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Harmonização peniana: os riscos por trás da nova febre estética masculina

Procedimentos que prometem aumentar ou engrossar o pênis se popularizaram no Brasil nos últimos anos, mas especialistas alertam para os perigos e os limites da vaidade

Por Da Redação

Harmonização peniana: os riscos por trás da nova febre estética masculina Créditos: GETTY IMAGES via BBC

Jorge, morador do Distrito Federal, quase perdeu o pênis após se submeter a três procedimentos estéticos com PMMA — substância acrílica usada para preenchimentos permanentes. A decisão, motivada por propagandas que prometiam aumento peniano, resultou em complicações graves, inflamações recorrentes e risco de falência renal. Ele precisou passar por duas cirurgias para remover o material e reconstruir a região genital.

“Era como se meu corpo quisesse expulsar aquele PMMA de algum jeito”, relatou Jorge, que pediu anonimato. O caso, embora extremo, não é isolado. Médicos apontam que a chamada “harmonização peniana” tem ganhado espaço nas redes sociais e atraído cada vez mais homens em busca de mudanças estéticas — muitas vezes sem respaldo médico adequado.

O que é harmonização peniana?

O termo virou moda na internet e engloba uma série de procedimentos que prometem alterar o calibre ou o comprimento do pênis. As técnicas vão desde cirurgias mais invasivas até aplicações de substâncias como ácido hialurônico e toxina botulínica.

Segundo o cirurgião plástico Flávio Rezende, membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, há dois grandes grupos de intervenções:

Cirúrgicas: incluem liberação de ligamentos e lipoaspiração da pelve, especialmente indicadas para homens com excesso de gordura na região pubiana, que acabam com o pênis “embutido”. Além da estética, esses procedimentos podem melhorar a higiene e prevenir doenças como o câncer de pênis.

Não cirúrgicas: o destaque é o preenchimento com ácido hialurônico, substância absorvível que proporciona aspecto natural e pode ser revertida em caso de complicações. Também há quem recorra ao “escrotox”, aplicação de botox na bolsa escrotal para suavizar o aspecto enrugado — embora ainda faltem estudos científicos sobre essa técnica.

Quando esses procedimentos são indicados?

De acordo com a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), o pênis adulto tem, em média, de 8,5 a 9,5 cm em estado flácido e de 13 a 14 cm em ereção. Homens com micropênis ou que enfrentam dificuldades por conta do acúmulo de gordura na pelve podem se beneficiar das intervenções. Mas há também quem procure os procedimentos por insatisfação pessoal, mesmo estando dentro da média.

Para o urologista Ubirajara Barroso Jr., que operou Jorge, o ponto central é a autonomia do paciente. “Seria preconceito dizer que um homem não pode querer engrossar o pênis. São procedimentos de baixa complexidade que podem melhorar a autoestima”, afirma. No entanto, ele alerta que é preciso avaliar se a decisão está ligada a questões de saúde mental ou pressão estética.

Os riscos e os alertas

O uso de PMMA, como no caso de Jorge, é o exemplo mais extremo dos perigos da harmonização peniana. Por ser uma substância permanente, pode gerar reações inflamatórias graves, formação de nódulos e até necrose. Já o ácido hialurônico, embora mais seguro, também exige cuidado: deve ser aplicado por profissionais habilitados e em ambiente clínico.

Outro risco é a disseminação de informações falsas e promessas exageradas nas redes sociais. Jorge, por exemplo, foi convencido por anúncios em jornais e revistas, e só percebeu o problema anos depois. “O homem tem essa vaidade, essa coisa imbecil e estúpida”, desabafa.

Especialistas reforçam que, antes de qualquer intervenção, é fundamental buscar orientação médica, entender os limites do próprio corpo e fugir de soluções milagrosas. A harmonização peniana pode ser uma ferramenta de autoestima — mas, sem responsabilidade, vira um risco à saúde.

A popularização dos procedimentos estéticos voltados para o aumento ou engrossamento do pênis tem levantado debates importantes sobre saúde física, mental e os limites da vaidade masculina. Embora muitos homens busquem essas intervenções por motivos estéticos ou de autoestima, especialistas alertam para os riscos e para os casos em que o problema vai além da aparência.

Um dos fatores que mais preocupam os médicos é a dismorfia corporal — condição que afeta cerca de 2% da população e leva o indivíduo a ter uma percepção distorcida sobre o próprio corpo. Segundo a psiquiatra Carmita Abdo, coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, muitos homens com esse distúrbio concentram suas inseguranças justamente no tamanho ou formato do pênis.

“Esses pacientes não conseguem enxergar o órgão como ele realmente é. Mesmo após procedimentos, continuam insatisfeitos e, muitas vezes, acabam lesionando a região com intervenções repetidas”, explica Abdo. Ela reforça que, nesses casos, o tratamento ideal começa pela saúde mental, com psicoterapia e, em alguns casos, medicação.

O peso simbólico do órgão masculino

A pressão estética sobre os homens também está ligada ao valor simbólico atribuído ao pênis. “Ele é visto como sinônimo de potência, virilidade e competência”, afirma Abdo. Esse simbolismo se reflete até na forma como os pacientes buscam atendimento. O cirurgião plástico Flávio Rezende, que abriu uma clínica especializada em estética íntima masculina no Rio de Janeiro, relata que muitos homens têm vergonha de se expor.

“Agendamos as consultas com intervalo para que ninguém se encontre na sala de espera. Os atendentes são todos homens, e a maioria dos pacientes prefere se comunicar por WhatsApp, evitando ligações”, conta. Mesmo nas redes sociais, os conteúdos sobre o tema recebem muitas visualizações, mas poucas interações — o interesse existe, mas o tabu permanece.

Rezende também revela que a principal motivação dos pacientes não está ligada à performance sexual, mas à aparência do pênis em estado flácido, especialmente em situações de exposição, como vestiários. “Alguns homens relatam que o pênis reduz até quatro vezes quando flácido, o que gera desconforto em ambientes públicos”, explica.

Abdo complementa: “É como se o pênis fosse o cartão de visita do homem, um reflexo de sua potência e valor. A comparação com outros corpos, especialmente em conteúdos pornográficos, reforça essa insegurança.”

Tamanho não é tudo

Apesar da busca por um pênis maior, especialistas reforçam que o prazer sexual está mais relacionado ao conhecimento do corpo e da anatomia do parceiro. “Você não precisa ter um pênis grande e grosso para proporcionar prazer. O mais importante é saber como o corpo funciona”, afirma o urologista Fernando Facio.

Barroso Jr., também urologista, concorda: “No caso da vagina, por exemplo, o prazer está na superfície. Os procedimentos penianos não trazem ganho nesse sentido.”

A influência da pornografia também é apontada como um fator que distorce a percepção masculina. “Os atores são escolhidos por serem naturalmente avantajados, e os vídeos usam ângulos e técnicas para valorizar o órgão. Isso cria uma referência irreal”, explica Abdo. “O contato com esses conteúdos pode gerar frustração e afetar a autoestima.”

O que os procedimentos realmente oferecem

Entre as técnicas mais populares está o preenchimento com ácido hialurônico, que pode aumentar o calibre do pênis em até 3 ou 4 cm, dependendo da quantidade aplicada e da habilidade do profissional. “A cada 34 ml, é possível ganhar cerca de 1 cm de circunferência”, estima Rezende. No entanto, o produto é absorvido pelo corpo com o tempo e exige reaplicações a cada um ou dois anos.

Importante destacar que nenhuma técnica aumenta de fato o comprimento do pênis — o efeito é visual, dando a impressão de que o órgão ficou maior. E, como alertam os especialistas, os procedimentos devem ser realizados por profissionais qualificados.

“O pênis é uma estrutura complexa, com vasos, nervos e funções sexuais e urinárias. Não é como aplicar um creme no rosto”, afirma Facio. O ácido hialurônico, por exemplo, precisa ser injetado em camadas finíssimas logo abaixo da pele. Se aplicado no local errado, pode escorregar para a parede pélvica — sem causar danos — ou, no pior cenário, entrar em um vaso sanguíneo, provocando necrose ou embolia.

As injeções na bolsa escrotal também exigem cuidado. “Se perfurarem o cordão espermático, o testículo pode ser perdido, com consequências hormonais e reprodutivas”, alerta Barroso Jr.

Casos graves já foram registrados. Barroso relata ter operado um paciente que perdeu quase toda a pele da região após uma aplicação malfeita. Outro homem, que injetou produto no corpo cavernoso, perdeu completamente o pênis.

Apesar dos riscos, os especialistas reconhecem que a demanda por procedimentos estéticos na região íntima masculina é crescente. “Assim como houve um boom de próteses mamárias entre as mulheres, estamos vivendo a era do aumento peniano entre os homens”, afirma Rezende. “É uma realidade que veio para ficar.”

Com informações: BBC News

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