Caso Copacol/Cerealista Fruet
A Copacol, cooperativa paranaense de grande porte, adquiriu imóvel e equipamentos da Cerealista Fruet por aproximadamente R$ 40 milhões. Empresa do grupo Balanças Capital é um ‘corpo estranho‘ na referida negociação.
Por Sergio Ricardo
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A Cerealista Fruet, empresa sediada em Campo Bonito (PR), atuava há cerca de 30 anos no setor de armazenagem e comercialização de grãos. A Copacol, cooperativa paranaense de grande porte, adquiriu imóvel e equipamentos da Cerealista Fruet por aproximadamente R$ 40 milhões, em operação ocorrida entre junho e julho de 2025. Ocorre que na mesma época, dezenas de produtores que entregaram grãos a Fruet relataram que não receberam os valores devidos. Prejuízos estimados giram entre R$ 20 milhões e até mais de R$ 50 milhões, segundo levantamentos preliminares.
Detalhes da transação
A venda da estrutura da Fruet (situação operacional: imóveis + equipamentos) foi confirmada pela Copacol. Em nota, a cooperativa afirma que a compra “se limitou ao imóvel e aos equipamentos da estrutura operacional em Campo Bonito”. A Fruet, por sua vez, teria continuado negociando grãos após a venda, segundo o Ministério Público do Paraná (MP-PR), recebendo mercadorias dos produtores sem realizar os pagamentos correspondentes. Um mandado de prisão foi expedido contra o empresário da Fruet, Celso Fruet, por suposto estelionato envolvendo mais de 120 produtores rurais.
Impactos para produtores e mercado
Os produtores rurais que entregaram grãos estão em situação de incerteza: muitos dependem do pagamento para honrar financiamentos da safra ou pagar insumos. O episódio gera repercussão no setor de armazenagem e comercialização de grãos, aumenta a exigência de transparência nas operações entre produtores e cerealistas, além de reforçar a necessidade de garantias contratuais e de observância de práticas de mercado justo. Para a Copacol, mesmo mantendo a compra restrita à estrutura, o fato de a aquisição coincidir com o momento de crise da Fruet colocou a cooperativa sob pressão de stakeholders (produtores, mídia, fornecedores) para explicações e para se posicionar sobre passivos existentes.
Posição das partes
A Fruet, por meio de sua defesa, reconheceu que há créditos devidos aos produtores e afirmou que a venda da estrutura visava quitar dívidas bancárias e com credores. Alega crise financeira agravada por pandemia e problemas de saúde do empresário. A Copacol declarou que não assumiu os débitos da Fruet e que sua aquisição seguiu os princípios legais, sendo limitada ao ativo imóvel/equipamentos.
Corpo Estranho
Muitas notícias sobre o pagamento de uma comissão de 10% na transação Copacol X Cerealista Fruet, e por isso, nossa reportagem foi em busca das informações, pois muitos noticiaram ‘tal comissão’ sem especificar quem teria sido o agraciado com nada menos que R$ 4 milhões que fizeram falta para pagar haveres de diversos agricultores que são credores da cerealista.
O que descobrimos?
Realmente foram pagos R$ 4 milhões a título de uma robusta comissão de 10% muito acima do que é praticado no mercado, e mais grave, a beneficiada com o valor de 10% da transação Copacol e Cerealista Fruet, não é imobiliária ou empresa de corretagem. Trata-se de Base e Fundação Materiais de Construção Ltda, empresa do grupo ‘Balanças Capital’ cuja sede fica em Santa Tereza do Oeste, porém, a Base está registrada no Estado de Santa Catarina com sede em Itajaí. A negociação de intermediação definindo os 10% a serem pagos a referida empresa, tem documento assinado em Cartório de Guaraniaçu, ao qual tivemos acesso.
Mas na Nota Fiscal qual serviço está discriminado? Isso só quem tem acesso a ela que pode informar. Para quem foi emitida a NF? Copacol ou Cerealista Fruet? Quem pagou a comissão de R$ 4 milhões? Se foi colocado como comissão ou corretagem, a emitente podia ter feito? Mesmo que tais funções não façam parte de suas atividades comerciais? Se realmente a Copacol pagou 10% de comissão a uma empresa sem relação com o ramo de corretagem, assessoria ou intermediação, isso levanta questões sérias de legalidade, transparência e governança corporativa.
Pagamento
Mesmo que a empresa Base e Fundação Materiais de Construção Ltda não tenha essa finalidade no objeto social de seu Contrato Social e no CNAE no seu cartão de CNPJ (ex.: era uma loja de materiais de construção), o pagamento poderia ter sido feito formalmente de algumas maneiras contábeis. Como “serviço de intermediação” – a empresa emitiu uma nota fiscal de prestação de serviços com descrição genérica (“consultoria comercial”, “intermediação de negócios”, etc.). Isso é permitido somente se o serviço foi real e comprovado por contrato. Caso a empresa não tenha essa atividade em seu objeto social (CNAE), a nota é irregular. Como “assessoria ou consultoria” – ainda mais genérico, usado para mascarar um pagamento de comissão. Se a empresa não tem registro nessa área e nunca prestou serviços semelhantes, isso configura simulação de contrato. Como “pagamento indireto” via terceiros – ou seja, a Copacol transferiu o valor à Cerealista Fruet, e a Fruet repassou a terceiros (ex.: Base Materiais). Nesse caso, a Copacol pode alegar desconhecimento, mas o dinheiro saiu da operação e o beneficiário continua sem legitimidade.
Isso é um problema
Há três grandes problemas jurídicos nesse tipo de operação:
1. Violação do objeto social
Se a empresa (por exemplo, uma “Base Materiais de Construção”) recebeu comissão sem estar autorizada a atuar como corretora, consultoria ou intermediação, há desvio de finalidade (art. 981 e 1.150 do Código Civil). Isso pode gerar nulidade contratual e enquadrar os gestores em ato de gestão temerária.
2. Indício de pagamento indevido
Pagar 10% de comissão a uma empresa sem vínculo técnico pode caracterizar: simulação de negócio jurídico (art. 167 do Código Civil); lavagem de dinheiro ou favorecimento indevido, se o pagamento teve o objetivo de transferir recursos a terceiros.
3. Irregularidade contábil e tributária
A Receita Federal exige que: o serviço tenha relação direta com o CNAE da empresa que emite a nota; o pagamento tenha lastro contratual e econômico (serviço realmente prestado). Caso contrário, a operação é considerada “despesa não dedutível” e pode ensejar multa, autuação fiscal e até investigação criminal por simulação.
Como deveria ter sido feito
Se a Copacol quisesse pagar uma comissão de intermediação legítima, deveria: ter contrato de corretagem assinado com a empresa intermediadora; exigir que essa empresa tivesse CNAE compatível (ex.: 68.22-6-00 — Corretagem na compra e venda de imóveis, ou 70.20-4-00 — Consultoria em gestão empresarial); solicitar nota fiscal correspondente ao serviço prestado; registrar o pagamento nos balanços contábeis com a descrição correta. Sem isso, o pagamento é sem respaldo jurídico válido.
Consequências legais possíveis
Se confirmado que a empresa não tinha finalidade de intermediação, e o pagamento de 10% foi feito sem contrato ou serviço comprovado, então há possibilidade de enquadramento em: Art. 171, §2º, CP — estelionato qualificado (se houve prejuízo a terceiros, como produtores lesados); Lei 12.846/2013 — corrupção privada ou atos lesivos à administração pública (por má gestão de recursos de cooperados); Lei 9.613/1998 — lavagem de dinheiro, se o pagamento foi usado para ocultar destinação real.
A nossa reportagem procurou a direção da Copacol e não obteve retorno das mensagens deixadas diretamente no whatsApp pessoal do presidente da Cooperativa, senhor Valter Pitol.
Com relação a Base e Fundação Materiais de Construção Ltda, procuramos a empresa na sede da Balanças Capital, em Santa Tereza do Oeste, e ouvimos a versão sobre os 10% recebidos como comissão, e mesmo sem apresentar algum documento que confirmasse a legalidade da transação, um dos sócios, Eucides Aparecido Ribeiro, que diz ter sido quem tratou de toda a negociação, e segundo ele, tudo foi feito dentro da lei. Trataremos disso no próximo capítulo desta verdadeira ‘novela mexicana’ e que promete ainda muitos capítulos emocionantes.

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