Inovação no Judiciário: algoritmo criado por desembargador revoluciona gestão de processos no TRF1
Desembargador Eduardo Morais da Rocha conseguiu eliminar 42 mil processos em seu gabinete num espaço de pouco mais de dois anos
Por Gazeta do Paraná

Desde que entrou na magistratura como juiz federal, o desembargador Eduardo Morais da Rocha sempre se preocupou com a morosidade no andamento dos processos judiciais. Ele buscou mecanismos para dar celeridade às ações sem perder a qualidade das decisões e, após chegar ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), criou um algoritmo simples e, com planejamento, zerou, em pouco mais de dois anos, o arquivo de 42 mil processos que encontrou em seu gabinete.
“Essa crítica que é feita constantemente ao Judiciário, da demora dos processos, sempre me incomodou. Muitas vezes a pessoa entra com uma ação e não vê o resultado dela porque morre. Então, muitas vezes, os herdeiros é que vão se beneficiar daquele direito, que seria do titular, daquele determinado bem da vida que está sendo discutido. Essa morosidade judiciária foi um tema, uma questão que sempre me incomodou e, em razão disso, eu, desde que ingressei no Judiciário, me preocupava com a quantidade de processos que ingressavam”, disse em entrevista ao G-Cast, o canal da Gazeta do Paraná no YouTube.
O magistrado lembra que o Artigo 5º da Constituição Federal estabelece o princípio da duração razoável do processo, um dos pilares do devido processo legal, que deve garantir que toda pessoa tenha o direito de ver suas demandas judiciais ou administrativas resolvidas em tempo adequado. Para não deixar que o inciso se torne uma “letra morta”, ele estabeleceu um algoritmo ainda quando era juiz em Minas Gerais, que teve resultado positivo. Ao ser alçado ao TRF1, em 2022, levou o mecanismo para o Tribunal, após encontrar aproximadamente 42 mil processos.
Para implantar o trabalho no Tribunal, pequenos ajustes precisaram ser feitos, tendo em vista que, ao contrário do 1º grau, onde as decisões são monocráticas, no TRF1 são colegiadas.
“Com os pequenos ajustes que eu fiz nessa metodologia de julgamento de processos, consegui, no prazo de dois anos e meio, superar o estoque de processos que eu tinha aqui no meu gabinete”, conta o magistrado.
No início, houve resistência por parte da equipe por ser um modelo totalmente novo, mas, na sequência, a divisão de tarefas agradou os servidores, porque cada um escolheu o assunto com o qual tinha mais afinidade.
O primeiro passo foi parar o gabinete, triar e colocar todos os processos em uma planilha Excel. As matérias foram separadas por assunto, e a prioridade estabelecida pelo magistrado foi a inclusão na pauta de julgamento dos processos mais antigos. Para cada tema, foram criados códigos como “aposentadoria”, “auxílio-doença”, “remoção de servidor público”, entre outros.
A partir dessa classificação, em uma segunda etapa, cada assunto foi colocado dentro de um código específico em nova planilha, com os números de cada processo e o servidor responsável. A partir dessa triagem, foi possível saber a quantidade de processos aguardando julgamento e programar o julgamento de processos em número superior ao de novas ações. Consequentemente, mês após mês, foi possível reduzir o acervo de processos.
Hoje, os processos que chegam ao gabinete do desembargador são pautados na mesma semana.
“Eles só não são julgados na semana seguinte porque há uma previsão no CPC [Código de Processo Civil] de que os processos só podem ser julgados depois que as partes forem intimadas. E, para isso, o CPC estabelece um prazo mínimo de cinco dias úteis. Todavia, há um prazo adicional de dez dias úteis para inclusão nos prazos de todos os processos judiciais eletrônicos do PJe [Processo Judicial Eletrônico]”, observa Morais da Rocha. Mesmo assim, o julgamento pode ser considerado rápido, pois demora cerca de um mês.
O trabalho teve reconhecimento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O Conselho da Justiça Federal (CJF) vai incluir o trabalho no painel de boas práticas do Judiciário, para que possa ser replicado em outros tribunais. Hoje, menos de 2% das ações permanecem no acervo do gabinete.
Inteligência Artificial
O desembargador destaca que a Inteligência Artificial é uma ferramenta de apoio ao Judiciário, mas lembra que conseguiu zerar os processos antes de o projeto de IA estar implantado no tribunal.
“Mas eu acredito que a inteligência artificial seja um mecanismo muito, muito importante para auxiliar e assessorar nos julgamentos, mas para funcionar como um assessoramento”, observa. Ele ressalta, no entanto, que a IA precisa ser revisada por um humano, já que muitas vezes pode dar respostas alucinadas e até criar jurisprudências que não existem na legislação.
“Essa metodologia está sendo elogiada porque o julgamento é feito não só com quantidade, mas com qualidade, ou seja, havendo uma gestão eficiente. Eu acho que o grande problema no Judiciário hoje é a gestão. Esse meu algoritmo trabalha com a gestão do acervo de processos, uma gestão bem organizada, bem gerenciada”, conclui.