pref santa tereza Setembro 2025

Pesquisa da Fiocruz premiada na Europa propõe substituir uso de camundongos em testes de antiveneno de cobras

Estudo da bióloga Renata Norbert, do INCQS, desenvolve método inédito no mundo e reduz em até 69% o custo dos ensaios de controle de qualidade

Pesquisa da Fiocruz premiada na Europa propõe substituir uso de camundongos em testes de antiveneno de cobras Créditos: van Mattos/Zoológico de Brasília

A bióloga Renata Norbert, do Instituto Nacional de Controle da Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz), foi premiada pela Sociedade Europeia para Alternativa de Testes em Animais durante o 13º Congresso Mundial de Alternativas ao Uso de Animais, realizado recentemente. O trabalho, que propõe substituir camundongos por ensaios in vitro no controle da qualidade de soros contra o veneno de cobras do gênero Bothrops, também recebeu menção honrosa do Centro Nacional para a Substituição, Refinamento e Redução de Animais em Pesquisa, entidade científica do Reino Unido.

O estudo é considerado pioneiro e alcançou a fase de pré-validação, etapa inédita em pesquisas de antivenenos em todo o mundo. Segundo Renata, essa fase comprova a eficácia do método em testes laboratoriais e abre caminho para sua aplicação prática em laboratórios produtores.

Alternativa mais rápida e econômica

A metodologia substitui os tradicionais testes com camundongos por células Vero cultivadas em laboratório, que reagem a uma mistura de soro com veneno. Se as células permanecem intactas, o antiveneno é aprovado; caso apresentem alterações, o soro é reprovado.

De acordo com a pesquisadora, o novo método reduz em até 69% os custos e encurta o tempo de análise, liberando resultados em cerca de uma semana — enquanto os testes em animais podem levar mais de um mês. Além da economia, o modelo evita o sofrimento dos roedores, que são submetidos a procedimentos dolorosos e posteriormente sacrificados.

“O nosso método é simples e rápido. Depois da validação, o ganho será imenso para a ciência e para a ética na pesquisa”, destacou Renata.

Reconhecimento e próximos passos

O reconhecimento internacional reforçou o avanço do projeto, que agora entra na etapa final: a validação interlaboratorial, quando outros centros científicos vão reproduzir o método para confirmar sua robustez. “Acho que esse foi o maior diferencial do nosso trabalho: conseguimos avançar um passo a mais na validação”, explicou a bióloga.

O INCQS já utiliza técnicas de cultivo celular para liberação de vacinas, mas este é o primeiro estudo voltado a venenos. A intenção é, após a aprovação dos resultados, incluir a metodologia na farmacopeia brasileira e montar kits de ensaio que possam ser usados em diferentes laboratórios.

Renata também pretende expandir a pesquisa internacionalmente, aplicando o método em outras espécies do gênero Bothrops, presentes em países como Costa Rica e Colômbia. A expectativa é que o modelo esteja pronto para uso prático a partir de março de 2026.

Contexto e impacto

As serpentes Bothrops — conhecidas popularmente como jararacas, cotiaras e urutus — são responsáveis por cerca de 90% dos casos de envenenamento por cobras no Brasil, segundo o INCQS. Apenas neste ano, o DataSUS registrou 12 mil acidentes envolvendo o gênero.

O veneno dessas serpentes pode causar hemorragias, necroses e amputações, e o tratamento depende exclusivamente de antivenenos produzidos por instituições públicas, como o INCQS, o Instituto Butantan, o Instituto Vital Brasil e a Fundação Ezequiel Dias.

Apesar da gravidade dos casos, a Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica os acidentes com Bothrops como doença tropical negligenciada, por não despertarem interesse comercial na indústria farmacêutica.

“Nosso sonho é ver esse método aplicado na prática, melhorando a segurança, reduzindo custos e eliminando o sofrimento animal”, concluiu Renata Norbert.

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