Projeto que permite acompanhamento de enfermeiros obstetras particulares em parto é arquivado
Projeto protocolado pelo vereador Edson Souza foi arquivado após parecer contrário da Comissão de Direito da Mulher, que consultou hospitais para entender a viabilidade
Por Bruno Rodrigo
A Câmara de Vereadores vivia uma época de “calmaria” com o fim de mais uma legislatura. Desde as eleições, projetos que não tiveram tanto apelo ou capazes de discussão. Mas nesta segunda-feira, a situação mudou com um projeto que a princípio, não seria polêmico, mas que causou certa discussão entre os parlamentares e acabou arquivado antes mesmo de ir para a votação em plenário. O Projeto de Lei 85/2024, que foi apresentado pelo vereador Edson Souza, e previa o direito das gestantes de Cascavel, do acompanhamento de enfermeiro obstetra contratado de maneira particular, durante todo o período de trabalho de parto e pós-parto nas maternidades, casas de parto e estabelecimentos hospitalares congêneres, da rede pública e privada.
Durante a tramitação, o projeto foi travado na Comissão de Direitos da Mulher. Isso porque conforme a comissão, o projeto não é viável, na medida em que esbarra na realidade financeira e estrutural das instituições de saúde, principalmente nas públicas.
A comissão expediu ofícios para a Fundação Hospitalar São Lucas e ao Hospital Universitário do Oeste do Paraná - HUOP, com o objetivo de coletar informações técnicas e obter subsídios quanto a viabilidade e segurança dessa proposta no contexto da assistência obstétrica prestada na rede hospitalar do município.
O Hospital Lucas afirmou que “ante o expressivo número de assistência a partos realizados pela Fundação Hospitalar São Lucas e de internações por situação clínica obstétrica, torna-se inviável proporcionar a gestante o acompanhamento individualizado e ininterrupto de enfermeiro(a) obstetra durante todo o período pré-parto, parto e pós-parto, seja em decorrência da insuficiência de profissionais especializados e/ou da imprevisibilidade/esporadicidade da quantidade de partos diários, impossibilitando a adequada formulação de escala”.
O Hospital ainda destaca que o a aprovação do projeto “acarretaria evidente e significativa onerosidade, sobretudo em relação aos atendimentos prestados aos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), na medida em que não haverá a respectiva atualização dos valores previstos na Tabela SUS para pagamento dos procedimentos obstétricos” e que “as implicâncias do Projeto de Lei no 85/2024 aos estabelecimentos de saúde violarão, no âmbito privado, o direito fundamental da liberdade econômica das empresas garantido por Lei”.
O HUOP também destaca a não inviabilidade do Projeto, e diz que ele “Fere todos os princípios do SUS, considerando que a paciente com disponibilidade financeira para contratar um enfermeiro (a) teria um melhor tratamento defronte a paciente indisponível financeiramente”.
A Comissão então entendeu que após análise dos argumentos apontados pelos hospitais, não é possível ignorar os impactos negativos que a medida pode gerar na qualidade dos serviços e na sustentabilidade financeira do sistema de saúde.
O parecer da comissão então foi a plenário e os vereadores aprovaram o arquivamento do projeto.
O vereador Edson Souza, que fez a proposição do projeto, criticou o arquivamento e disse que no ano que vem, em nova legislatura, deve novamente protocolar o projeto.
“A gente entende que a saúde tem que ser multiprofissional, não podendo ficar centralizada em apenas pequenos grupos, e esse é um caminho que a gente está apresentando. O projeto não passou, devido ao parecer contrário da comissão da mulher. Vamos reapresentar o projeto mais para frente, para discussão dessa casa de leis, debatendo com os novos vereadores que virão, visando aprovar ele”, disse Edson.
Ele também destacou que a Câmara já aprovou uma situação com as doulas que não necessariamente tem formação profissional, mas que se recusa a aprovar uma lei para a enfermagem.
“Essa casa de leis já aprovou uma lei das doulas, que não necessariamente tem uma formação. E não aprova a lei de um enfermeiro, que é especializado e formado para isso. Ou seja, alguma coisa teve aí no meio do caminho com o grupo de vereadores que não quis fazer essa aprovação”, frisou o vereador.
Por outro lado, a vereadora Beth Leal, que foi relatora do projeto na Comissão de Direitos da Mulher, afirmou como todo o sistema já tem uma lei federal que determina os profissionais que devem fazer parte, não é necessário a inserção de mais um agente de saúde neste meio, que pode causar problemas.
“Entendemos que estaríamos abrindo um precedente, em relação a permitir, que a mulher no momento que fosse ter o seu filho, pudesse escolher qual enfermeiro obstetra iria acompanhar. O que estaríamos fazendo é privilegiar mulheres com maior poder aquisitivo, que estaria sendo atendida pela rede SUS e que poderia contratar um profissional para acompanhar durante o parto”, disse Beth.
Ela também comentou a situação das Doulas, e analisou ser situações diferentes, já que a lei não determina a presença obrigatória de Doulas em unidades hospitalares.
“Usaram o argumento que temos a situação das doulas que podem ser contratadas para acompanhar o parto. Mas no meu entendimento, não há a obrigatoriedade de que a casa hospitalar tenha esse profissional disponível para fazer esse atendimento. E aí então se justifica que esse profissional possa ser contratado e leve para acompanhamento. Entendo que estaríamos ferindo a rede como um todo, e até incentivando que as casas hospitalares não necessitem mais do profissional de enfermagem obstetra”, finalizou.
O que diz a enfermagem
A professora e enfermeira obstetra Alessandra Cristian Engles Dos Reis, destacou a importância da aprovação do projeto, afirmando que tanto o Conselho Federal de Enfermagem, quanto o SUS, tem normativas que liberam o exercício dessa atividade.
“Temos no Brasil condições que são plenas e favoráveis ao exercício legal da profissão, e uma das situações que temos apoiada pelo Conselho Federal de Enfermagem e também pela legislação do SUS, é o acompanhamento do trabalho de parto, seja ele no domicílio, nos hospitais, em casas de parto ou onde a mulher estiver. Sendo assim, esse Projeto que encaminhamos para a votação, nada mais requer esse direito, que também é um direito da mulher de quem vai acompanhar esse parto”, explicou.
Créditos: Da Redação