Drymaeus magus foi originalmente descrito no Testacea fluviatilia, tratado elaborado pelo naturalista Johann Baptist von Spix após expedição pelo Brasil entre 1817 e 1820. O objetivo era descrever as novas espécies de moluscos terrestres e de água doce encontradas, mas o pesquisador faleceu em 1826 e deixou seu trabalho inacabado. Em 1827, o tratado foi concluído pelo historiador natural Moritz Wagner, que alterou e reinterpretou algumas das espécies propostas por Spix. A descrição oficial foi baseada em uma concha vazia, fornecendo apenas informações sobre cor, perfil das espirais e morfologia, e a localidade-tipo (local geográfico onde foi coletado o exemplar-tipo) da espécie foi determinada como Maranhão e Piauí.
Posteriormente, em 1898, o malacólogo (especialista em malacologia, ramo da zoologia que estuda os moluscos) americano Henry Augustus Pilsbry citou D. Magus como a espécie “há muito tempo perdida de Wagner”. Ele renovou a descrição original com base em uma nova concha coletada em São Paulo: Pilsbry percebeu que a espécie era semelhante ao Drymaeus papyraceus, e o registrou informalmente desta forma.
“O D. papyraceus era uma espécie muito parecida e muito mais bem documentada na literatura”, reflete Daniel Cavallari, coautor do estudo e mestre em Sistemática, Taxonomia Animal e Biodiversidade pelo Museu de Zoologia (MZ) da USP. Após esta inovação, nenhum outro espécime foi coletado nas localidades-tipo, e poucos registros em São Paulo e Minas Gerais surgiram ao longo dos anos.
Segundo os cientistas, a taxonomia do gênero Drymaeus foi prejudicada por alguns empecilhos: suas espécies são frequentemente distinguidas apenas com base nas conchas, e não há dados genéticos para descrevê-las. “Existe uma diversidade muito grande de moluscos, muito maior do que de mamíferos ou de aves”, comenta Rafael. “Há poucos pesquisadores em caracóis terrestres no Brasil, e sabe-se muito pouco a respeito da anatomia para além da concha.” Algumas espécies têm conchas muito semelhantes, propiciando erros se a identificação não for acompanhada de um espécime vivo.
Por meio de recursos modernos, como a tomografia computadorizada, os pesquisadores consolidam traços específicos do caracol-mago na literatura. Comparado a D. papyraceus, seu tamanho é um pouco menor e sua coloração corporal é mais camuflada em ambientes escuros.
Para construir a filogenia da espécie, os pesquisadores utilizaram o sequenciamento de DNA tendo como base marcadores moleculares (ou o DNA barcoding). Esse método é capaz de diferenciar espécies e identificar organismos vivos através de “códigos de barra”, gerados pela combinação entre as bases de nucleotídeos.
Os pesquisadores descobriram que há dois morfos diferentes para a espécie em questão. O morfo típico é maior, tem uma concha mais opaca e manchas escuras contínuas, enquanto o morfo secundário tem coloração mais intensa, manchas descontínuas e um umbigo avermelhado. Entretanto, o barcoding de ambos os exemplares foi quase idêntico, indicando que ocorre um fluxo gênico entre duas populações de uma mesma espécie. “Muitas espécies são descritas com base em diferenças óbvias de aparência”, diz Daniel. “Sem as ferramentas atuais, a chance de detectar um morfotipo diferente e descrevê-lo com outra espécie era muito grande.”
Rafael também explica que a descrição original tinha problemas em relação à localização, o que pode ter gerado dúvidas e dificuldades na identificação. Agora é possível afirmar que o D. magus tem mais afinidade com áreas da Mata Atlântica e Cerrado do Sudeste, caracterizadas por florestas semidecíduas sazonais, savanas e zonas de transição.