PGR pede condenação de Bolsonaro e núcleo central da trama golpista
Com 517 páginas, o parecer da PGR sustenta que Bolsonaro foi o “principal articulador e maior beneficiário” da tentativa de golpe de Estado
Por Da Redação

A Procuradoria-Geral da República (PGR) encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF), na noite da última segunda-feira (14), o pedido de condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro e de mais sete integrantes apontados como o núcleo central da suposta trama golpista investigada pela Polícia Federal. A manifestação, assinada pelo procurador-geral Paulo Gonet, foi direcionada ao ministro Alexandre de Moraes e marca o encerramento da fase de alegações finais, etapa que antecede o julgamento dos réus, previsto para setembro deste ano.
Com 517 páginas, o parecer da PGR sustenta que Bolsonaro foi o “principal articulador e maior beneficiário” da tentativa de golpe de Estado que teria sido colocada em curso após o resultado das eleições de 2022. O ex-presidente, segundo Gonet, liderou uma organização criminosa que operou dentro do aparato estatal com o objetivo de abalar a ordem democrática e anular a vitória eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva.
O Ministério Público acusa os envolvidos de cinco crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, organização criminosa armada, dano qualificado pela violência e deterioração de patrimônio tombado. Somadas, as penas podem ultrapassar 30 anos de prisão.
Além de Bolsonaro, o pedido de condenação inclui:
Walter Braga Netto, general da reserva e ex-ministro da Defesa, além de ter sido vice na chapa de Bolsonaro em 2022;
General Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF;
Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa e general da ativa à época;
Mauro Cid, tenente-coronel do Exército, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator.
Em relação a Cid, a PGR recomenda a suspensão da pena em caso de condenação, como forma de cumprimento do acordo de delação premiada firmado com a Polícia Federal.
O papel de Bolsonaro
De acordo com a acusação, Bolsonaro se valeu da posição de chefe de Estado para montar uma engrenagem institucional voltada à deslegitimação do processo eleitoral. O documento afirma que o ex-presidente utilizou o Estado “à revelia do interesse público” para disseminar desinformação, desestabilizar instituições democráticas e estimular uma ruptura autoritária, contando com o apoio de membros do alto escalão das Forças Armadas e de diversos setores do governo.
Entre os episódios centrais descritos está o envolvimento direto de Bolsonaro com a chamada "minuta do golpe" — documento que previa medidas extremas, como a prisão de ministros do STF e a convocação de novas eleições. A existência da minuta já havia sido revelada, mas ganhou nova dimensão após depoimento recente de Mauro Cid, que confirmou à Justiça que Bolsonaro leu o texto, sugeriu mudanças e discutiu seu conteúdo com aliados próximos, incluindo o ex-assessor Filipe Martins, responsável por apresentar o documento com auxílio de um jurista.
Ações paralelas
Outros depoimentos fortalecem a tese da PGR de que a suposta tentativa de golpe foi uma ação articulada em diversos níveis do governo. O analista de inteligência Clebson Vieira, que atuava no Ministério da Justiça durante o governo Bolsonaro, relatou ter recebido ordens para cruzar dados que pudessem ligar o então candidato Lula a facções criminosas, especialmente em comunidades dominadas pelo Comando Vermelho no Rio de Janeiro.
Vieira relatou que as ordens partiam da então diretora de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas, Marília de Alencar, também ré no processo. Segundo ele, a única candidatura analisada em profundidade foi a de Lula, evidenciando, de acordo com a acusação, o uso político de estruturas estatais para comprometer a reputação de adversários.
Na mesma linha, o ex-coordenador de inteligência da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Adiel Alcântara, voltou a confirmar que houve orientações para que a corporação intensificasse fiscalizações em estados do Sudeste durante o segundo turno das eleições. A estratégia, segundo ele, visava abordar veículos com eleitores em direção ao Nordeste, região com forte apoio ao candidato petista. Goiás, Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro estariam entre os focos da operação.
Caminho até o julgamento
Com a entrega das alegações finais da PGR, abre-se o prazo de 15 dias para que Mauro Cid apresente sua defesa. Em seguida, os demais réus também terão 15 dias para entregar suas manifestações finais. Finalizada essa etapa, caberá à Primeira Turma do STF definir a data do julgamento, que, nos bastidores do Supremo, já é tratado como um dos mais relevantes da história recente da Corte.
Caso o STF acolha integralmente os pedidos da PGR, Bolsonaro poderá se tornar o primeiro ex-presidente da República condenado por tentativa de golpe de Estado.
