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Atraso na fala infantil: como identificar os sinais e quando buscar ajuda profissional

Especialista alerta para a importância do diagnóstico precoce e do estímulo adequado no desenvolvimento da linguagem

Por Da Redação

Atraso na fala infantil: como identificar os sinais e quando buscar ajuda profissional Créditos: Reprodução Internet

Nos primeiros meses de vida, cada som emitido por um bebê é motivo de celebração. O balbucio vira música para os pais, e as primeiras palavras são recebidas como conquistas. Por volta de um ano, expressões como “mamãe” ou “papai” já fazem parte do repertório. Mas quando o tempo passa e essas palavras não evoluem para frases simples, como “quero água” ou “cadê o brinquedo?”, o silêncio pode se tornar um sinal de alerta.

O atraso na fala infantil é uma condição que afeta cerca de 12% das crianças brasileiras, segundo pesquisa do Ministério da Saúde. Embora cada criança tenha seu próprio ritmo de desenvolvimento, pais e responsáveis devem estar atentos a sinais que podem indicar a necessidade de intervenção profissional. A ausência de palavras por volta dos dois anos ou a dificuldade em formar frases após os três são alguns dos indícios mais comuns de que algo não está evoluindo como esperado.

Para entender melhor o tema, a reportagem da Gazeta do Paraná entrevistou o fonoaudiólogo Simon Wajntraub, especialista em Comunicação e Oratória, que atua há mais de duas décadas com crianças em fase de aquisição da linguagem. Segundo ele, o principal sinal de alerta é quando a criança, entre 1 ano e meio e 2 anos, ainda não começou a falar ou se comunica de forma muito limitada. “Na maioria dos casos que atendo, a causa não é orgânica ou neurológica, mas sim relacionada ao ambiente em que a criança está sendo criada”, explica.

Segundo a Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia, há parâmetros mínimos que ajudam a identificar se a criança está evoluindo dentro do esperado. Aos nove meses, ela deve produzir balbucios variados; aos 18 meses, já é esperado que tenha um vocabulário com pelo menos dez palavras com significado; e até os dois anos, deve ser capaz de formar frases simples, como “quero água” ou “pega bola”.
Simon aponta que fatores como o uso excessivo de telas, a falta de interação com outras crianças e a ausência de estímulo verbal em casa são determinantes. “Crianças que dormem no quarto dos pais por muito tempo, que mamam até os 3 ou 4 anos, que recebem tudo o que pedem apenas apontando, acabam tendo menos necessidade de falar. Isso reduz o impulso natural de se comunicar”, afirma.

Outro ponto de atenção é o momento de buscar ajuda médica. O especialista recomenda que os pais procurem orientação profissional assim que perceberem que a criança está demorando para falar. “O esperado é que, até 1 ano e meio, ela já esteja começando a dizer palavras simples como ‘mamãe’ e ‘papai’. Se isso não acontece, é importante investigar”, alerta.

Simon também chama atenção para o risco de diagnósticos precipitados. “Hoje em dia, há uma tendência de rotular muitas crianças como autistas sem o devido diagnóstico, e isso me preocupa bastante. Já atendi muitos casos em que a criança foi levada com suspeita de autismo, mas, na verdade, apresentava apenas atraso na fala por questões comportamentais e ambientais”, relata.
Segundo ele, criações com excesso de repressão ou de mimo podem prejudicar o desenvolvimento da linguagem. “A criança que vive com medo dos pais, ou que é excessivamente protegida, tende a ter menos iniciativa para se comunicar. Além disso, quando dorme no quarto dos pais, isso pode afetar tanto o desenvolvimento dela quanto a dinâmica familiar”, observa.

Diagnóstico precoce faz toda a diferença

O diagnóstico precoce é considerado essencial para garantir o desenvolvimento adequado da fala. “Já atendi casos em que a criança chegou aos cinco anos sem falar, simplesmente por falta de estímulo em casa”, conta Simon. Ele reforça que o ambiente familiar precisa ser comunicativo e acolhedor. “Se os pais não falam ou vivem isolados em telas, a criança tende a repetir esse padrão. Estimular a fala começa dentro de casa, com interação e afeto.”

A convivência escolar também é apontada como fator positivo. “Muitos pais acreditam que manter a criança em casa até os cinco ou seis anos é o ideal, mas a convivência escolar desde o maternal ou jardim de infância é extremamente benéfica”, afirma.
Além disso, o especialista alerta para o cuidado com os chamados “erros fofos” de fala. “Quando a criança troca letras ou fala com a língua para fora, por exemplo, os pais devem orientar de forma adequada, sem reforçar o erro como se fosse uma gracinha. Isso pode atrasar ainda mais o desenvolvimento da linguagem.”

Técnicas e terapias para estimular a fala

No tratamento do atraso na fala, Simon utiliza uma série de técnicas que têm como base o estímulo contínuo e personalizado da linguagem. Uma das estratégias é a criação de gravações narradas com a rotina da própria criança, como acordar, tomar café ou ir à escola, e o incentivo para que ela repita frases simples. “Essas gravações podem ser ouvidas em casa, no carro, ou onde for conveniente, sempre com um fundo musical que a criança goste, o que aumenta o engajamento”, explica.

O uso de vídeos, músicas e atividades visuais também faz parte do processo. “Filmo a criança falando e depois comparo com a forma correta de pronúncia, para que ela perceba e aprenda. Isso transforma o aprendizado em algo divertido e eficaz”, diz.
Simon também orienta os pais a tomarem atitudes práticas no dia a dia. “Evitar deixar a criança apenas em casa com cuidadores que não oferecem estímulo verbal e, se possível, matriculá-la em creches ou escolas que promovam a socialização e o uso ativo da linguagem. O convívio com outras crianças e a rotina escolar contribuem muito para o desenvolvimento da fala.”

Em casos de troca de letras como “P” por “B” ou “F” por “V” o especialista trabalha com gravações e vídeos específicos para corrigir esses padrões, sempre com muita interação e paciência. “As crianças respondem muito bem ao uso de recursos audiovisuais. Quando o estímulo é feito com afeto e criatividade, o progresso é notável”, conclui.

O impacto das telas no desenvolvimento da fala

Um dos fatores de risco que mais preocupa os profissionais da saúde infantil é o uso excessivo de telas. Uma pesquisa da Universidade de Toronto revelou que apenas 30 minutos diários de exposição a dispositivos eletrônicos já aumentam em 49% as chances de atraso na fala. Já um estudo publicado no Journal of Psychiatric Research, com mais de 28 mil crianças em idade pré-escolar, apontou que duas ou mais horas por dia de uso de telas dobram o risco de dificuldades de linguagem e aprendizagem.

A explicação está na redução da interação verbal e social que ocorre quando a criança passa muito tempo diante de telas. Sem estímulo direto, como conversas, brincadeiras e contato com outras crianças, o cérebro perde oportunidades valiosas de desenvolver conexões neurais ligadas à comunicação.

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