Debate sobre acesso à Cannabis expõe impasse jurídico e reforça alternativas para pacientes no Brasil

A recente decisão da 3ª Turma do STJ, que definiu não ser obrigação dos planos de saúde fornecer medicamentos à base de canabidiol para uso domiciliar, trouxe à tona as barreiras jurídicas e econômicas que ainda dificultam o acesso

Por Gazeta do Paraná

Debate sobre acesso à Cannabis expõe impasse jurídico e reforça alternativas para pacientes no Brasil Créditos: Divulgação

O debate em torno do acesso à Cannabis medicinal tem ganhado força no Brasil, impulsionado por avanços científicos e por demandas judiciais de pacientes que dependem desse tratamento. A recente decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que definiu não ser obrigação dos planos de saúde fornecer medicamentos à base de canabidiol para uso domiciliar, trouxe à tona as barreiras jurídicas e econômicas que ainda dificultam o acesso. Diante desse cenário, cresce a discussão sobre o cultivo domiciliar como alternativa viável para garantir o direito constitucional à saúde.

Direito fundamental e criminalização

A Constituição Federal assegura que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, a ser efetivado por meio de políticas públicas. Entretanto, quando o fornecimento de medicamentos é limitado pelo alto custo, pelas restrições regulatórias ou pela ausência de cobertura, pacientes acabam impedidos de obter o tratamento necessário. Nesse contexto, a criminalização do cultivo da Cannabis sativa L. representa um obstáculo adicional, ainda que haja prescrição médica.

A comunidade científica e médica tem reiterado a eficácia da cannabis no tratamento de epilepsia refratária, esclerose múltipla, dores crônicas, autismo, doenças neurodegenerativas e distúrbios relacionados ao câncer. Instituições como Fiocruz, USP e Hospital Israelita Albert Einstein vêm reunindo evidências que sustentam o uso terapêutico. O histórico medicinal da planta, documentado desde o século XIX, reforça que a proibição, consolidada ao longo do século XX sob influência política e ideológica, desconsiderou esse acervo de conhecimento.

Direito penal e o autocultivo

A Lei de Drogas (nº 11.343/2006) proíbe o cultivo de plantas que produzam substâncias entorpecentes, mas prevê exceções para fins medicinais e científicos, desde que autorizadas pela União. Ainda assim, normas da Anvisa, como a RDC nº 327/2019 e a RDC nº 660/2022, tratam apenas da fabricação e importação, sem contemplar o cultivo pessoal.

A lacuna legislativa coloca pacientes em situação de vulnerabilidade: dependentes de produtos importados caros ou do fornecimento judicializado, ao mesmo tempo em que podem ser criminalizados caso optem por plantar a própria matéria-prima de seu tratamento. Decisões recentes do STJ, como no Habeas Corpus nº 802866, têm concedido salvo-conduto para pacientes cultivarem a planta, desde que haja prescrição médica, reconhecendo que não há ofensa à saúde pública quando o uso é restrito e supervisionado.

Avanços jurisprudenciais

Embora tímida, a evolução da jurisprudência brasileira mostra que tribunais têm autorizado tanto indivíduos quanto associações a realizarem o cultivo para produção de medicamentos. Paralelamente, experiências internacionais, como no Canadá, Uruguai e em estados norte-americanos, demonstram que o cultivo regulado não compromete a segurança pública e ainda fortalece pesquisas e novas terapias.

Caminho para regulamentação

Especialistas defendem que permitir o autocultivo, mediante fiscalização e regulamentação, é uma medida que reduz custos, garante continuidade do tratamento e assegura autonomia aos pacientes. A decisão da 3ª Turma do STJ, ao restringir a responsabilidade dos planos de saúde, reforça a urgência de políticas mais claras e inclusivas.

Sem avanços legislativos, o impasse tende a se manter entre o direito constitucional à saúde e a criminalização da planta. Para especialistas e pacientes, o cultivo domiciliar aparece como alternativa concreta e constitucionalmente legítima para garantir dignidade e efetividade ao tratamento.

Com informações do site Plural

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