EUA cogitam tarifa zero em alimentos enquanto Brasil busca saída para tarifaço
Apesar da sinalização de isenção tarifária para alguns itens, o Brasil ainda não foi citado nominalmente nas possíveis exceções
Por Da Redação

Enquanto o Brasil corre contra o tempo para tentar evitar a entrada em vigor de um tarifaço anunciado pelos Estados Unidos, o governo norte-americano estuda flexibilizar a taxação para determinados alimentos. Segundo o secretário de Comércio, Howard Lutnick, o presidente Donald Trump está considerando aplicar tarifa zero para produtos que não são cultivados em solo americano, caso de itens como café, cacau, manga e abacaxi.
“Se você cultivar algo e nós não cultivarmos, isso pode chegar a zero”, disse Lutnick em entrevista à CNBC. Ele destacou que, caso haja acordos bilaterais, alimentos classificados como recursos naturais poderão ser isentados da taxação. A medida está sendo avaliada em meio à reformulação de políticas comerciais dos Estados Unidos com diversos países, exceto a China, que tem uma negociação separada.
Apesar da sinalização de isenção tarifária para alguns itens, o Brasil ainda não foi citado nominalmente nas possíveis exceções. Hoje, o país é um dos principais fornecedores de café para os EUA, responsável por cerca de 33% de todo o consumo americano, segundo o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil, além de ter grande participação na exportação de laranja, cacau e frutas tropicais.
A indefinição preocupa o governo brasileiro, que intensificou nos últimos dias seus esforços diplomáticos. Na segunda-feira (28), o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, conversou diretamente com o secretário Lutnick para tentar destravar o impasse. Fontes do Planalto apontam que Alckmin tem reforçado a estratégia de dissociar questões políticas das econômicas, concentrando-se exclusivamente no debate sobre as tarifas.
Ainda segundo o governo, a expectativa é de que Donald Trump dê a palavra final até esta sexta-feira (1º), prazo definido pela administração americana para a conclusão dos novos acordos comerciais. Para os países com os quais não houver entendimento, a taxação deve variar entre 15% e 20%, mas o Brasil pode ser penalizado com alíquota de até 50%, reflexo do distanciamento político entre os dois governos.
Risco de tensão
A diplomacia brasileira, no entanto, caminha com cautela. No Itamaraty, a avaliação é que qualquer contato direto entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump deve ser previamente articulado por emissários, evitando improvisos. A preocupação é de que um telefonema sem alinhamento possa resultar em episódios constrangedores.
Exemplos recentes reforçam o temor. Em conversas com os presidentes da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, e da África do Sul, Cyril Ramaphosa, Trump adotou tom agressivo e até apresentou conteúdos sem comprovação, como supostos vídeos de “genocídio branco” na África do Sul. Parte da comitiva brasileira que está em Washington acredita que um telefonema bem conduzido poderia destravar as negociações, mas há um consenso de que ele só deve ocorrer com garantias diplomáticas.
China acena
Em meio à tensão com os Estados Unidos, a China tem se aproximado do Brasil como alternativa comercial. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês, Guo Jiakun, afirmou que o país está pronto para ampliar a cooperação com o Brasil e outros integrantes do Brics. A proposta é reforçar a defesa do sistema multilateral de comércio e abrir espaço para produtos brasileiros que enfrentarem barreiras nos EUA.
Jiakun destacou ainda a possibilidade de abertura do mercado chinês para aeronaves da Embraer, que projeta forte impacto com o tarifaço norte-americano. Atualmente, 52% das encomendas da fabricante brasileira são destinadas a companhias dos Estados Unidos. A expectativa da empresa é de um prejuízo bilionário e efeitos sobre o emprego comparáveis aos enfrentados durante a pandemia de Covid-19.
“A China valoriza a cooperação com o Brasil em setores como o aeroespacial e está disposta a promovê-la com base em princípios de mercado, contribuindo para o desenvolvimento de ambos os países”, afirmou o porta-voz.
Venezuela volta atrás
Outro episódio recente ilustra as instabilidades comerciais que o Brasil tem enfrentado. Após surpreender exportadores com a imposição de tarifas de até 77% sobre produtos brasileiros, a Venezuela recuou da medida na segunda-feira (28). A mudança havia sido implementada sem aviso prévio e gerou reação imediata do governo federal, que acionou o Itamaraty e a embaixada brasileira em Caracas.
A reversão foi comemorada especialmente em Roraima, principal estado exportador para o país vizinho. “A Venezuela é o principal destino das exportações roraimenses. Essa taxação poderia prejudicar fortemente o comércio transfronteiriço, afetando empregos, renda e arrecadação”, afirmou o governador Antonio Denarium (PP).
Segundo Eduardo Oestreicher, coordenador de negócios internacionais do estado, as cargas já voltaram a ser isentas conforme o acordo de 2012 entre os dois países, que previa benefícios tributários para produtos com certificado de origem.
