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Reprodução 3D é uma alternativa para conservar artefatos indígenas e museológicos

Pesquisa do PPG Design desenvolve réplicas de vasos tupi-guarani como forma de conservar o patrimônio cultural e possibilitar a interação com peças arqueológicas

Por Bruno Rodrigo

Reprodução 3D é uma alternativa para conservar artefatos indígenas e museológicos Créditos: Pietro Scopel/JU

Estudos arqueológicos apontam que indígenas tupi-guarani ocupavam um espaço às margens do Rio Guaíba desde o século XIV. Na ilha Francisco Manoel, localizada no extremo sul de Porto Alegre, já foram encontrados diversos artefatos, desde ossadas até vasos de cerâmica, que hoje são peças de museu.

Conservar esses objetos históricos pode ser uma tarefa demorada e cara, mas é de suma importância. Por isso, cientistas têm investigado a aplicabilidade de soluções alternativas, como é o caso da impressão 3D, técnica utilizada na pesquisa de Felipe Gallego, mestre em Design pela UFRGS. 

Sob orientação de Fabio Pinto, ele reproduziu 5 artefatos tupi-guarani utilizando filamento e resina. Dessa forma, as pessoas que visitam os museus poderiam ter uma interação direta com esses objetos. “Se uma pessoa vê um vaso e pode tocá-lo, isso cria um espaço na imaginação”, aponta Felipe. 

As peças escolhidas para o projeto são fragmentos de vasos yapepó, atualmente armazenados no Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo. Na cultura tupi-guarani, esses vasos são utilizados para a preparação de alimentos. Além deles, outros objetos são comuns na cozinha tupi-guarani, como o vaso cambuchi caguâbá (usado para a preparação de bebida) e o ñaeta (espécie de prato fundo para líquidos e alimentos). 

Para obter as réplicas, o designer realizou um processo com quatro etapas: análise das peças, digitalização, aprimoramento dos modelos digitais e impressão.  

Com o software Artec Studio, ele captou as especificidades dos objetos e digitalizou-os. Alguns detalhes, no entanto, ficaram de fora, já que, como são feitos à mão, os vasos não são totalmente padronizados. O pesquisador usou, então, outros dois softwares, o GeoMagic e o Zbrush, para aprimorar as texturas manualmente, ou seja, “esculpir” no modelo 3D. 

“Antes, para recuperar ou restaurar patrimônio cultural, você tinha de fazer moldes, só que sempre precisava ter contato com peças que já estão em um estado bem mais frágil”

Felipe Gallego
Imaginando o vaso real 

Já que as peças selecionadas para a pesquisa eram fragmentos do que outrora foi um vaso yapepó, Felipe decidiu reconstituir os modelos originais pelo computador. “A ideia é criar, no imaginário social, as peças arqueológicas de milhões de anos, como é que elas eram feitas.” 

O software Blender, usado para a reconstituição dos vasos, tem múltiplas funcionalidades. Além de criar animações em 3D (como o filme “Flow”, de 2024) ele é empregado para estudos da arqueologia digital, pois possibilita recriar objetos, mapas e pessoas.  

A visão de um arqueólogo

“Um dos maiores apelos da arqueologia está no nível da experiência”, aponta o pesquisador Marcos Torres, arqueólogo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Para ele, a primeira preocupação que vem em mente é a autenticidade dos artefatos, que se perde em uma réplica. 

No entanto, o professor reconhece que os ganhos são maiores que as perdas, já que a impressão 3D permite a popularização do conhecimento e tem um nível de precisão inegável.  

“Eu fico imaginando se nós tivéssemos impressões 3D de objetos de enorme importância cultural do Museu Nacional antes do advento da tragédia do incêndio”, relembra Marcos, referindo-se aos inúmeros objetos que foram danificados em 2018 e que ainda não foram totalmente recuperados. 

Felipe expressa sua satisfação com a precisão dos modelos e o resultado da pesquisa. Ele comenta que, na realidade, o objetivo da réplica não é substituir o artefato original. “Ela tem outro papel, na sensibilidade das obras, na recuperação das obras, ela não quer ser a obra. Ela poderia, sim, ajudar a obra a ser mais democrática.”

Em breve, a dissertação completa estará disponível no Lume, mas é possível ler mais sobre a pesquisa no livro “Design em pesquisa: volume 6”, no qual Felipe e Fabio assinam um capítulo sobre o tema.

 

*Com informações do Jornal da UFRGS