técnicos para se dizer que é uma área de risco ou não é uma área de risco? Se eu tenho agora um fato com quantas pessoas que morreram", afirmou. Hasch participou de dezenas de estudos na região da serra da BR-376. Depois do deslizamento, no último dia 28 de novembro, ele reuniu fotos aéreas tiradas há cerca de oito meses em trechos próximos onde houve o desastre. "Quando eu falo que é uma área de risco ou não, eu tenho que ter parâmetros. Qual critério que utilizei para dizer se é uma área de risco ou não se eu tenho agora um fato real com quantas pessoas morreram. [...] Infelizmente, sim [deslizamento confirma que era área de risco]. Enquanto não se apresenta dados técnicos, é uma afirmação equívocada", completou. Especialista contesta versão de concessionária em deslizamento no Paraná Reprodução/RPC Nos pontos, o geólogo aponta obras de contenção que protegem a rodovia. Segundo ele, nestes pontos, o solo, a vegetação e a inclinação das encostas têm as mesmas características de onde aconteceu a tragédia. Ele também apresentou um artigo escrito por especialistas em geologia e engenharia, publicado na revista do Crea em 2018, com conclusões de um estudo realizado num trecho de quatro quilômetros da serra na BR-376. Conforme os resultados, com relação aos movimentos de massa, foram 26 pontos de deslizamento contabilizados em oito datas diferentes entre 2009 e 2017. O que diz a Arteris "A Arteris Litoral Sul reforça mais uma vez que o trecho em que aconteceu o deslizamento é acompanhado periodicamente e apresentava a classificação mais baixa de risco, conforme atestou o laudo emitido em julho deste ano por uma certificadora independente. O documento foi disponibilizado pela concessionária aos órgãos competentes logo após a sua emissão. Além de um compromisso com a segurança dos usuários, a avaliação por consultoria externa atende a requisitos contratuais. A Arteris Litoral Sul possui um programa permanente de monitoramento de encostas, que contempla 1914 estruturas que são inspecionadas anualmente ao longo de suas rodovias. Além dos laudos, como o mencionado acima, 11 veículos de inspeção fazem o acompanhamento diário desses pontos, identificando possíveis situações críticas. Nos últimos dois anos, a concessionária atuou em 29 obras e serviços de manutenção de encostas, demonstrando a seriedade com que trata a segurança das pessoas que trafegam diariamente por suas rodovias. Sobre a interdição da via no dia do deslizamento, a concessionária esclarece que foram eventos em locais e de dimensões completamente distintas. O primeiro deslizamento, ocorrido às 15h, no KM 669+100, causou interdição apenas para limpeza de pista. Cumprido esse atendimento, o tráfego foi liberado. Às 19h, ocorreu o segundo deslizamento no KM 668+700, ou seja, 400 metros depois. Reforçamos que o nosso monitoramento não apontava nenhuma evidência de risco. O atendimento à ocorrência foi a prioridade máxima da concessionária, que não mediu esforços para fornecer todo o suporte necessário para as equipes de resgate. A concessionária reitera que qualquer afirmação sobre as causas do deslizamento é prematura, pois não conta com o embasamento técnico necessário." Instalação de barreiras Segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), na segunda (5), a Arteris Litoral Sul instalou barreiras de contenção na base de uma encosta. Concessionária instala barreiras de concreto em encosta na BR-376, diz PRF De acordo com a PRF, equipes da Arteris conseguiram avançar com os trabalhos de restauração da rodovia no local do deslizamento. A polícia afirmou que quando as condições de segurança forem atendidas, a concessionária comunicará a PRF, que coordenará "uma operação para o restabelecimento da normalidade do fluxo de veículos". BR-376, entre o Paraná e Santa Catarina, está interditada há uma semana Arteris Litoral Sul Uma vistoria técnica chegou a ser anunciada pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) e pelo secretário de segurança pública do Paraná, Wagner Mesquita, para o fim de semana, mas não foi realizada por conta do mau tempo. Rotas alternativas Motoristas que precisam se deslocar entre o Paraná e Santa Catarina e que normalmente utilizaram a BR-376 podem fazer rotas alternativas pela BR-116, BR-470 (em SC) e BR-277. No caso da BR-277, é preciso que caminhoneiros fiquem atentos a restrições de horário para travessia de carretas. Inquérito policial A Polícia Civil do Paraná (PC-PR) abriu inquérito para apurar possíveis responsabilidades e causas do deslizamento de terra na BR-376. No sábado (3), a corporação deu início aos depoimentos de testemunhas. O prefeito de Guaratuba, Roberto Justus, foi ouvido pelo delegado. Ele teve o carro em que estava com o motorista atingido pela lama. Os dois conseguiram quebrar o vidro e escapar a pé, sem ferimentos. ‘Entregando a vida na mão de alguém que decidiu que a gente podia descer a serra’, diz prefeito A investigação ocorre na Delegacia de Delitos de Trânsito (Dedetran). Em nota, a Arteris Litoral Sul disse que "irá prestar todos os esclarecimentos necessários à Polícia Civil para contribuir com a elucidação do caso". Na quinta-feira (1º) o Ministério Público Federal (MPF) do Paraná abriu um procedimento para investigar "eventual responsabilidade" da PRF no deslizamento. Dois dias após o deslizamento, a PRF afirmou em coletiva que a decisão sobre o fechamento da rodovia cabia à Arteris. Em resposta, a concessionária disse que ainda era prematuro apontar as causas do acidente. Economia Fetranspar estima prejuízo de R$ 18,5 milhões após deslizamento na BR-376 Com BR-376 interditada em Guaratuba, motoristas relatam horas de espera na fila do ferry boat Responsabilidade Em ofício enviado à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) na terça-feira (29), um dia após o deslizamento, a Arteris diz que "o talude onde ocorreu o sinistro apresentava nível de risco 0 na última monitoração periódica, sem ocorrência de patologias e com sistema de drenagem superficial satisfatória". Especialista afirma que rodovia devia ter sido fechada após 1º deslizamento, sem vítimas Concessionária sabia de risco na BR-376, diz Defesa Civil Chuva Geólogo cita fatores que podem contribuir para quedas de barreira Relatos Passageira que estava em ônibus a poucos metros de deslizamento na BR-376 relata situação: 'Parecia uma cachoeira, era muita água e lama' Família que teve carro arrastado se salva ilesa de deslizamento na BR-376: 'Cachoeira de lama descendo', diz idoso Caminhoneiro relata ter escapado por pouco: 'Se eu tivesse 10 metros para frente, a lama teria me engolido' 'Não tínhamos muita informação do que estava acontecendo', diz um dos primeiros funcionários da concessionária a chegar no deslizamento Como foram os deslizamentos na BR-376 Em 28 de novembro, dois deslizamentos atingiram a BR-376 no mesmo ponto, o quilômetro 669; O primeiro deslizamento foi às 16h30, sem vítimas; Depois do primeiro deslizamento, uma das pistas, no sentido Santa Catarina, foi interditada totalmente. Em seguida, o trânsito foi liberado e mantido em pista única; Às 19h30 aconteceu o segundo deslizamento. Carros foram atingidos, e os dois sentidos da rodovia foram interditados. VÍDEOS: Mais assistidos do g1 PR Veja mais notícias do estado em g1 Paraná.
Você também pode gostar
Leia mais: https://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2022/12/06/especialista-contesta-versao-de-concessionaria-em-deslizamento-da-br-376-no-parana-sequencia-de-erros.ghtml