Pedreiro de clube de futebol de Curitiba será indenizado por demissão discriminatória
TRT-PR condena empregador ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais; decisão ainda cabe recurso
Por Da Redação
Créditos: IStock
A Justiça do Trabalho do Paraná reconheceu como discriminatória a demissão de um pedreiro dependente químico que atuava em um clube de futebol de Curitiba. A decisão foi proferida pela 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-PR), que condenou a entidade ao pagamento de indenização de R$ 10 mil por danos morais.
De acordo com os desembargadores, o clube tinha conhecimento da doença do trabalhador e mesmo assim decidiu pela dispensa dois meses após ele receber alta de internação para tratar da dependência química. “A dependência química é considerada doença grave e estigmatizante e, como tal, presume-se o caráter discriminatório da dispensa, conforme a Súmula 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST)”, destacou o colegiado em sua decisão.
O processo tramita em segredo de Justiça, e da decisão ainda cabe recurso.
Histórico do caso
O pedreiro foi contratado em setembro de 2020 e dispensado em março de 2024, sem justa causa. Conforme consta nos autos, o clube foi informado sobre o problema de saúde em janeiro de 2022, quando o funcionário precisou se internar para tratamento da dependência química, permanecendo afastado até maio do mesmo ano.
Atestados médicos anexados ao processo demonstram novas internações nos meses de outubro e novembro de 2022, todas relacionadas ao mesmo diagnóstico — CID 10 F14.2, que se refere a transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de cocaína, síndrome de dependência.
Em janeiro de 2024, o trabalhador passou por um novo período de internação, desta vez de 12 dias, e foi demitido em março, logo após o retorno.
Após a dispensa, o pedreiro entrou com ação trabalhista pedindo a reintegração ao emprego e indenização por danos morais. O pedido foi acolhido em primeira instância, na 17ª Vara do Trabalho de Curitiba, e posteriormente confirmado pelo TRT-PR em julgamento realizado em agosto.
Argumentos e decisão
Em sua defesa, o clube afirmou que a demissão foi motivada por baixa produtividade. Contudo, segundo a relatora do caso, juíza convocada Rosiris Rodrigues de Almeida, esse argumento apenas reforçou o caráter discriminatório da dispensa.
A magistrada destacou em seu voto que a própria testemunha da empresa reconheceu a queda de desempenho do trabalhador, o que, na avaliação da relatora, decorre diretamente da doença.
“É óbvio que a baixa produtividade do reclamante, ensejadora da rescisão contratual segundo a empresa, é consequência da própria doença, que reduz significativamente a capacidade de julgamento e de tomada de decisões por parte do doente, pois acomete todo o organismo, inclusive o cérebro, impactando negativamente o status socioeconômico, a saúde mental, as relações interpessoais, a vida profissional e o bem-estar físico do indivíduo”, afirmou Almeida no acórdão.
A juíza ressaltou que, em situações como essa, a conduta esperada do empregador seria afastar o trabalhador para tratamento médico, e não promover sua dispensa.
“O empregado doente deve ser afastado do trabalho para tratamento da doença, e não demitido”, reforçou a relatora.
Diante disso, a 4ª Turma do TRT-PR manteve o entendimento da primeira instância, confirmando a reintegração do pedreiro ao emprego e condenando o clube ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais.
Contexto jurídico
A Súmula 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) presume discriminatória a dispensa de trabalhadores portadores de doenças graves que suscitam estigma ou preconceito — como HIV, câncer e dependência química —, salvo se o empregador comprovar motivo legítimo e não discriminatório para o desligamento, o que não ocorreu no caso.
Especialistas em direito trabalhista apontam que a decisão reforça o entendimento consolidado nos tribunais brasileiros de que a dependência química deve ser tratada como uma condição de saúde, e não como uma falha de caráter ou motivo para punição.
Com o julgamento, o caso retorna agora à fase de execução, mas o clube ainda pode recorrer às instâncias superiores da Justiça do Trabalho.
