GCAST

Artistas denunciam injúria racial em feira de Curitiba após funcionária acusá-los de furto; polícia investiga

Por Giuliano Saito


Wes Ventura e Mano Cappu, musicistas da capital paranaense, disseram que foram acusados de furtar taça de acrílico. Organização lamentou e disse que afastou funcionária quando soube do caso. Defesa da suspeita afirmou que está à disposição das autoridades. Wes Ventura e Mano Cappu são musicistas em Curitiba g1 Os musicistas Wes Ventura e Mano Cappu, de Curitiba, registraram Boletim de Ocorrência (B.O) na Polícia Civil do Paraná (PC-PR) por injúria racial contra uma funcionária da Feira Internacional da Música do Sul (FIMS). O evento aconteceu de 2 a 5 de novembro, na capital paranaense, e o boletim foi registrado na quarta-feira (9). Segundo os artistas, a produtora Michelle Gutmann acusou os dois de furtar uma taça de acrílico durante do evento. A polícia confirmou ao g1 que investiga o caso. Compartilhe no WhatsApp Compartilhe no Telegram Em nota, a defesa da suspeita afirmou que ainda não teve acesso ao Boletim de Ocorrência e por conta disso não realizará nenhum comentário sobre o caso. Além disso, reforçou que Michelle está à disposição das autoridades para esclarecimento dos fatos. O produtor Téo Ruiz, responsável pela organização da FIMS, lamentou o ocorrido, disse que afastou a funcionária envolvida, afirmou ter prestado apoio às vítimas e reforçou que investirá em discussões raciais na feira. Leia mais abaixo. O que dizem os músicos Wes Ventura contou que o caso aconteceu durante um coquetel. “Eu tava com uma camiseta e uma calça sem bolso. Encontrei o Mano Cappu e pedi se ele poderia guardar o meu óculos no bolso da blusa dele. Mas, no momento em que eu coloquei o meu óculos no bolso, uma mulher branca olhou para mim e para ele, e se sentiu à vontade para falar 'vocês tão roubando um copo'. A pessoa acha que é muito tranquilo de falar isso para pessoas negras. E isso causou para mim um constrangimento sem palavras”, lembrou Wes. O artista contou que a acusação da funcionária aconteceu no primeiro dia de evento. De acordo com ele, quando ambos foram acusados do suposto furto, outras pessoas estavam no local, mas nenhuma foi acusada do crime por Michelle. O cantor lembrou que quando a acusação aconteceu, ele tinha acabado de chegar e ainda não tinha pegado nenhuma taça no coquetel. "O que até seria normal, afinal era um coquetel. Mas eu ainda nem estava com uma taça [...]. Ela fez o comentário com tom de piada, com aquele teor de risadinha, encobrindo a violência que é olhar para uma das únicas pessoas negras no ambiente, que éramos nós, e insinuar isso". Alep aprova projeto que prevê multa de mais de R$ 60 mil por racismo e injúria racial Entenda: diferença entre injúria racial e racismo Discussão Segundo Cappu, após a cena, a funcionária saiu do local. Eles disseram que demoraram a entender o que tinha acontecido. Quando a mulher voltou, eles a contestaram. Segundo os artistas, o organizador do evento, Téo Ruiz, presenciou a cena e não interviu. O produtor nega e disse que só soube do caso pelas redes sociais dois dias após o ocorrido, quando os musicistas publicaram a respeito em uma rede social. “Eu chamei ela para conversar, cheguei do lado do organizador, ele ouviu, e eu disse [para ela]: ‘você foi racista. Você acusou duas pessoas pretas de estarem roubando um copo’. Aí ela disse que foi brincadeira”, disse Cappu. O artista lembrou, também, que na conversa a funcionária argumentou que no evento do ano passado alguns copos teriam sido roubados, tentando justificar a acusação. “Eu falei que não era um copo, que era um óculos... E indiferente se roubaram ou não roubaram copos [no ano anterior], o papel dela é ser produtora [...].Coloca uma placa ali e fala que é proibido levar os copos. Você não vai precisar constranger ninguém", afirmou Cappu. Para os artistas, o que aconteceu na FIMS evidencia o racismo estrutural. “A denúncia aconteceu e não partiu de nenhuma outra pessoa, partiu de nós mesmos, de mim e do Cappu. É sobre esse racismo estrutural e do medo que é denunciar racismo ainda... As pessoas brancas não entenderam ainda que é importante quando você ver, você denunciar. Isso é uma coisa que não tem que partir só de nós. [...] As pessoas que presenciam esse racismo têm que agir, é o mínimo que a gente espera que aconteça”, lamentou Wes. Racismo estrutural: entenda o que é Professora é afastada por injúria racial contra aluna no Paraná: 'Sua preta sebosa e encardida' Pesquisadora contesta representação de crianças negras como escravas no Paraná Mulher é presa no Paraná por injúria racial contra policial: 'Não vou conversar com você, preto', Cappu reforçou que situações como a que aconteceram na feira reforçam violências que pretos sofrem diariamente. "A gente é seguido pelo segurança, policial, não sentam do teu lado no ônibus, são essas microviolências que a gente passa. E eu fico pensando 'nossa, eu sou tão perigoso assim?'", disse. O que diz a organização da feira Em nota, o produtor da FIMS, Téo Ruiz, disse que soube do caso em 4 de novembro e, logo após, afastou a funcionária envolvida no caso. Afirmou, também, que contatou às vítimas, se desculpou pelo ocorrido e colocou a organização à disposição para auxílio aos artistas. “Ao longo dos últimos anos, contratamos diferentes profissionais autônomos para cada edição, pontualmente, partindo do princípio equivocado de que a área da cultural já estaria capacitada para lidar com a diversidade. Temos muito a caminhar nesse sentido. [...] Acredito que todos que trabalhamos com produção de eventos precisamos estudar, nos aprimorar e nos preparar para receber toda diversidade e caminhar no sentido de coibir e denunciar com mais rapidez atos não só de racismo, mas qualquer ação que fira a individualidade de quem quer que seja, e que reproduza conceitos discriminatórios de nossa sociedade”, disse trecho da nota. Ruiz também afirmou que, nas próximas edições do evento, passará a oferecer “treinamento para todos da equipe” sobre questões raciais, além de “ter um comitê de diversidade e de ampliar e ter mais pessoas pretas na equipe”. Leia também: Carol Dartora (PT) é eleita a primeira deputada federal negra do Paraná: 'Resposta histórica' UEPG afasta estudantes após denúncia de troca de mensagens racistas em grupo de aplicativo Initial plugin text Vídeos mais assistidos do g1 Paraná: Veja mais notícias do estado em g1 Paraná.