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Reforma Administrativa pode proibir aposentadoria compulsória como punição a juízes e promotores

A proposta do relator é que, no lugar da aposentadoria remunerada, seja instituído o Processo Administrativo Disciplinar com possibilidade de demissão sem remuneração

Por Da Redação

Reforma Administrativa pode proibir aposentadoria compulsória como punição a juízes e promotores Créditos: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

A proposta de Reforma Administrativa que será apresentada na Câmara dos Deputados nos próximos dias pode trazer uma das mudanças mais polêmicas relacionadas ao funcionalismo público: o fim da aposentadoria compulsória como forma de punição a juízes e promotores. O relator do texto, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), pretende incluir no projeto a possibilidade de demissão desses profissionais por meio de processo administrativo disciplinar, substituindo a prática atualmente considerada uma das mais brandas do Judiciário.

Pelas regras em vigor, magistrados e membros do Ministério Público, após adquirirem a vitaliciedade, só perdem o cargo por decisão judicial transitada em julgado. Na prática, quando cometem irregularidades, a sanção mais grave que recebem no âmbito administrativo é a aposentadoria compulsória, determinada pelos tribunais em que atuam ou pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Com isso, mesmo afastados da função, continuam a receber os vencimentos.

Pedro Paulo critica a medida, que classifica como “um prêmio para quem comete má conduta”. Segundo ele, a intenção é corrigir um desvio que mina a credibilidade do sistema disciplinar. “Hoje, se um juiz rouba e é condenado, sua punição é uma aposentadoria compulsória com vencimentos elevados. Não tem razão para ser assim, essa punição é praticamente um prêmio”, afirmou o deputado.

A proposta do relator é que, no lugar da aposentadoria remunerada, seja instituído o Processo Administrativo Disciplinar (PAD) conduzido por colegiados do CNJ ou do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), com possibilidade de demissão sem remuneração, garantindo o direito à defesa e ao contraditório.

Dados obtidos pela ONG Fiquem Sabendo junto ao CNJ mostram que, entre 2008 e abril de 2024, 135 magistrados foram punidos no país, e a maioria, 59%, recebeu a aposentadoria compulsória. Nenhum foi demitido. O levantamento reforça os argumentos do relator de que a atual legislação gera distorções na responsabilização de magistrados e membros do MP.

Redução de privilégios

O dispositivo que trata da aposentadoria está inserido no eixo de “combate a privilégios” da Reforma Administrativa. O texto reunirá cerca de 70 medidas em quatro blocos principais: estratégia, governança e gestão; transformação digital; profissionalização do serviço público; e redução de privilégios.

Entre os outros pontos, estão a vedação de férias acima de 30 dias, juízes e promotores atualmente têm direito a 60 dias por ano, o fim da concessão de adicionais de férias superiores a um terço do salário, limites mais rígidos para verbas indenizatórias e a fixação de um teto de gastos para esses benefícios, com base nas despesas de 2020 corrigidas pela inflação.

O projeto também pretende impedir que vantagens concedidas a determinadas carreiras sejam estendidas a outras por meio de argumentos de simetria ou paridade constitucional, prática que tem inflado gastos públicos.

CNJ e CNMP

Outra medida do relatório deve estabelecer prazos de desincompatibilização de seis meses a um ano para que dirigentes de associações de classe possam concorrer a vagas nos conselhos que supervisionam o Judiciário e o Ministério Público. O objetivo é evitar conflitos de interesse nesses órgãos, que são responsáveis por fiscalizar benefícios e aplicar sanções disciplinares.

“CNJ e CNMP estipulam medidas correcionais, não deveriam ter a predominância de interesses corporativistas”, argumenta Pedro Paulo.

Teto salarial

Um dos alvos da proposta é também a limitação da chamada “profusão de verbas indenizatórias”, frequentemente usadas para ultrapassar o teto constitucional, atualmente fixado em R$ 46.366,19 (equivalente ao salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal). A ideia é definir em lei o que pode ser considerado verba indenizatória e, ainda, estabelecer um teto de gastos para esses benefícios.

Além disso, a reforma prevê que o teto seja aplicado também a funcionários de estatais não dependentes, como BNDES e Caixa Econômica Federal, cujos salários frequentemente superam os limites constitucionais.

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), já anunciou a realização de uma comissão geral para debater a reforma administrativa, ressaltando que o tema é prioridade da Casa. “O Brasil precisa de coragem para enfrentar suas verdades. E uma delas é inescapável: o Estado brasileiro não está funcionando na velocidade da sociedade”, disse.

Segundo Motta, a reforma busca corrigir distorções, reduzir privilégios e dar mais transparência ao serviço prestado à população. “A cada dia, a vida real cobra mais do que a máquina pública consegue entregar. E quando o Estado falha, é o cidadão quem paga a conta”, afirmou.

O texto da reforma, segundo o relator, terá impacto simbólico importante ao atacar privilégios historicamente preservados por carreiras de Estado. O fim da aposentadoria compulsória como forma de punição administrativa máxima promete ser um dos pontos mais discutidos. A mudança dependerá de apoio político para ser aprovada, já que atinge diretamente magistrados e membros do MP, categorias de forte influência institucional.

Com a apresentação prevista para a próxima semana, o debate sobre a reforma administrativa deve ganhar centralidade na Câmara. Para defensores das mudanças, trata-se de uma oportunidade de modernizar o serviço público e aproximá-lo das expectativas da sociedade. Para críticos, no entanto, a proposta pode enfrentar resistência de setores que veem risco de enfraquecimento das garantias de independência funcional.

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