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Projeto Livros da Floresta aumenta voz indígena no acervo da Biblioteca Brasiliana

A formação de uma coleção de obras de autoria indígena ou em línguas indígenas visa ampliar as fontes documentais sobre os povos originários

Por Da Redação

Projeto Livros da Floresta aumenta voz indígena no acervo da Biblioteca Brasiliana Créditos: Fortalecimento da literatura indígena é recente

A Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP está realizando desde 2024 o projeto Livros da Floresta, que, até o momento, conta com 131 obras. O objetivo é entrecruzar os caminhos já abertos no acervo BBM com os livros de viajantes e missionários e dos mais de mil livros da biblioteca de Gordon Brotherston, especialista em literaturas de povos ameríndios, doada em 2023, ampliando as fontes documentais sobre os povos indígenas habitantes no Brasil e privilegiando o papel ativo destes povos na produção documental, seja por via da autoria indígena (escrito por pessoas indígenas somente ou com colaboração de pessoas não indígenas) ou das publicações em línguas indígenas (produzidos, no todo ou em parte, em línguas indígenas), e assim formar uma coleção, inicialmente priorizando o suporte livro em papel.

A criação de uma coleção na biblioteca de obras de autoria indígena e/ou em línguas indígenas atende a dois critérios fundamentais de formação do acervo BBM: livros raros relacionados ao Brasil e aos estudos brasileiros. Essas obras, de maneira geral, sem um aparato editorial mais estruturado, já nascem com um potencial de raridade elevado, porque poucos exemplares são impressos (às vezes, umas poucas dezenas) e/ou por causa da distribuição limitada, pois muitos exemplares ficam retidos nas próprias instituições que fomentaram as publicações.

Segundo o especialista em pesquisa da BBM, João Marcos Cardoso, coordenador da equipe de Mediação Cultural que está à frente do projeto, reunir numa mesma instituição uma coleção abrangente de livros de autoria indígena e em línguas indígenas “contribui com a preservação de materiais bibliográficos até bem recentemente relegados por instituições de guarda de acervo. Além disso, a existência de uma coleção institucional com essas características propicia maior facilidade de acesso aos documentos por pesquisadoras e pesquisadores indígenas e não indígenas”, destaca.

Nos últimos anos, questões indígenas têm conseguido, graças sobretudo ao protagonismo indígena, atrair o interesse de instituições e públicos cada vez mais amplos. Podemos dar dois exemplos emblemáticos desse interesse ampliado. Em 2023, Ailton Krenak foi a primeira pessoa indígena a ser eleita para a Academia Brasileira de Letras. Anos antes, a agência da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) declarou o decênio 2022-2032 como a Década Internacional das Línguas Indígenas, cujo início ensejou uma exposição sobre línguas indígenas brasileiras: Nhe’ē Porã: Memória e Transformação, realizada de 12 de outubro de 2022 a 23 de abril de 2023, no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo.

O fortalecimento da literatura indígena é recente. A partir de 1990, houve um crescimento expressivo da literatura indígena no Brasil, que se deve, talvez, à redemocratização e ascensão midiática da luta indígena. Muitas obras, inicialmente, não eram feitas para serem comercializadas e, por isso, não existem mais edições delas. “Eram obras feitas pelas próprias comunidades para as próprias comunidades. Livros de alfabetização para serem usados com as crianças da aldeia. Pois, não havia um sentido de levar para além disso [comercializar o livro]”, comenta Susan Gabriela Huallpa Huanacuni, estagiária da Mediação Cultural, peruana há 12 anos no Brasil e estudante do 5º ano do curso de Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, com ênfase na área de Antropologia.