Diagnóstico de doença rara pode levar de 5 a 7 anos no Brasil, diz especialista: 'Ela tem direito de saber como vai evoluir ou não'
Por Giuliano Saito
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Coordenadora de ambulatório de doenças raras cita dificuldades, principalmente no SUS. Paranaense relata jornada até descobrir que tinha a síndrome de Gerstmann-Sträussler-Scheinker. Doença é considerada rara quando acomete até 65 pessoas em cada 100 mil Pedro França/Agência Senado O diagnóstico de doenças raras pode levar de cinco a sete anos no Brasil. É o que afirma neuropediatra Mara Lúcia Schimitz Ferreira Santos, coordenadora do ambulatório de doenças raras do Hospital Pequeno Príncipe. A instituição fica em Curitiba e é indicada pelo Ministério da Saúde como a única de referência na área no Paraná - há outras 16 habilitadas pelo governo federal em todo o país. De acordo com a pasta, cerca de 13 milhões de brasileiros são portadores de doenças raras. Compartilhe no WhatsApp Compartilhe no Telegram O ministério afirma que são consideradas raras doenças que afetam até 65 pessoas em cada 100 mil indivíduos. A neuropediatra explica que uma das principais dificuldades é o diagnóstico precoce, que pode nem chegar a se confirmar diante do rápido progresso da maioria das enfermidades raras. "O diagnóstico muda a vida da pessoa. Fazendo isso você desbloqueia e dá acesso à informação. [...] Quando você faz o diagnóstico de uma doença que não tem tratamento, pelo menos você vai fazer com que uma família entenda a evolução da doença, ela tem direito de saber como vai evoluir ou não, quanto tempo esse paciente poderá viver", afirma. Diagnóstico muda a condução do tratamento e a perspectiva do paciente Divulgação/HPP/Marieli Prestes A neuropediatra defende que, apesar de caros, os exames para descoberta das enfermidades raras deveriam ser ofertados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para evitar que o paciente tenha que se submeter a internamentos repentinos e fazer uso massivo de medicamentos. “Um dos que a gente mais acaba usando, o exoma, é um exame que hoje custa cerca de R$ 4,5 mil. Nós conseguimos fazer o diagnóstico com esse exame em torno de 50% a 60%. Então, para a medicina, isso é muito para uma doença rara”, afirmou a médica. De acordo com o Ministério da Saúde, a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras - criada em 2014 - traz as diretrizes de tratamento e procedimentos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo a pasta, na ocasião da publicação da Política Nacional, foram incorporados quinze exames de biologia molecular, citogenética e imunoensaios, além do procedimento de aconselhamento genético e de procedimentos de avaliação diagnóstica, na Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses, Próteses e Materiais Especiais do SUS. O ministério explica que todos são financiados pelo SUS, independente da técnica utilizada. O exame de sequenciamento do exoma, diz a pasta, está contemplado no Protocolo Clínico de Diretrizes Terapêuticas - PCDT para indivíduos que apresentam atraso de desenvolvimento neuropsicomotor ou deficiência intelectual cujo quadro clínico é inespecífico, ou seja, não associado a um fenótipo reconhecível ou que permita estabelecer o diagnóstico de uma síndrome específica. Sequenciamento genético ajudou paranaense a descobrir síndrome rara A paranaense Ana Paula Dzioba Santos, de 36 anos, é portadora da síndrome de Gerstmann-Sträussler-Scheinker. O neurologista do Hospital Marcelino Champagnat, Gustavo Leite Franklin, acompanha a paciente e explica que a estimativa é de essa doença genética e degenerativa atinja entre um a dez pacientes a cada cem milhões. Um dos principais sintomas da síndrome é a fraqueza inesperada e instabilidade ao caminhar. Com o passar do tempo, a enfermidade leva à atrofia dos músculos, gerando dificuldades na fala, no andar e em alguns casos a danos cognitivos. Ana conta que descobriu a doença há três anos e que o começo dos sintomas foi percebido na rotina. Inicialmente ela teve uma tontura ao carregar uma xícara por um curto espaço de tempo. Dias depois, não conseguiu se mexer quando acordou pela manhã. Ana possui a síndrome de Gerstmann-Sträussler-Scheinker uma doença genética e degenerativa Reprodução "Primeiro sintoma foi que eu andei um percurso pequeno com uma xícara na mão e aí eu comecei a tremer e pensei: ‘Alguma coisa tem’. Fui ao médico, fiz ressonância e não deu nada, mas fiquei com aquela pulga atrás da orelha. Passou um tempo e, de um dia para outro, deitei para dormir, normal, e no dia seguinte não consegui sair da cama", contou Ana, com dificuldade na fala. O diagnóstico veio após uma série de exames e testes. "No caso da Ana fizemos o 'exoma', exame onde avaliamos vários genes ao mesmo tempo porque avaliamos outras doenças raras, mas a dela não foi encontrada nos primeiros exames", afirmou o médico. Tratamento Ana é formada em processos gerenciais e mãe de uma menina de nove anos. Após a descoberta da doença, ela precisou abandonar o trabalho. Hoje, faz as atividades relacionadas ao lar e conta com a ajuda do marido e de uma irmã. Ela relatou como tem sentido a evolução da doença. “É uma atrofia que atrofia tudo, os membros do corpo, tudo vai atrofiando. Então, preciso fazer tratamento para não atrofiar. A doença está evoluindo. Antes eu me segurava mais, mas agora estou caindo com frequência", afirmou. A síndrome de Gerstmann-Sträussler-Scheinker está entre as 95% doenças raras que não tem cura. Porém, há tratamentos para atenuar os sintomas e que vem dando a ela uma melhor qualidade de vida. “O que me ajuda é a fisioterapia, a hidroterapia, o pilates e eu adoro conversar. O dia que eu estou para baixo preciso conversar com a minha irmã ou com alguém", contou. A doença de Ana não tem cura, mas ela realiza atividades para minimizar sintomas da doença Arquivo pessoal Mais informação, mais diagnósticos A coordenadora do ambulatório de doenças raras do Hospital Pequeno Príncipe destaca que divulgar mais informações sobre essas enfermidades e valorizar a saúde pública são fundamentais para que cada vez mais estudos na área sejam desenvolvidos e, consequentemente, mais pacientes tenham acesso ao diagnóstico. “Há muito desconhecimento nas áreas médicas e familiares, mas são necessárias políticas públicas, uma cadeia que precisa ser melhorada. Essas doenças sempre existiram, mas antigamente não havia diagnóstico. A saúde melhorou, sou fã do SUS, temos problemas também, mas veja tudo que temos é através do SUS. A gente tenta melhorar, aprimorar, para que mais pacientes tenham acesso." Doenças raras sempre existiram, mas antigamente não havia diagnósticos Divulgação/HPP/Marieli Prestes A profissional reforça que o diagnóstico dá acesso a informações sobre a doença e sintomas, tanto para o paciente como para a família, o que facilita o processo de aceitação da enfermidade. Ana relata que o apoio da família e dos amigos tem sido fundamental para ela ter força, mesmo nos momentos mais difíceis. Ela deixou um recado para outros pacientes com doenças raras. “Eu sei que não tem cura, mas eu uso um ditado que é assim: ‘Eu tenho a doença, mas ela não me tem’. A primeira coisa é o psicológico, a família, o apoio, porque isso mexe muito. Então, não deixe a doença te dominar, porque ela domina. Tem hora que cansa ser forte, mas eu não sou de desistir. Nunca fui." VÍDEOS: Mais assistidos g1 PR Mais notícias do estado em g1 Paraná.
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