Contrato de R$ 25,4 mi com a Celepar expõe falhas e contradições da Prefeitura de Foz
Foz do Iguaçu Parecer jurídico da própria autarquia de trânsito do município aponta irregularidades e risco de nulidade; notas oficiais apresentam informações inverídicas e omitem dados

Por Bruno Soares
Foz do Iguaçu
A Prefeitura de Foz do Iguaçu, por meio do Instituto de Transportes e Trânsito (Foztrans), firmou contrato de R$ 25,4 milhões com a Companhia de Tecnologia da Informação e Comunicação do Paraná (Celepar), estatal em processo de privatização suspenso pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR). A contratação, assinada em 26 de setembro, foi feita sem licitação, com base no artigo 75, inciso IX, da Lei 14.133/2021, que permite contratações diretas entre entes públicos.
Um parecer jurídico da própria autarquia, o nº 39/2025, alertou para falhas graves no processo, ausência de pesquisa de preços, fragilidade do termo de referência e risco de nulidade caso a Celepar perca sua natureza pública. Mesmo assim, a diretoria do Foztrans manteve a assinatura do contrato, com prazo de cinco anos. O parecer aponta ainda cláusulas desvantajosas, como multa de 0,5% sobre o valor global e a falta de comprovação documental da exclusividade técnica alegada pela empresa. A procuradoria interna do Foztrans condicionou a validade da contratação à correção das irregularidades, o que até o momento ainda não ocorreu. Em notas públicas distribuídas à imprensa regional, o Foztrans afirmou que o contrato “segue o modelo adotado pela Celepar em todo o Paraná e abrange todos os municípios com trânsito municipalizado”. A informação, porém, não é verdadeira.
Segundo dados divulgados pela Agência Estadual de Notícias em julho de 2024, apenas 46 municípios haviam aderido ao sistema da Celepar, número inferior ao total de cidades com trânsito municipalizado no Estado. Além disso, a reportagem questionou o Governo e a Celepar sobre a atualização desses dados, mas nenhum dos dois respondeu.
As contradições se ampliam quando o Foztrans sustenta que o valor de R$ 21,24 por infração paga seria “compatível com o mercado”. Não há, contudo, pesquisa de preços juntada ao processo nem comparativo com contratos de outros municípios. O documento jurídico confirma a ausência de levantamentos técnicos e destaca que o cálculo do preço baseia-se exclusivamente na proposta da própria Celepar, sem comprovação externa de competitividade.
O caso contraria o Parecer nº 411/2024 da Procuradoria-Geral do Estado (PGE-PR), que recomenda que o governo evite novas contratações com a Celepar enquanto durar o processo de privatização. “Com a privatização, a CELEPAR deixará de se enquadrar nas hipóteses de dispensa de licitação”, diz o documento. O mesmo parecer orienta que novas licitações sejam preparadas para impedir interrupção de serviços públicos digitais.
Alerta
Para o advogado Paulo Jordanesson Falcão, representante do Comitê de Funcionários contra a Privatização da Celepar, a decisão do Foztrans ignora o alerta da PGE e pode gerar prejuízos financeiros e jurídicos aos municípios. “Com a desestatização, os contratos atuais não poderão ser prorrogados. As prefeituras terão de licitar novamente, provavelmente pagando mais caro. Isso é uma bomba fiscal”, afirmou.
Falcão também chama atenção para o risco de dependência tecnológica e violação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). “A Celepar é responsável pela integração entre sistemas estaduais e municipais. Se privatizada, o controle sobre informações sensíveis da população passará a uma empresa privada, o que compromete a soberania digital do Estado”, alertou.
A reportagem questionou a assessoria de comunicação do Governo do Paraná sobre as medidas adotadas para cumprir as recomendações da PGE e sobre a lista atualizada de municípios que utilizam o sistema. O governo limitou-se a informar que “todas as recomendações da PGE estão sendo consideradas”, sem apresentar detalhes. A Celepar não se manifestou.
Para o TCE, o tema exige transparência. No último dia 3, o conselheiro Durval Amaral determinou a realização de novos estudos e uma audiência pública antes de qualquer avanço na privatização. Mesmo assim, a Prefeitura de Foz homologou o contrato, com base em alegações genéricas e sem respaldo documental. Caso a privatização da Celepar seja retomada, o acordo poderá ser questionado judicialmente e gerar impacto financeiro direto sobre os cofres do município.
