Afinal, Bolsonaro pode ou não ser anistiado?
Ex-presidente foi condenado à mais de 27 anos de prisão por tentativa ds golpe
Por Da Redação

Na esteira da condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a 27 anos e 3 meses de prisão por tentativa de golpe de Estado, o Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou um entendimento crucial: não cabe anistia nem indulto para crimes cometidos contra a ordem constitucional e o Estado Democrático de Direito. Apesar da sinalização firme da Corte, parlamentares da oposição intensificam articulações no Congresso Nacional para aprovar uma lei de anistia que possa beneficiar Bolsonaro e aliados.
O julgamento, conduzido pela Primeira Turma do STF, teve como relator o ministro Alexandre de Moraes. Na ocasião, Moraes destacou que os ataques à democracia, como os perpetrados na tentativa de impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), “não podem ser tratados como delitos comuns”. Para o ministro, a própria Constituição exige uma resposta firme do Estado diante de ameaças à sua integridade.
“Trata-se de uma autodefesa da Constituição. Não se pode admitir que ela seja rasgada por dentro, e que, depois, se tente perdoar esse ato como se fosse um crime menor”, disse Moraes durante o voto.
O ministro Flávio Dino também foi categórico. Em seu posicionamento, lembrou que o próprio plenário do STF já fixou entendimento sobre a impossibilidade de concessão de indulto ou anistia para crimes que atentam contra o regime democrático. “Esses crimes já foram declarados pelo plenário do Supremo Tribunal Federal como insuscetíveis de indulto e anistia”, afirmou.
Entendimento consolidado
Embora a Constituição Federal de 1988 não contenha um dispositivo claro e direto que proíba a anistia para crimes contra a democracia, ela classifica a ação de grupos armados contra a ordem constitucional como imprescritível. Isso significa que esses crimes podem ser punidos a qualquer tempo, independentemente da passagem dos anos. Para especialistas, essa característica reforça a gravidade dos delitos e, por consequência, torna incoerente qualquer tentativa de perdão institucional.
Indulto e anistia
No debate jurídico, é importante distinguir dois instrumentos comumente confundidos: o indulto e a anistia. O indulto é o perdão individual, concedido diretamente pelo presidente da República. Já a anistia é um perdão coletivo, aprovado por lei no Congresso Nacional.
O STF já havia tratado da questão durante o julgamento do indulto concedido ao ex-deputado Daniel Silveira, aliado de Bolsonaro. Naquele caso, a Corte reafirmou que nem mesmo o presidente da República pode conceder perdão para crimes que atacam os pilares do Estado Democrático de Direito.
Pressão no Congresso
Apesar do entendimento consolidado no STF, parlamentares da oposição insistem em uma articulação política para aprovar uma lei de anistia que incluiria Bolsonaro e demais condenados pela trama golpista. Eles argumentam que as penas são desproporcionais e que o Congresso tem a competência legislativa para promover o perdão coletivo.
O tema promete monopolizar os debates em Brasília na próxima semana. O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), tem resistido à pressão e evitado pautar o projeto. Já o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), é contrário à anistia ampla e defende uma proposta mais restrita, voltada apenas para manifestantes condenados pelos atos de vandalismo de 8 de janeiro de 2023 — o que, na prática, exclui Bolsonaro.
No entanto, mesmo que uma eventual lei de anistia fosse aprovada pelo Congresso, ela poderia ser imediatamente questionada no STF e, com base no entendimento já consolidado, declarada inconstitucional.
Prisão domiciliar
Após a condenação, a defesa de Jair Bolsonaro prepara um pedido para que ele possa cumprir a pena em regime de prisão domiciliar, alegando problemas de saúde decorrentes da facada sofrida durante a campanha presidencial de 2018. O pedido se baseia em sintomas progressivos e um histórico recente do ex-presidente, que poderiam configurar um quadro de vulnerabilidade.
O ministro Alexandre de Moraes, que tem analisado casos semelhantes, já sinalizou anteriormente em outros processos que considera admissível a prisão domiciliar por motivos humanitários. Atualmente, Bolsonaro cumpre prisão preventiva domiciliar em outro processo, após violar medidas cautelares impostas pelo STF.
O professor de Direito Penal Thiago Bottino, da FGV-Rio, considera provável que o pedido seja aceito. “Ele já tem mais de 70 anos e um histórico médico considerável, com múltiplas cirurgias. A defesa não terá dificuldade em demonstrar a necessidade de cumprir pena em casa. Afinal, a prisão domiciliar ainda é uma privação de liberdade, mas deve preservar a vida e a integridade do condenado”, afirma.
