Ponto 14

Ex-vereadora que falsificava lista de crianças vulneráveis é condenada a 18 anos de prisão

Listas de crianças atendidas eram falsificadas, ampliando o número de beneficiários fictícios e aumentando os valores repassados pelo município

Por Bruno Rodrigo

Ex-vereadora que falsificava lista de crianças vulneráveis é condenada a 18 anos de prisão Créditos: Câmara de Vereadores de São Miguel do Iguaçu

A ex-vereadora de São Miguel do Iguaçu, no oeste do Paraná, Flávia Dartora, foi condenada a 18 anos, 2 meses e 12 dias de prisão em regime inicialmente fechado por uma série de crimes ligados a fraudes em contratos públicos. A sentença, divulgada recentemente, é um desdobramento da Operação WO, conduzida pelo Ministério Público do Paraná (MPPR). Além da ex-vereadora, o marido dela e outras quatro pessoas também foram condenados por envolvimento no esquema.

As investigações da Operação WO tiveram início em 2019, quando foi desvendado um esquema criminoso que envolvia a constituição e administração de empresas de fachada por Flávia Dartora e seu marido, André Fernandes. Segundo o MP, essas empresas eram contratadas pela Prefeitura de São Miguel do Iguaçu para prestar serviços de assistência social, mas as contratações eram fraudulentas, e os valores desviados alimentavam o enriquecimento ilícito do casal.

Uma das empresas administradas por meio de “laranjas” era responsável por prestar serviços de convivência e fortalecimento de vínculos para crianças em situação de vulnerabilidade social. No entanto, as listas de crianças atendidas eram falsificadas, ampliando o número de beneficiários fictícios e aumentando os valores repassados pelo município. Em 2019, mais de R$ 120 mil foram desviados por meio do esquema.

O MP detalhou que os recursos eram repassados ao casal em espécie e posteriormente usados para custear despesas pessoais, como serviços de manutenção de piscina, compra de roupas e pagamento de funcionários domésticos. Essas movimentações financeiras tinham o objetivo de disfarçar a origem ilícita do dinheiro, dificultando sua rastreabilidade.

Ainda em 2019, a Justiça determinou o afastamento de Flávia do cargo de vereadora por seis meses. A decisão também impôs o uso de tornozeleira eletrônica e uma multa de quase R$ 100 mil. Na época, o MP denunciou a ex-vereadora e seu marido como os líderes de uma organização criminosa que, além de fraudar licitações, utilizava os recursos públicos desviados para custear despesas pessoais e realizar depósitos destinados ao partido político da então vereadora.

Após a decisão judicial de afastamento, a Câmara Municipal de São Miguel do Iguaçu informou que não havia sido oficialmente notificada. A defesa de Flávia Dartora e André Fernandes optou por não se manifestar na época.

Na sentença proferida, Flávia Dartora foi condenada pelos crimes de organização criminosa, associação criminosa, falsidade ideológica, peculato, fraude à licitação, lavagem de dinheiro, coação no curso do processo e uso de documento falso. A pena do marido dela, André Fernandes, foi fixada em 17 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão, também em regime fechado.

Os outros quatro réus também receberam sentenças de privação de liberdade, variando conforme o grau de envolvimento no esquema. Uma das envolvidas, que realizou colaboração premiada, teve a pena inicial de 16 anos reduzida para três anos em regime aberto diferenciado. Outros dois réus foram sentenciados a quatro anos e dois meses em regime semiaberto e um ano de reclusão, respectivamente, sendo este último convertido em prestação de serviços comunitários.

O juiz destacou na sentença a gravidade dos crimes, que comprometeram serviços destinados a crianças vulneráveis e prejudicaram a confiança pública nas instituições municipais. “Os atos praticados pelos réus demonstram total desrespeito aos princípios que regem a administração pública, como a moralidade e a transparência, além de representarem um grave atentado ao interesse coletivo.”

Indenização

Além das penas privativas de liberdade, os condenados foram obrigados a pagar multas e indenizações por danos morais. Flávia Dartora deverá desembolsar R$ 30 mil, enquanto seu marido pagará R$ 50 mil. Outros valores de indenizações foram fixados em R$ 20 mil e R$ 10 mil para outros réus.

Os desvios financeiros causaram prejuízos não apenas financeiros, mas também sociais, afetando diretamente os programas de assistência que deveriam beneficiar a população mais vulnerável do município. Segundo o MP, os valores desviados também foram usados para a aquisição de bens de luxo e a sustentação de um padrão de vida incompatível com a renda declarada pelo casal.

As investigações também apontaram o envolvimento do grupo em um esquema paralelo relacionado ao enriquecimento ilícito por meio de uma pedreira, o que originou uma segunda ação penal que ainda tramita na Justiça.

Embora a sentença seja a primeira condenação judicial do caso, cabe recurso por parte dos réus. O processo segue em segredo de Justiça, e os nomes dos outros envolvidos não foram divulgados.

A condenação de Flávia Dartora marca um desfecho significativo para as investigações iniciadas em 2019, revelando um esquema que causou prejuízos financeiros ao município e impactou diretamente os serviços destinados à população mais vulnerável de São Miguel do Iguaçu. “É uma decisão que reafirma o compromisso do Judiciário em combater a corrupção e preservar os recursos públicos”, afirmou o promotor responsável pelo caso.