PEC que propõe fim da reeleição enfrenta resistência no Senado e pode não avançar
Senadores veem risco de enfraquecimento da Casa com proposta que reduz mandato de oito para cinco anos
Por Gabriel Porta

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê o fim da reeleição para cargos do Executivo e a adoção de mandatos únicos de cinco anos enfrenta obstáculos que podem adiar sua análise no plenário do Senado. Embora o tema tenha sido inicialmente tratado como consenso no discurso público, nos bastidores há forte resistência, tanto de senadores quanto de prefeitos e vereadores, que temem os impactos eleitorais das mudanças. A informação é do Blog do Esmael.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), que chegou a sinalizar a possibilidade de votação ainda em maio, agora recua, pressionado por colegas. A proposta, além de acabar com a possibilidade de reeleição para presidente, governadores e prefeitos, também prevê a redução dos mandatos dos senadores — de oito para cinco anos — e a unificação das eleições municipais e gerais a partir de 2034.
O ponto mais sensível da PEC entre os senadores é justamente a alteração no tempo de mandato. A inclusão desse item no texto, durante análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), causou desconforto generalizado. Parlamentares de diversos partidos avaliam que igualar seus mandatos aos dos deputados — hoje de quatro anos — enfraquece o papel do Senado como Casa revisora.
Nos bastidores, há quem questione até a atratividade do cargo. “Quem vai querer se candidatar ao Senado com esse modelo?”, disparou um senador, sob reserva. A preocupação é que, ao reduzir o mandato, o Senado perca força institucional, ficando mais vulnerável à lógica da Câmara, considerada mais sujeita às oscilações e pressões momentâneas da opinião pública.
Prefeitos
Outro ponto que gera resistência é a proposta de unificar os calendários eleitorais. Prefeitos e vereadores temem perder protagonismo se suas eleições coincidirem com as disputas para presidente, governador e parlamentares. Durante a Marcha dos Prefeitos, em Brasília, lideranças municipais pressionaram congressistas a barrar a medida.
A avaliação é que, com campanhas locais misturadas às nacionais, o debate municipal ficaria ofuscado, dificultando a comunicação direta com os eleitores e favorecendo a polarização típica das eleições gerais. Dados da Confederação Nacional de Municípios (CNM) mostram que, nas eleições de 2024, o índice de reeleição de prefeitos foi de 81,9%, o que reforça o interesse dos gestores atuais em manter o modelo vigente.
Reeleição
Desde que foi aprovada em 1997, a possibilidade de reeleição se consolidou como prática no cenário político brasileiro. Levantamentos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da CNM apontam que mais de 60% dos prefeitos e governadores que tentam um segundo mandato conseguem se reeleger.
No âmbito nacional, dos presidentes eleitos desde a adoção da reeleição, apenas Jair Bolsonaro (PL), em 2022, não conseguiu um segundo mandato. Especialistas apontam que quem ocupa o cargo tem vantagens consideráveis, seja pelo uso da máquina pública, pela maior exposição na mídia ou pela realização de obras e ações de governo em períodos eleitorais.
Mudanças
Há, tanto entre governistas quanto entre opositores, um raro consenso de que o atual modelo induz governantes a priorizarem a reeleição em detrimento da gestão pública. "Os dois primeiros anos são de trabalho, os dois últimos, de campanha", resume o deputado Eunício Oliveira (MDB-CE).
Apesar disso, há forte resistência a mudanças que afetem diretamente os próprios mandatos e o funcionamento do sistema político. No Senado, parte dos parlamentares articula para retomar a proposta inicial do relator Marcelo Castro (MDB-PI), que sugeria mandatos de dez anos para senadores como uma alternativa intermediária.
A PEC que extingue a reeleição e propõe a unificação das eleições vai além de uma simples alteração nas regras eleitorais. Ela escancara um impasse estrutural entre o desejo de modernizar o sistema, tornando-o mais eficiente e menos oneroso, e a resistência natural dos atores políticos em abrir mão de vantagens já consolidadas
O futuro da proposta segue incerto no Senado. Enquanto parte dos parlamentares defende avanços, outros trabalham para frear ou, ao menos, alterar pontos considerados sensíveis. O debate está aberto, e o Brasil se vê mais uma vez diante da pergunta: haverá disposição para enfrentar uma mudança tão profunda no modelo político?
Cinco anos
Vale lembrar que, antes da instituição da reeleição em 1997, prefeitos brasileiros chegaram a cumprir mandatos de cinco anos durante o período de transição democrática, entre 1983 e 1988. Naquela época, a medida foi adotada como forma de alinhar o calendário eleitoral à convocação da Assembleia Nacional Constituinte e à promulgação da Constituição de 1988.
A experiência foi entendida como um ajuste temporário, necessário para garantir estabilidade institucional durante um momento de transformação do país. Somente em 1998, já sob o governo de Fernando Henrique Cardoso, a emenda que permite a reeleição para prefeitos, governadores e presidente entrou efetivamente em vigor.