Dívidas do antigo Hospital Santa Catarina ultrapassam R$20 milhões
Crise no setor de saúde: antigas dívidas do Hospital Santa Catarina ultrapassam R$ 23 milhões, deixando trabalhadores sem pagamento
A Gazeta traz à tona um tema que, embora não esteja completamente esquecido, possui uma cronologia complexa e difícil de compreender. Nesse enredo de dívidas, falências, insucessos e leilões, os maiores prejudicados foram, sem dúvida, os trabalhadores.
O assunto em pauta é o antigo Hospital Santa Catarina e as dívidas trabalhistas e previdenciárias deixadas aos trabalhadores. É importante lembrar que muitos trabalhadores ainda não receberam os valores previstos nos acordos firmados com o hospital. De acordo com informações da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, os números impressionam: R$ 17 milhões em dívidas previdenciárias; R$ 3 milhões em outros débitos; R$ 763 mil em multas trabalhistas; R$ 2 milhões em dívidas de FGTS. No total, a dívida ultrapassa os R$ 23 milhões. A grande questão permanece: quem será responsável por pagar essa conta?
Um dos nomes que surgem é o de Rogério Lunardelli. Em março de 2017, ele comprou, em leilão judicial, o prédio do antigo Hospital Santa Catarina, que ele próprio havia arrendado alguns anos antes e transformado no Hospital Jacomo Lunardelli. No entanto, o hospital acabou fechando poucos meses depois. O problema é que Lunardelli não efetuou o depósito de R$ 2,5 milhões, valor do arremate. Com isso, o prédio passou para o segundo colocado nos lances, Rogério Festugatto. Em dezembro de 2017, o prefeito Leonaldo Paranhos assinou um decreto desapropriando a área. A avaliação judicial definiu um valor de R$ 8,5 milhões, e o hospital se tornou um bem público. Atualmente, o prédio abriga o Hospital de Retaguarda Allan Brame Pinho.
Nossa equipe entrou em contato com o Sindicato dos Trabalhadores da Saúde de Cascavel (Sindesauvel) para obter esclarecimentos sobre o caso, mas fomos informados que a presidente do sindicato, Dalva Maria Selzler, e o advogado do sindicato estão participando de um congresso em Brasília. O sindicato afirmou que, assim que retornarem, responderão às perguntas na medida do possível. A Gazeta encaminhou os seguintes questionamentos ao sindicato: O sindicato tem conhecimento de quais medidas foram ou estão sendo tomadas para assegurar o pagamento dessas dívidas? Há ações judiciais em andamento para cobrar os valores devidos? Se sim, em que estágio estão? Quantos trabalhadores foram diretamente afetados pelas dívidas deixadas pelo Hospital Santa Catarina? O sindicato já entrou em contato com os responsáveis pela administração do hospital para buscar uma solução? Como o sindicato está orientando os trabalhadores prejudicados a procederem nesse caso? O sindicato acredita que o patrimônio do hospital ou de seus responsáveis é suficiente para quitar os débitos?
Quanto a Rogério Lunardelli, pode-se dizer que ele sumiu após outro fracasso no setor de saúde em Cascavel. Esse episódio ocorreu quando foi anunciada a venda do Hospital Nossa Senhora da Salete, também conhecido como Hospital do Coração, para um grupo empresarial de São Paulo. Desde 2017, o Hospital do Coração enfrentava sérios problemas financeiros: deixou de pagar credores, suspendeu alguns atendimentos e, mais recentemente, cardiologistas pararam de prestar serviços devido à falta de pagamento. Na época, uma ação movida pelo Ministério Público afirmou que a “falta de seriedade e transparência permeava” os negócios de Lunardelli. Segundo o MP, isso “contaminou” os serviços prestados pelo Hospital do Coração.
Recuperação Judicial e fim
Em fevereiro de 2013, o Hospital e Maternidade Santa Catarina Ltda. entrou com um pedido de recuperação judicial devido à grave situação financeira que enfrentava. A medida buscava assegurar o pagamento de dívidas e evitar a falência da instituição. No entanto, o processo não obteve sucesso, e a falência foi oficialmente decretada pela juíza Lia Sara Tedesco.
As atividades do hospital foram encerradas em junho de 2013 por determinação da Vigilância Sanitária, que identificou problemas relacionados às condições do local. Pouco depois, em agosto do mesmo ano, a Central Médica Cascavel (CMC) Ltda., administradora do Hospital Nossa Senhora da Salete, demonstrou interesse em reformar o prédio e retomar os atendimentos. Porém, a juíza responsável pelo caso relatou que o antigo administrador do hospital não foi localizado após o arrendamento, dificultando a condução do processo.
Com o hospital fechado há meses, sem operar internações, cirurgias ou UTIs, e funcionando apenas para consultas médicas, a Justiça concluiu que não era possível manter a empresa ou preservar sua função social. Informações sobre empregos estavam indisponíveis, e diversas ações trabalhistas haviam sido perdidas nos dois anos anteriores.
O decreto de falência teve efeito retroativo a maio de 2013. O responsável pela empresa foi intimado a apresentar documentos financeiros, listar bens e contas bancárias, e fornecer uma relação detalhada de credores.
Após enfrentar desafios com a Vigilância Sanitária, dez leitos foram liberados para atendimento em março de 2014, sob a administração do Hospital Jácomo Lunardelli. Embora o hospital estivesse oficialmente falido, a continuidade parcial das atividades foi autorizada para gerar uma receita mensal de R$ 20 mil, destinada à quitação das dívidas.
Leilão
Quase dois anos depois, em março de 2015, o patrimônio do Hospital Santa Catarina foi levado a leilão. Os equipamentos e 65% dos direitos sobre o imóvel foram vendidos como uma forma de gerar recursos para o pagamento de credores, incluindo ex-funcionários e fornecedores. À época, somente as dívidas trabalhistas somavam R$ 6,9 milhões.
O imóvel foi arrematado por R$ 2,55 milhões por Renato Fertugato, que já possuía 35% dos direitos sobre a propriedade. Mesmo com o depósito do valor do arremate, isso não significou o início imediato dos pagamentos das dívidas, deixando os credores em suspense.
Após o leilão, surgiram controvérsias envolvendo o Hospital Jácomo Lunardelli. Apesar de promessas de reabertura com 30 leitos para pacientes do SUS, a operação nunca se consolidou. Houve anúncios e expectativas sobre o retorno do hospital, mas o Estado não firmou convênio com o administrador, o empresário Rogério Lunardelli. Além disso, a ocupação dos leitos para aliviar a demanda das UPAs nunca se concretizou, e apenas alguns pacientes chegaram a ser atendidos após os anúncios.
Uma declaração do empresário Renato Festugato, que havia feito a segunda maior oferta no leilão, trouxe outra dúvida: quem, de fato, era o proprietário do antigo Hospital Santa Catarina? Como Rogério Lunardelli não efetuou o pagamento de R$ 2,5 milhões referente ao arremate, Festugato foi convidado pelo Juízo a assumir a compra, tornando-se o novo dono do imóvel.
Festugato expressou interesse em reativar o hospital e, inicialmente, buscou parcerias com o município e o Estado. Contudo, sem apoio, ele chegou a considerar alugar o prédio para a prefeitura. Apesar dos esforços dos empresários, o que realmente importava para a sociedade era a reabertura do hospital, que não se concretizou, deixando a população na época sem acesso ao atendimento que tanto necessitava.